Ricardo LodiDivulgação

Por ocasião da discussão no Congresso Nacional da reforma tributária dos impostos sobre o consumo, as autoridades fiscais do atual governo diziam que aquela era a reforma da simplificação do sistema, e que a reforma da justiça fiscal viria futuramente com as alterações no imposto de renda. Enfim, as propostas sobre o IR foram anunciadas e, em breve serão encaminhadas ao parlamento.

Embora tenham sido recebidas com críticas pelo mercado, que esperava apenas o corte de despesas sociais, a fim de dar cumprimento às regras no novo arcabouço fiscal, as medidas, em uma primeira abordagem, feita com base nas notícias e não nas propostas legislativas ainda não disponibilizadas, apontam para o caminho do cumprimento de dois princípios aprovados na reforma tributária da EC nº 132/2023: o da justiça fiscal e o da redução da regressividade tributária.

Todos sabem que o nosso sistema tributário é um dos mais perversos do mundo por conta da sua regressividade, que onera comparativamente mais os pobres do que os ricos. E uma das facetas mais marcantes de nossa injustiça tributária está na legislação do imposto de renda, muito rigorosa com os assalariados e generosa demais com quem vive de lucros e dividendos. E é justamente esse ponto que se pretende atacar, a partir da premissa de que as desonerações do andar de baixo serão compensadas pela majoração para os mais ricos. Esse é o caminho adotado pela maioria das maiores economias do mundo.

Segundo o anúncio feito pelo Ministro da Fazenda Fernando Haddad, os contribuintes com renda até R$ 5.000,00 estarão isentos. Hoje esse limite é de R$ 2.259,20. Os contribuintes de rendimentos entre R$ 5.000,00 a R$ 7.500,00 terão uma redução da tributação. No entanto, os contribuintes de renda superior ao limite da referida isenção não terão qualquer redução na sua tributação, mesmo na parcela inferior àquele limite, o seria mais apropriado dentro da sistemática da progressividade do imposto, mas aumentaria a necessidade do esforço de aumento de tributação dos mais ricos, para compensar a perda de arrecadação.
Como anunciado pelo ministro, os contribuintes com rendimentos, tributáveis ou não, superiores a R$ 600.000,00 anuais, o que dá uma média mensal de R$ 50.000,00, terão uma tributação mínima de até 10%. É uma maneira menos gravosa de tributar algo dos que se beneficiam pela isenção do imposto para lucros e dividendos. É claro que o desejável, à luz da justiça fiscal, seria a simples revogação desse benefício aos mais ricos que não encontra paralelo nas economias desenvolvidas. E permitiria até que a isenção sobre a renda sobre os R$ 5.000,00 atingisse em parte a todas as faixas de contribuintes. Mas é o avanço possível considerando atual correlação de forças no Poder Legislativo. Afinal, é um grande alívio para cerca de R$ 36 milhões de contribuintes, custeadas por um pequeno esforço por cerca de 100 mil pessoas mais ricas.

É claro que essas ideias precisam ter traduzidas em textos legislativos, a serem apreciados pelo Congresso Nacional, mas já é bastante positivo que tenhamos, pela primeira vez, uma reforma tributária marcada pela justiça fiscal. E talvez, por isso, venha recebendo crítica do mercado. Porém, é chegada a hora de apostar na cidadania para atingirmos um sistema tributário mais justo para todos para termos um crescimento consistente.
 
Ricardo Lodi Ribeiro é Professor Associado de Direito Financeiro da UERJ e suplente de deputado federal pelo PT/RJ