Antônio Geraldo da Silva é presidente da Associação Brasileira de PsiquiatriaDivulgação

O maior espetáculo da terra vai começar, e o Brasil inteiro se prepara para dias de celebração. O Rio de Janeiro, com seus desfiles grandiosos, é um dos palcos principais dessa festa, mas cada região do país tem sua própria forma de celebrar. Seja no frevo vibrante de Pernambuco, no axé contagiante da Bahia ou nos blocos irreverentes de São Paulo e Belo Horizonte, o espírito carnavalesco une milhões de pessoas em alegria e descontração.
A origem do Carnaval remonta à Grécia Antiga, onde festividades eram realizadas em homenagem a Dioniso, deus do vinho, das celebrações e da fertilidade. Eram rituais de renovação, marcados por dança, música e liberdade de expressão. Com o tempo, essas festas foram absorvidas por diferentes culturas e ganharam novos significados. Na Idade Média, o Carnaval passou a estar ligado à tradição cristã, surgindo como um período de intensa comemoração antes da Quaresma. A própria palavra “carnaval” vem do latim carnem levare ou carnis levamen, que significa “parar de comer carne”, uma referência à abstenção alimentar que marcava os 40 dias que antecedem a Páscoa.
No Brasil, o primeiro baile de Carnaval aconteceu no Rio de Janeiro em 1840, e os ritmos predominantes eram a polca e a valsa. O samba, hoje o grande protagonista da festa, só foi introduzido em 1917. Desde então, o Carnaval brasileiro evoluiu para se tornar uma das maiores e mais emblemáticas celebrações populares do mundo.
Diz-se que o brasileiro tem alma carnavalesca. A música, as cores e a energia dessa festa despertam um sentimento único, um convite à intensidade. Como médico-psiquiatra, compreendo a importância desse momento de descontração e de extravasamento coletivo. Ao longo da história, vemos que todas as sociedades possuem rituais de expurgação, períodos nos quais os excessos assumem um papel simbólico importante. O Carnaval é, para muitos, essa oportunidade de viver a liberdade, romper com a rotina e expressar emoções.
Entretanto, a psiquiatria nos ensina que a saúde mental depende de equilíbrio. Todo excesso cobra um preço, seja físico, emocional ou psicológico. A euforia e a busca por prazer imediato podem levar a comportamentos impulsivos, que, em alguns casos, resultam em arrependimentos duradouros. Para aqueles que já possuem um diagnóstico psiquiátrico, a cautela deve ser redobrada. O consumo de álcool pode interferir no tratamento e no funcionamento do cérebro e aumentar a vulnerabilidade emocional levando a recaídas e recidivas graves. O uso de substâncias psicoativas, além de ilegal e arriscado, pode desencadear e também piorar quadros psiquiátricos, surtos psicoticos e episódios de grandes perdas psíquicas.
Para quem faz uso de medicação psiquiátrica, um alerta fundamental: não interrompa o tratamento para “aproveitar melhor a festa” ou para consumir álcool. Suspender um medicamento sem orientação médica pode causar efeitos graves, como crises de ansiedade, episódios depressivos, surtos psicóticos e até sintomas de abstinência. Da mesma forma, misturar medicamentos com álcool pode ser perigoso, pois essa interação pode intensificar efeitos colaterais e comprometer o bem-estar. O tratamento psiquiátrico é contínuo, e a estabilidade emocional conquistada não deve ser colocada em risco por poucos dias de festa.
Para curtir o Carnaval de forma saudável e segura, alguns cuidados são indispensáveis. Mantenha-se hidratado, prefira alimentos leves e respeite suas horas de descanso. Proteja-se do calor, use filtro solar e evite situações de vulnerabilidade. Se beber, não dirija. Se estiver em tratamento, siga rigorosamente as recomendações do seu médico.
O Carnaval é uma celebração da cultura, da liberdade e da felicidade. Ele pode e deve ser vivido com alegria, mas sempre com consciência. Permita-se dançar, sorrir e aproveitar, mas sem renunciar ao autocuidado. E se, em algum momento, sentir que precisa de ajuda, não hesite em buscar apoio. Afinal, o verdadeiro Carnaval é aquele que deixa apenas boas lembranças.
* Antônio Geraldo da Silva é presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria