Ocupando a cadeira de número 8, Cleonice Berardinelli era, atualmente, a integrante mais longeva da ABLReprodução

Rio - A escritora e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), Cleonice Serôa da Motta Berardinelli, Dona Cleo, como ficou conhecida, morreu, nesta terça-feira (31), aos 106 anos, no Rio de Janeiro. Ela estava internada no Hospital Samaritano e foi vítima de uma insuficiência respiratória. Ocupando a cadeira de número 8, ela era, atualmente, a integrante mais longeva da ABL. Carioca nascida em 28 de agosto de 1916, a autora foi considerada uma das maiores especialistas em literatura portuguesa do mundo, principalmente da obra de Fernando Pessoa e Luís de Camões, com mais de 20 obras publicadas.
Cleonice foi eleita para a Academia Brasileira de Letras em 16 de dezembro de 2009, na sucessão de Antônio Olinto, e se tornou a sexta a ocupar a cadeira de número 8, em 5 de abril de 2010. A escritora era licenciada em Letras Neolatinas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP); doutora em Letras Clássicas e Vernáculas pela Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil; e livre-docente de Literatura Portuguesa por concurso pela Faculdade Nacional de Filosofia. 
A acadêmica foi também professora emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio); da Universidade Católica de Petrópolis; do Instituto Rio Branco. Cleonice ainda foi convidada para lecionar pelas Universidades da Califórnia, no campus de Santa Barbara, nos Estados Unidos, em 1985, e de Lisboa, em Portugal, entre 1987 e 1989. Dona Cleo é autora de livros como "Antologia do Teatro de Gil Vicente", de 1971, "Fernando Pessoa. Obras em prosa", de 1975, e "Sonetos de Camões", de 1980.
A acadêmica foi homenageada no cinema em documentários como "O vento lá fora", em que ela e a cantora Maria Bethânia leem Fernando Pessoa diante de uma plateia de convidados, e "Cleo", em que apresenta poemas recitados de cor. Em 2014, aos 98 anos, recebeu o Prêmio Faz Diferença na categoria Prosa das mãos dos Acadêmicos Zuenir Ventura e do atual presidente da ABL, Merval Pereira.
De acordo com a ABL, o velório será realizado nesta quarta-feira (1º), das 11h às 15h, no Petit Trianon, no Centro do Rio. O corpo de Cleonice será cremado na quinta-feira (2), em uma cerimônia reservada para a família. Ainda será realizada uma Sessão da Saudade na insitituição em homenagem à autora. Nas redes sociais, o também membro da Academia, Marco Lucchesi, lamentou a morte da escritora, a quem chamou de "mais poderosa intérprete" da língua portuguesa.
"O mundo da cultura luso-brasileira perde um dos seus nomes mais expressivos. Mais de 100 anos de glória vividos por Cleonice Berardinelli (...) Quando ela estava presente nas sessões da Academia Brasileira de Letras, havia uma qualidade diferente, brilhava com sua verdade poética, como uma grande lâmpada acesa, porque sua inteligência era uma inteligência de construção, ao mesmo tempo afetiva e com todas as características de uma vida riquíssima de testemunho", disse o acadêmico. Na homenagem, Lucchesi lembrou que Cleonice era chamada de "genuína fazendeira" pelo poeta Carlos Drummond de Andrade, porque produzia "muitos frutos de poesia".
O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, divulgou uma nota de pesar, em que pontua que a escritora tinha "um lugar destacadíssimo" de contribuição para manter viva a cultura portuguesa no mundo. O texto ainda aponta que ela era correspondente da Academia das Ciências de Lisboa desde 1975, foi membro do júri do Prêmio Camões e recebeu as insígnias da Ordem do Infante Dom Henrique e da Ordem de Sant'Iago da Espada.
"Os escritores e acadêmicos portugueses e brasileiros, e os seus alunos dos dois lados do Atlântico, devem muito ao magistério de Dona Cleo, como era carinhosamente tratada. Manifesto, na sua partida, o meu pesar e a nossa gratidão", completou o presidente. Ainda não há informações sobre local e horário de velório e sepultamento da autora.