Médica colombiana sendo transferida para o presídioReginaldo Pimenta

Rio - A médica colombiana Eliana Jimenez Dias foi presa, no início da manhã desta quarta-feira (12), pela morte da cozinheira Ingrid Ramos Ferreira, de 41 anos, no dia 15 de junho. Agentes da 16ª DP (Barra da Tijuca) prenderam a mulher em casa, em um condomínio de luxo em Jacarepaguá, na Zona Oeste.

Contra ela, foi cumprido um mandado de prisão preventiva decretado pela Justiça. Os agentes também apreenderam aparelhos de telefone celular.

Nesta terça (11), a médica foi denunciada pelo Ministério Público por homicídio com dolo eventual e por fraude processual, pois, de acordo com as investigações, ela tentou esconder provas que poderiam ter auxiliado na elucidação do caso.
A médica também foi indiciada pela Polícia Civil na última segunda-feira (10) pelos mesmos crimes citados na denúncia do MP.

No inquérito, a investigação entendeu que a médica ocultou provas do crime e tem o risco de deixar o país devido ao seu registro de dupla nacionalidade. De acordo com o delegado Ângelo Lages, titular da 16ª DP, essa foi uma das preocupações que levaram a polícia a pedir a prisão da mulher.

"Além dela estar ocultando provas, a gente também tinha essa preocupação dela fugir do país, tendo em vista que possui dupla nacionalidade. Ele é brasileira e colombiana, havia o receio que ela pudesse voltar para o seu país de origem", explicou.

No dia do crime, uma câmera de segurança flagrou o momento em que a médica saiu de sua sala carregando sacolas e levando para uma outra sala, que, segundo o delegado, seria de seu marido.

"Essa sala era do marido dela, que é uma sala vizinha ao consultório dela e logo após a morte da paciente, ela passou a tirar todo o material cirúrgico e passou a ocultar no consultório do marido. A gente conseguiu flagrar essa ação através de análise câmeras do prédio, da sala comercial, e foi quando a gente entendeu realmente a necessidade da prisão dela, tendo em vista essa ocultação de provas”, expôs.

A polícia também afirmou que o resultado do laudo da morte de Ingrid constatou que ela foi vítima de um choque cardiogênico. Durante a cirurgia, o coração da vítima perdeu a capacidade de bombear sangue em quantidade adequada para os órgãos.

De acordo com as investigações, a médica assumiu o risco da morte da paciente ao fazer o procedimento invasivo em uma sala comercial, ao invés de um ambiente hospitalar, que seria recomendado. “Ela, como cirurgiã plástica, tem perfeita consciência que não poderia estar fazendo esse procedimento na sala comercial, sem qualquer tipo de amparo.

Depois da prisão da mulher, a Polícia Civil ainda vai cumprir mais dois mandados, desta vez, de busca e apreensão em outros dois consultórios usados para atendimento.

Relembre o caso

Ingrid morreu no dia 15 de junho deste ano após passar por uma reparação da abdominoplastia feita no ano passado, em uma clínica na Avenida Olegário Maciel, na Barra da Tijuca, Zona Oeste.

Ingrid estava acompanhada do filho de 14 anos. O irmão da vítima, Ícaro Ramos Ferreira, de 33 anos, chegou a gravar um vídeo no momento em que chegou na clínica, onde uma outra pessoa falou que a vítima sofreu uma reação alérgica a anestesia. "Para mim a médica não falou nada, ela não conseguia nem abrir a boca, estava muito abalada. Lá, tinha remédio fora da validade, o que poderia ter causado isso. Assim que chegamos percebemos que era um lugar inadequado. Nós saímos de lá 2h", disse.

A vítima deixou dois filhos: um de 14 anos que acompanhava o procedimento, e uma de 22 anos, que está grávida.
Médica responde a outros processos
De acordo com o delegado, Eliana ainda responde a outros dois processos criminais, um deles por homicídio, e diversos cíveis. Em 2020, uma outra mulher morreu após realizar um procedimento de lipoaspiração com a médica colombiana.

“Ela já responde por um homicídio de uma paciente que se submeteu a um procedimento de lipoaspiração em 2020 e há uma outra paciente que ficou com sequelas graves, também por se submeter a um procedimento de lipoaspiração com essa médica, ela responde por lesão corporal grave. São diversos processos civis além desses três processos criminais", contou.

O viúvo de uma das vítimas, o pedreiro Isaías dos Santos, foi até a delegacia nesta quarta para dar seu depoimento ao delegado sobre o ocorrido com sua esposa. Segundo ele, há anos a família tenta conseguir a prisão da médica, mas sem sucesso.

"Eu vim aqui na delegacia porque eu estou acompanhando o caso dessa mulher desde quando minha esposa faleceu, ela matou a minha esposa. Eu sou doido para prender essa médica não é de hoje, eu venho correndo atrás, até que eu vi a reportagem que os policiais estavam atrás dela para ser presa e hoje de manhã, graças a Deus, ela foi presa. Ela não pode continuar fazendo essas coisas e matar mais gente”, disse.

Em seu relato, ele conta que a perda da mulher após quase 25 anos de casamento foi um grande baque.
“Essa médica, na época, acabou com a minha vida. Quando aconteceu esse fato com a minha esposa, eu fiquei desesperado, eu fiquei seis meses, mais ou menos, desnorteado. Mudei de casa umas quatro vezes, foi um negócio muito difícil", desabafou.

Segundo o viúvo da vítima, ela já havia passado por outros procedimentos estéticos antes e não havia sofrido com nenhum tipo de problema, até fazer uma lipoaspiração com a médica colombiana.

Em 2020, ela quis fazer a lipoaspiração, levei ela para o hospital, encaminhei, ela fez os exames, estava tudo certo, acompanhei ela lá, ela fez a cirurgia, eu fiquei lá, e depois falaram que ela estava pronta para poder ir embora. Fui lá, subi no quarto, ajudei a médica, essa bandida, a vestir minha esposa. Só que estava sangrando muito. Na época, eu falei até para a médica que a minha esposa já tinha feito outros procedimentos e não ficou sangrando não. Ela mandou colocar uma cinta e apertar bem que iria parar. Levei minha esposa para casa e chegando lá, ela começou a passar mal, quando foi mais ou menos duas horas da manhã, ela me pediu para eu levá-la no hospital. Eu levei na UPA mais próxima de casa e lá fizeram alguns procedimentos e os médicos mandaram ela ir para o local onde fez a cirurgia. Botaram ela em uma ambulância do SAMU, levaram para o hospital e ela morreu.

A vítima teve um quadro grave de hemorragia devido a uma perfuração no intestino grosso e delgado e não resistiu as complicações causadas pela cirurgia. Isaías Junior, filho da vítima, foi até a delegacia com o pai e falou que a mãe foi liberada do hospital sangrando tanto que até a cama ficou com marcas.

“Ela ficou sangrando em casa, a cama ficou cheia de sangue. Até hoje tem marcas de sangue lá por causa da hemorragia. Eu estava trabalhando no dia, meu pai me ligou falando que minha mãe estava no hospital e não sabia o que tinha acontecido”, disse.
Sem licença da Vigilância Sanitária

A clínica estética onde Ingrid morreu não tinha licença para funcionar. O estabelecimento passou por uma perícia da Polícia Civil e acabou interditado pelo Instituto Municipal de Vigilância Sanitária (Ivisa), após uma série de irregularidades serem encontradas.

Além da falta de licença da Vigilância Sanitária, também foram encontrados medicamentos fora da validade e materiais para cirurgias, que não poderiam ser usados, já que o estabelecimento não tem autorização para realizar procedimentos cirúrgicos. O Ivisa também encontrou tubos de coleta de sangue vencidos; próteses mamárias com indício de reutilização; e autoclave sem o correto fluxo para a esterilização.

De acordo com o Instituto Municipal de Vigilância Sanitária, no ano passado, o local já havia sido multado por falta de licenciamento. O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu uma sindicância para apurar o caso.
Ingrid Ramos Ferreira, de 41 anos, morreu durante um procedimento estético - Arquivo pessoal
Ingrid Ramos Ferreira, de 41 anos, morreu durante um procedimento estéticoArquivo pessoal


Depoimento da médica

Eliana Jimenez relatou aos policiais, durante depoimento, que o procedimento realizado na cozinheira era para a retirada de uma queloide na região do abdômen e que não precisava ser realizado em um centro cirúrgico.

A médica contou que utilizou 15 miligramas da substância Dormonid Maleato de Midazolam - usado para o tratamento de curta duração da insônia -, e uma solução anestésica com lidocaína e um pouco de adrenalina. Logo depois da aplicação da anestesia, Ingrid teve uma convulsão, que durou entre três e quatro minutos.

Ainda segundo a oitiva, Eliana precisou desobstruir as vias aéreas da paciente, mas ela passou a espumar pela boca e contrair o corpo. A médica chegou a perguntar para o filho da vítima, que a acompanhava, se a mãe tinha intolerância a alguma substância usada e pediu que outros pacientes acionassem o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Pouco depois, Ingrid começou a perder pulsação e a cirurgiã fez manobras de ressuscitação, que também foram realizadas pelos médicos do Samu, mas eles não conseguiram reverter o quadro e a mulher acabou morrendo.

Família acredita em erro médico

A família acredita que a morte de Ingrid tenha sido provocada por erro médico e, de acordo com o irmão, o estabelecimento era inadequado para a realização do procedimento. "Para mim aquilo ali era um açougue, não era uma clínica. Só Deus sabe a dor que eu estou sentindo (...) Essa clínica é um 'hotelzinho', parecendo uma quitinete, é uma sala pequenina", afirmou ele, que gravou um vídeo no momento em que chegou ao local. Nas imagens, uma pessoa fala que a vítima sofreu uma reação alérgica a anestesia.

"Para mim a médica não falou nada, ela não conseguia nem abrir a boca, estava muito abalada. Lá, tinha remédio fora da validade, o que poderia ter causado isso. Assim que chegamos percebemos que era um lugar inadequado. Nós saímos de lá 2h", relatou Ícaro. Cunhada da mulher, Juliana Guedes contou que ela havia feito uma abdominoplastia no ano passado, também com Eliana, e voltou outras vezes porque o procedimento não ficou bom.