As três pessoas da mesma família estavam num Ônix que foi alvo de disparos após assalto em São CristóvãoReprodução/Redes Sociais

Rio - A Polícia Civil prendeu em flagrante os três PMs e três baleados envolvidos em uma perseguição em São Cristóvão, na Zona Norte do Rio, na noite desta quarta-feira (25). Os agentes William de Castro Valladão, André Luís da Silva Rodrigues e Bruno Batista Gama, lotados na UPP Barreira do Vasco, foram autuados por tentativa de homicídio. Já os ocupantes do veículo alvejado, Nívea Ághata Fernandes, de 24 anos, João Victor de Oliveira, de 22, e a mulher dele, Yasmin dos Santos, de 18, que está grávida, são suspeitos de roubo. O caso está sendo investigado pela 17ª DP (São Cristóvão).
De acordo com a PM, um celular que havia sido roubado momentos antes foi encontrado no interior do veículo. Além disso, o advogado de um dos agentes envolvidos no caso, Sandro Figueiredo, afirma que uma vítima de roubo teria reconhecido um dos ocupantes do carro como um assaltante. A defesa dos baleados, no entanto, nega que o reconhecimento tenha acontecido e alega que não havia aparelhos roubados no automóvel. A advogada Márcia Daflon ressalta que há vídeo dos militares mexendo no carro após a abordagem, o que poderia ser um indício de que o material apreendido possa ter sido colocado no veículo depois da ocorrência.
O advogado do cabo William Valadão afirmou que a prisão por tentativa de homicídio é "um verdadeiro absurdo, uma decisão equivocada", porque os PMs estavam em uma "rua deserta, próxima à comunidade" e atiraram em legítima defesa ao escutarem tiros na direção da viatura em que estavam durante a perseguição, após serem alertados sobre um veículo praticando roubos. 
"Foi um verdadeiro absurdo, uma decisão equivocada, o que a defesa, por óbvio, usaremos os remédios constitucionais e jurídicos cabíveis para tentar reverter essa injusta decisão, que foi prender os policiais militares que estavam atuando no exercício da sua função, não cometeram qualquer ilegalidade. Lavrar uma voz de prisão num crime de grande gravidade de tentativa de homicídio, sendo que os policiais agiram em legítima defesa, foi um verdadeiro absurdo", declarou o advogado, que afirmou também que os agentes não foram ouvidos pela distrital. 
Ainda segundo Figueiredo, os PMs relataram que, durante a perseguição, os ocupantes se desfizeram de materiais ilícitos que estariam no veículo, os atirando pela janela, o que também pode ter acontecido com a arma que teria sido usada por eles durante o suposto roubo e não foi encontrada. "Eles prenderam um elemento, tiveram que preservar o local e socorrer as vítimas que tinham sido alvejadas, depois retornaram, muito tempo depois, para tentar recuperar as rés furtivas. Umas foram achadas no local em que houve a perseguição e outras não", disse. 
Os PMs utilizavam câmeras corporais e as imagens serão solicitadas pela Polícia Civil. Entretanto, a defesa teme que os equipamentos não tenham registrado a ação, já que têm uma bateria com duração variando entre oito e dez horas, enquanto o expediente dos envolvidos é de 12 horas e estava no final. O advogado confirmou a versão apresentada pela família dos feridos de que o carro deles, um Ônix prata, foi confundido com o veículo de criminosos, um Cobalt branco, porque as vítimas de um roubo, dois adolescentes, não souberam descrever precisamente o automóvel em que estavam os assaltantes que levaram seus celulares. 
A advogada Márcia Daflon, que representa Yasmin, discorda da prisão em flagrante por roubo da gestante, ressaltando que não houve reconhecimento por parte da vítima. Ela afirma que não há provas de que o trio tenha roubado celulares antes de ter o carro alvejado. 
"Não tem base, é um absurdo terem pedido a prisão em flagrante deles, não tem nenhuma prova, não tem arma, como que pode a polícia alvejar um carro, se não existe uma arma, não existe uma bala no carro da polícia? Não tinha telefone com eles no carro, não sei se foi encontrado em algum outro lugar, com eles não tinha telefone nenhum", afirmou.
Na ação, a PM teria apreendido quatro celulares sem chip, uma touca ninja, três relógios e um rádio comunicador. Para Daflon, os materiais podem ter sido plantados pelos PMs.
"Há vídeos que comprovam que a polícia estava mexendo no carro sem que tivesse ninguém por perto, depois do ocorrido, talvez isso justifique a fala de que encontraram celulares, encontraram uma toca, que na verdade não tem nada (...) Eles desconhecem a toca e os celulares, não estava dentro do carro. A gente tem as imagens do carro, da polícia mexendo no automóvel quando não tinha mais ninguém ali por perto", disse a defesa.
Segundo o irmão de Yasmin, Bruno Gomes, o trio voltava de um bar quando o carro em que eles estavam foi alvo dos disparos dos PMs, que não teriam realizado a abordagem. Nívea, que dirigia o veículo, foi atingida por dois tiros no tórax, um no pescoço e um no braço, e foi levada para o Hospital Quinta d'Or, no mesmo bairro. Segundo a família, a jovem tem uma bala alojada na cabeça e está em estado grave. Já João Victor, que estava no banco de trás, foi encaminhado para o Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro, atingido na perna e, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), seu quadro é estável.
Yasmin estava no carona e sofreu um ferimento leve ao ser baleada de raspão na perna esquerda. Na manhã desta quinta-feira (26), ela foi conduzida para a 19ª DP (Tijuca) e encaminhada a um presídio feminino. A defesa também questionou a decisão da delegacia, já que o trio seria vítima da ação. A jovem relatou à advogada que a viatura seguia atrás deles com a sirene ligada e, ao darem passagem para os policiais, foram alvejados. 
"Ela está em choque até agora, não entende o que aconteceu. Ela é uma menina trabalhadora, trabalha de carteira assinada, ela chora muito, não entende o que está acontecendo. Ela chora igual uma criança, porque está com medo de ir pra um presídio, 'o que as mulheres no presídio vão fazer comigo?', ou seja, não é a realidade dela, é lamentável, muito triste o que tá acontecendo. Até agora eu estou buscando entender o porquê foi pedido a prisão em flagrante deles, já que eles são vítimas", afirmou Márcia. 
Além dos advogados, uma amiga de Nívea e dona do carro alvejado, que preferiu não se identificar, também esteve na 19ª DP, onde relatou que havia alugado o veículo para a motorista há cerca de três meses, diferente do que o teria sido relatado pelos policiais, de que o automóvel pertenceria a uma locadora. "Eu nunca soube de envolvimento dela (com roubos), ela trabalha de Uber. Fiquei assustada e estou até agora querendo saber o que está acontecendo. Estou muito nervosa e preocupada, querendo resolver essa situação. Ela é cliente da minha loja e virou uma amiga, tem uns dois anos, mais ou menos", contou. 
Em nota, a Polícia Militar informou que os agentes serão encaminhados à Unidade Prisional da Corporação, na cidade de Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, e que um procedimento foi instaurado para analisar a dinâmica do caso e a conduta dos agentes envolvidos na ação. "A Corregedoria acompanha os trâmites do inquérito que apura o caso. Cabe informar que a Corporação colabora integralmente com as investigações da Polícia Civil", completou.