Viúva de Carlos Lyra, Magda Botafogo revelou a causa da morte do compositorReprodução

Rio - Familiares e amigos de Carlos Lyra dão o último adeus ao cantor e compositor, na manhã deste domingo (17), em velório realizado no cemitério Memorial do Carmo, no Caju, Zona Portuária do Rio. Autor de diversos clássicos da bossa nova, o artista morreu, no sábado (16), aos 90 anos, vítima de uma infecção bacteriana, segundo revelou a viúva do músico, Magda Botafogo, em conversa com jornalistas. O corpo do artista foi cremado às 14h.
"Ele estava bem. Teve uma febre e eu levei para o hospital logo, porque ele ficou com a unha meio azuladinha. Fizeram uma anamnese nele e ele estava bem, (mas) mandaram esperar. Resolveram fazer um exame para ver se era alguma coisa bacteriana, ou virose. E quando viram o exame de sangue, a bactéria já estava criando uma infecção grande e ele foi sem sofrer, graças a Deus", relatou a produtora, que era casada com o veterano desde 2004.
Emocionada, ela relembrou a despedida do amado, que foi internado na última quinta-feira, no Hospital da Unimed, na Barra da Tijuca. "Ele foi na paz, eu o enchi de beijos, sedaram ele e a gente ficou esperando. Ele foi rápido, está lá em cima com o Vinícius (de Moraes), com o (João) Donato, Tom (Jobim). Deve estar lá fazendo música, cantando", disse Magda, citando três grandes parceiros musicais do marido.
Ícone da MPB, Carlos Lyra é conhecido por escrever sucessos atemporais como "Coisa Mais Linda", "Você e Eu", "Minha Namorada", "Influência do Jazz" e "Marcha da Quarta-feira de Cinzas", entre outros. Ele deixa mulher, Magda, e uma filha, Kay Lyra, fruto do casamento com a atriz norte-americana Kate Lyra, de quem se separou em 2004.
"Acho que ele vai deixar músicas lindas para o mundo todo. Ele não tinha mil músicas, porque ele dizia que 'sabia jogar fora', ele tinha essa coisa da excelência, então, o que não era excelente ele rasgava e jogava no lixo. Então, não são mil músicas, mas deixou aí umas 400 músicas para as pessoas curtirem. Pra quem, sempre que ouçam, lembrem dele, uma pessoa boníssima, gentil, educada e que eu amava muito", declarou Magda.
Muito abalada, a herdeira do compositor não quis falar com a imprensa no local. Maurício Maestro, marido de Kay, detalhou o contato pessoal com um dos maiores nomes da música nacional. "Eu falo que eu conheci o Carlinhos há, talvez, mais tempo do que a maioria das pessoas, porque, na época do começo da bossa nova, na casa dos meus pais, tinha umas reuniões. Desde essa época, eu fiquei fã do Carlinhos, das melodias dele, a forma da composição, ele é um craque", afirmou o músico.
"Mais tarde eu fui reencontrá-lo, já casado com a Kay. De lá pra cá, eu tinha me aprofundado ainda mais na obra e na convivência. Ele era um cara super carinhoso, um sogro fantástico, durão, mas muito bacana de se conviver", completou o integrante do grupo Boca Livre.
Caetano Veloso e Djavan enviaram coroas de flores em homenagem ao artista. Nas redes sociais, nomes como Gilberto Gil, Mônica Salmaso e Lúcio Mauro Filho lamentaram o falecimento de Lyra. O cineasta Silvio Tendler foi ao velório, mas não conversou com os jornalistas no local
Neta de Vinicius de Moraes, a cantora Mariana de Moraes falou com emoção sobre a perda: "Tem uma música do Gil que diz: 'não tenho medo da morte, mas sim medo de morrer'. Ele está indo (com) missão cumprida, 90 anos é uma idade extraordinária. Mas para quem fica é sempre triste a partida de uma pessoa que eu tive a oportunidade de conhecer", disse a artista.
O cantor Celso Fonseca celebrou as contribuições que o artista deixa para a cultura do país. "Carlos era uma pessoa incrível, um dos maiores compositores, um patrimônio cultural nosso. (Era) uma pessoa incrível e que deixa um legado importantíssimo, não só musical como político. Uma pessoa de uma generosidade incrível, de uma humildade, simplicidade, vai fazer muita falta. Já está fazendo", lamentou.
E o músico Ricardo Vilas enfatizou a luta política de Carlos Lyra, ao destacar um momento em que a história do autor se entrelaça com a do Brasil: "A bossa nova se politizou, tomou consciência do regime de exceção que a gente vivia e resolveu se expressar. Denunciando a censura, denunciando a ditadura e também as condições de vida do povo. Carlinhos estava lá na frente, foi um dos expoentes com a Nara Leão. Fora isso, o que ele nos deixa é uma obra magnífica. Então, fica muita saudade", disse.
Legado histórico
Carioca, Carlos Lyra se iniciou na música ainda na infância, aos 7 anos. Mas foi na adolescência que conheceu Roberto Menescal, um dos fundadores da bossa nova e participante ativo das reuniões na casa de Nara Leão que deram origem ao movimento. Juntos, os dois músicos inauguraram a Academia de Violão, por onde passaram grandes nomes como Wanda Sá, Marcos Valle e Edu Lobo.
Participou da composição de "Lobo Bobo", "Saudade Fez um Samba" e "Maria Ninguém", faixas do álbum de estreia de João Gilberto, intitulado "Chega de Saudade" (1959), sendo as duas primeiras em parceria com Ronaldo Bôscoli. Tom Jobim e Vinicius de Moraes foram outras lendas com quem Carlos trabalhou ao longo da carreira.
No início deste mês, foi lançado o álbum "Afeto" em comemoração pelos 90 anos do artista. Gilberto Gil, Caetano Veloso, Lulu Santos, Djavan e Mart'nália são alguns dos cantores que participaram do disco, dando voz ao acervo de canções escritas por Lyra.