Caso foi registrado na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) do Centro do RioArquivo / Renan Areias / Agência O Dia

Rio - Uma mulher trans, de 28 anos, denunciou um homem por agressão após ele ter a acusado de roubo na frente de uma lanchonete, no Centro do Rio. A professora Ísis Luna alega que o suspeito bateu nela com um caixote depois de dizer que ela tinha roubado seu celular. De acordo com a vítima, a acusação aconteceu por transfobia.
O caso aconteceu no domingo (5) na Rua Riachuelo. Ao DIA, nesta quarta-feira (8), Ísis disse que comprava um lanche no estabelecimento quando o homem chegou alterado na lanchonete com um caixote. Dentre as pessoas que estavam no local, apenas ela foi acusada de roubo pelo suspeito. A professora destacou que o perguntou sobre o motivo da acusação e, nesse momento, o homem teria a agredido.
"Eu estava na lanchonete comprando um lanche para ir pra casa. Quando eu estava saindo, um homem branco com um caixote de madeira na mão me abordou de forma agressiva perguntando se eu tinha roubado ele. Em seguida, ele começou a afirmar. Isso bem alto na frente de várias pessoas. Eu falei que não, que nunca tinha visto ele na minha frente, que ele estava me acusando injustamente e que aquilo era um crime. Ele continuou afirmando que eu tinha roubado ele. Perguntei por quê? Pela forma que estava vestida ou porque sou trans? Nesse momento, ele me agrediu com o caixote tentando acertar meu rosto, mas coloquei meu braço pra me defender. O caixote quebrou me causando lesões", comentou.
Segundo a vítima, um segurança da lanchonete interviu e impediu que o homem continuasse as agressões. Policiais militares também estiveram no local, mas teriam liberado o suspeito sem pegar suas informações e sem condução para delegacia.
"A polícia estava no local desde o início das agressões e nada fez. Eu fui falar com os policiais que tinha sido agredida e a primeira pergunta deles foi se eu tinha feito programa com o agressor. Eu sou professora. Estava no meu momento de lazer junto com um amigo, próximo da minha casa, lidando com acusações de um homem que nunca vi na vida. O policial falou que ia conversar com ele. Na minha visão, ele ia conduzir nós dois à delegacia, que era o correto. Eles conversaram e, no momento que eu estava sendo acalmada por mulheres que estavam no local, eu vejo o meu agressor saindo correndo e os policiais indo para viatura, como se nada tivesse acontecido. Eu tive que ser rápida, ir até a viatura e perguntar se eles não tinham pegado nenhuma identificação do agressor. Eles foram frios e disseram que não", completou.
Transfobia
Para a professora, toda a agressão e a acusação de roubo aconteceu por ela ser uma mulher trans. A vítima contou que estava de costas para o suspeito quando ele chegou na lanchonete e ele começou a se alterar apenas quando viu seu rosto. 
"Eu comecei a questionar o porque dele fazer aquilo sem me conhecer. Por que ele achou que eu, entre tantas pessoas que ali estavam, tinha roubado ele? Pra mim, está claro que foi transfobia porque ele chega na lanchonete, eu estou de costas pro balcão, ele só me ver como criminosa quando olha no meu rosto e me identifica como trans. Eu não sei o local onde ele estava, mas com certeza tinha mulher trans e travestis. No momento que ele viu que estava sem celular, ele associou automaticamente a elas. Ele estava enfurecido e queria descontar esse ódio na primeira que ele visse. Para esse sujeito bater numa trans, humilhar, acusar ou até mesmo matar, não iria resultar em nada. Ele tinha certeza da impunidade. Eu fico muito triste que no final essa mente perversa estava certa. Ele saiu impune mesmo me agredindo e com falsas acusações", disse. 
O caso foi registrado no domingo (5) na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) do Centro pelos crimes de lesão corporal, calúnia e difamação. O exame de corpo de delito, realizado pela vítima no mesmo dia do crime, constatou uma lesão no punho esquerdo.
Ísis revelou que procura um advogado ou um defensor público para tipificar o motivo das agressões como transfobia. Ela esteve na Defensoria Pública nesta segunda-feira (6) para pedir ajuda sobre o assunto.
"Não importa se somos estudantes, professoras, assessoras ou profissionais do sexo. Esse país é o que mais nos mata no mundo. Não podemos mais negligenciar os casos. Não podemos mais deixar de não registrar. Precisamos recorrer a legislação que prevê punição para transfobia. Ela tem que ser colocada na prática. Pra isso, o estado tem que treinar seus policiais e delegados. Todo mundo que faz justiça nesse país. Senão vamos continuar sendo mortas e alvos, principalmente, de um grupo político que usa do fundamentalismo religioso para pregar ódio a mulheres trans", destacou.
Questionada sobre o assunto, a Polícia Civil informou que diligências estão em andamento para identificar o autor do crime e esclarecer os fatos. 
Procurada sobre as acusações contra os PMs, a Polícia Militar orientou que a vítima formalize a denúncia nos canais oficiais da corporação para que um procedimento apuratório seja instaurado e as devidas verificações sejam realizadas. O anonimato é garantido.
- Ouvidoria da SEPM: (21) 2334-6045 ou e-mail ouvidoria_controladoria@pmerj.rj.gov.br.
- Corregedoria Geral da SEPM: (21) 2725-9098 ou pelo site https://www.cintpm.rj.gov.br/.
Caso semelhante
No mesmo domingo (5), outra mulher trans foi agredida, mas desta vez em Cabo Frio, na Região dos Lagos. Ariela Nascimento, assessora da vereadora de Niterói Benny Briolly, denunciou que foi alvo de agressão e de transfobia em um bar do município. Ela estava acompanhada do namorado, um homem trans, teve um braço quebrado e ficou com diversos hematomas por causa da violência das agressões.
Nas redes sociais, a mulher fez um grande desabafo e relatou que os atos transfóbicos iniciaram enquanto ela e o namorado trocavam afeto e carinho. "Um homem cis começou a proferir comentários transfóbicos e violentos, o que nos deixou extremamente desconfortáveis e ameaçados. Quando decidimos sair e voltar para casa, fomos surpreendidos por um grupo de homens cis que me atacaram covardemente. Eles me agrediram com chutes e golpes de madeira, e meu namorado, Bruno, também foi ferido ao tentar me proteger", disse.
A vítima foi agredida por pelo menos cinco homens. "Fomos alvos de agressões brutais simplesmente por sermos quem somos: Pessoas trans", lamentou.
O caso foi registrado na 126ª DP (Cabo Frio) e, posteriormente, repassado para a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Cabo Frio. Segundo a Polícia Civil, a investigação está em andamento para esclarecer todos os fatos.