Luciana Rabelo, o marido Sandro Oliveira e seus cachorrinhos Zen e Maya, em BragançaArquivo pessoal

Você provavelmente conhece alguém que se mudou ou que sonha em fazer a mudança para Portugal. Não se trata de uma impressão pessoal, os brasileiros estão cada vez mais realizando a viagem de volta. Dos 1,04 milhão de cidadãos estrangeiros com residência em Portugal, 35% correspondem a brasileiros. É a principal comunidade imigrante do país europeu. Os dados são da Agência para a Integração de Migrantes e Asilo (Aima), do governo português.
Nos últimos anos, Portugal tem se consolidado como destino de turismo e moradia de brasileiros, em motivações nascidas além-mar: segurança, vida mais simples e idioma.
Apesar do grande e crescente fluxo migratório, essa mudança não acontece sem conflitos. A psicóloga Isabella Barros, 53, está há sete anos em Cascais, a poucos minutos de Lisboa. Ela mudou-se de Recife, em Pernambuco, com o marido Ricardo Musafir, 59, e a filha Rafaella Musafir, 17. O impulso para a partida para terras lusitanas foram as perdas financeiras que a família enfrentava no Brasil e a onda de violência no Recife.
"Aqui temos qualidade de vida, sol e praia, fora que o astral é bom. Não tinha como não ser para Cascais a nossa mudança do Brasil", afirma Isabella.
No Recife, ela trabalhava em grandes empresas como Consultora Organizacional e coach para executivos, com uma carreira consolidada. Ao se mudar, formou-se em coach infantil com o intuito de abrir um escritório de desenvolvimento para crianças, mas a empresa não deu certo e Isabella se viu triste, deprimida e frustrada no país estrangeiro.
"Os portugueses não veem necessidade de coach. Eles ainda não estão abertos para trabalhos de desenvolvimento pessoal", considera.
A psicóloga enviava diversos currículos como consultora e coach com certificação internacional, mas quando o acolhimento finalmente chegou, ele partiu de uma rede de brasileiros que moram em Portugal. Atualmente, Isabella está empregada como consultora e gestora em clínicas de odontologia, de donos brasileiros.
A consultora está adaptada à vida em Portugal, mesmo não gostando do inverno. O que pontua como maior dificuldade da mudança é a distância da família.
Luciana Rabelo, profissional da área de beleza e estética, 47, também sofre com a saudade da família no Brasil, mas não se arrepende de ter viajado só com a passagem de ida para Portugal. Natural de Quatis, no interior do estado do Rio de Janeiro, ela decidiu mudar de país para ter estudar 'Estética e Beleza' no Instituto Politécnico de Bragança. Na época cabelereira, ela sentia cansaço da profissão e desejava não apenas ampliar o leque de trabalho, como ter experiência e vivência fora do país.
A escolha por Portugal se deu unicamente por conta da língua. Luciana e o marido Sandro Oliveira, 50, contam que foram bem recebidos em terras lusitanas: "Viemos preparados, pois também ouvimos coisas ruins. Porém, as expectativas de acolhimento foram superadas no trabalho e na cidade, assim como o nosso otimismo com a estrutura da cidade", conta Luciana.
Ela logo conseguiu um trabalho em um salão de beleza, cuja dona é brasileira: "Quem se propõe a mudar tem se propor também a conhecer o lugar, para depois não criticar o país para onde foi. É preciso conhecer antes de escolher, pois não é uma mudança fácil", pontua.
O que os brasileiros podem e o que não podem esperar de Portugal
A ex-executiva Patrícia Lemos, 52, mudou-se do Rio para Portugal há cinco anos, onde abriu uma empresa focada em serviços imobiliários e de realocação para quem também deseja fazer a travessia de forma planejada.
Segundo a empresária, não há país na Europa que entrega para o brasileiro o mesmo que Portugal: comodidade da língua e sol. "É o melhor lugar para recomeçar fora do Brasil, pois é o mais próximo do Brasil que temos".
Nestes anos de empresa, ela entendeu que o brasileiro busca em Portugal um país limpo e seguro.
Com a sua empresa 'Vou mudar para Portugal', Patrícia alerta sobre os erros mais comuns cometidos pelos brasileiros:
— Contar que terá fontes de renda extra em Portugal. "Não é o país do 'se vira'. Não existe comércio informal, vendedores ambulantes, revendedores de roupas ou barracas em praia, por exemplo. Os brasileiros não podem se mudar achando que darão um 'jeitinho' para se sustentar, pois isso não acontecerá. No Brasil, estamos acostumados a fazer brigadeiro, bolo para vender na rua, mas os portugueses não compram e ainda são capazes de denunciar", diz Patrícia.
Quando vão à praia, os moradores de Portugal levam sem cerimônia o seu próprio isopor com comidas e bebidas, uma vez que não tem vendedores ambulantes nas areias. Este é um hábito unânime no país, praticado até por estrangeiros. E no fim do dia a praia está limpa, pois todos retiram o seu lixo.
O único petisco liberado para ser vendido nas areias é a 'bola de Berlim', que lembra o doce sonho, das padarias do Brasil. Fora isso, alimentos e bebidas são encontrados apenas em restaurantes na orla. "E mesmo que tivessem ambulantes, eles não comprariam. Na Europa, a relação com dinheiro é diferente. Ele é usado apenas quando estritamente necessário".
— Achar que, ao chegarem em Portugal, aceitarão qualquer emprego: "A pessoa tem que ir preparada, pois quem tem uma formação educacional e acaba trabalhando em outra área costuma ficar extremamente frustrado e não dá conta emocionalmente".
— Pensar que poderá comprar a crédito. Para fazer cartão de crédito precisa ter conta e o NIF, que é o número de identificação fiscal. "Mas os limites aqui são muito baixos. Para ter uma ideia, quando cheguei aqui, fiz o cartão de crédito do supermercado, meu limite era 200 euros. Fui solicitar aumento apresentando meu IR e não obtive, porque não tinha como comprovar crédito em Portugal, ou seja, não tinha vínculo empregatício aqui, por mais que tivesse um excelente patrimônio no Brasil", explica Patrícia.