Em carta, Júlia afirma que foi ameaçada e coagida no caso do 'brigadeirão' Reprodução

Rio - Em carta escrita antes de se entregar à polícia, Júlia Cathermol, suspeita de matar o namorado Luiz Marcelo Ormond envenenado com um "brigadeirão", afirmou que precisa ser internada e que foi ameaçada e coagida. O texto tinha como destinatário o outro namorado, Jean Cavalcante de Azevedo, que, conforme relatou à polícia, não sabia que estava sendo traído. No documento, Júlia pede o perdão e o apoio de Jean.
Ao namorado, Júlia afirma que Luiz Marcelo estava sempre dopado, e que o beijo no elevador, reiteradamente veiculado pelo noticiário televisivo, era "fingido". "Queria que entendesse que eu estava sendo coagida e sob ameaça. Aquele beijo foi fingido e não passou disso, até porque ele [Luiz Marcelo Ormond] estava sempre dopado, e eu fugia, não dormia nem no mesmo quarto", diz em um trecho da carta.
A suspeita alega ainda que estava "fraca mentalmente" e que sofreu uma "lavagem cerebral". A versão se alinha à hipótese da polícia, que trata a influenciadora digital Suyany Breschak como mandante do crime e detentora de influência espiritual sobre Júlia. A influenciadora se apresentava como "cigana esmeralda". Leia a reprodução completa da carta no final deste texto. 
A polícia investiga que Suyany teria auxiliado Júlia a mentir para Jean. Juntas, as duas inventaram que a suspeita teria conseguido um trabalho de babá na qual precisaria se ausentar por um mês, tempo em que ela passou a morar com Luiz Marcelo. Exames do Instituto Médico Legal confirmaram a presença de morfina e outras substâncias no corpo da vítima.

O homem com quem Júlia mantinha esse segundo relacionamento também prestou depoimento e apresentou áudios e fotos enviados por aplicativos de mensagem onde ela tentava comprovar o trabalho de babá, no qual alegou que receberia R$ 11 mil de remuneração. No entanto, as investigações demonstraram que as crianças que apareciam nas imagens eram filhos da própria Suyany. O delegado encontrou ainda semelhança na voz da cigana e da 'contratante' do serviço.
As duas suspeitas estão presas. Suyany está presa há doze dias e Júlia decidiu se entregar na noite da última terça-feira, após ficar uma semana escondida em um hotel no Centro do Rio, e utilizou o direito de ficar em silêncio.

As investigações mostram que cerca de três dias depois da morte de Luiz Marcelo, Júlia seguiu para a Região dos Lagos do Rio com o carro da vítima. O veículo foi entregue a Suyany, como parte do pagamento de uma dívida de 600 mil reais pelos trabalhos espirituais realizados. O carro estava cheio de objetos de Luiz Marcelo.
Depois, o veículo foi entregue a um ex-namorado de Suyany, Victor Chaffi, que responde em liberdade pelo crime de receptação.
Confira a reprodução do texto da carta:
"Jean, precisava te encontrar para te contar o que aconteceu, mas dada a minha situação vai ser complicado no momento. Eu sei que você está p*to comigo, se sente traído e enganado, e eu entendo. Mas queria que entendesse que eu estava sendo coagida e sob ameaça. Aquele beijo [foto acima] foi fingido e não passou disso, até porque ele [Ormond] estava sempre dopado, e eu fugia, não dormia nem no mesmo quarto.
Eu sei que não ameniza, mas tudo o que está acontecendo foi porque fui fraca mentalmente, sofri uma lavagem cerebral e fui ameaçada de morte, você e minha mãe também. Então eu surtei. Ainda estou surtada, na verdade estou muito pior, sem saber lidar com tudo isso. Ainda mais sem seu apoio. Eu preciso muito do seu amor, do seu apoio e do seu perdão. Me ajuda a enfrentar tudo isso, fica do meu lado.

Você e todos sabem que se eu estivesse em plenas faculdades mentais, jamais teria feito nada disso, teria ido pro Chile com você. Você acha mesmo que eu estava sã? Esses dias eu estou em surto, me machuco, me recuso a comer, só choro. Estou tendo o apoio de minha mãe e Marino [padrasto], mas você me acalma, me protege, e eu me sentiria mais forte.

Desculpa citar isso, mas a sua ex fez por prazer, além de não ter cuidado de você quando você mais precisou, e você implorou para voltar. Por que não pode ao menos pensar em me dar uma segunda chance?

Agora é a hora que eu mais preciso de você, por favor, não me abandona, fica do lado da sua mulher nesse momento difícil. Tenho certeza que daria a vida por você. E foi o que fiz. Estou sem celular, os celulares da minha mãe e Marino estão hackeados, e talvez o seu também esteja. Então não sei como me comunicar com você. Pensei nessa carta. Quando ler, apaga a foto para não ficar salva. Me responda por carta também, ou então fala em código, sei lá, mas me responde por favor.

Eu preciso ser internada. Estou com medo de fazer coisas piores comigo mesma, mas não sei se vai rolar. Seu pai não quer pegar o caso por causa do beijo, mas como ele sempre diz, "não é o que você faz, mas por que faz". Tenta entender o motivo. Se você pedir, ele aceita me ajudar também.

Estou escrevendo essa carta vendo o jogo do Fluminense, e eu só queria estar vendo com você. Eu vi eu vi que apagou nessas fotos do Instagram, talvez já tenha tomado sua decisão. Mas eu li as mensagens que escreveu dizendo que eu sou sua vida e quer viver comigo. Eu também quero, quero nossa casa, nosso filho... eu só preciso passar por isso primeiro. Te imploro mais uma vez para não me abandonar quando eu mais preciso. Sairemos mais forte disso. Me apoia, por favor. Sem você, não vou aguentar. É muito pesado. Você me equilibra. Eu sinto muito por tudo isso, há poucos dias que minha mente foi liberta.

Sei que é difícil, mas, por toda a nossa história, tenha piedade de mim. Preciso do seu amor. É claro que você confia menos em mim agora, mas isso eu reconquisto. Tenho medo de você me olhar diferente. Eu estou aqui, eu estou de volta, eu te amo como nunca amei ninguém e nunca vou amar. Me aceitando de volta ou não, te levarei para sempre comigo.

Aguardo seu retorno por carta ou por códigos. Eu sei que no fundo você quer me perdoar. Preciso que cuide de mim, e eu cuidarei para sempre de você. Seu abraço curaria muita coisa agora."
Namorado de Suyany conta que viu dupla moendo remédio
Já o namorado de Suyany Breschak afirmou em entrevista ao programa "Fantástico" da TV Globo que viu a influenciadora e a namorada da vítima, Júlia Cathermol, moendo o remédio que seria misturado ao "brigadeirão envenenado" usado no homicídio. Ele afirma ter contado à polícia tudo o que viu e também o que ouviu de Suyany. "Ela [Suyany] chegou a falar que a Julia mandou uma mensagem assim: 'eu vim aqui malhar e ele está lá mortinho". Após matar o namorado, Júlia permaneceu no apartamento com o corpo durante três dias.
A testemunha afirmou ainda que duas armas que estavam no carro da vítima foram revendidas por R$ 14 mil.
Suyany tem mais de 8 milhões de seguidores nas redes sociais. Ela se promovia como "cigana esmeralda" e oferecia serviços espirituais.
A relação com a vítima
A suspeita começou a se relacionar com o empresário vítima ainda em 2013. À época, Júlia tinha apenas 18 anos enquanto Marcelo tinha 34. Os dois ficaram juntos até 2017, quando se separaram, mas voltaram a se falar em março deste ano. Segundo a investigação da 25ª DP (Engenho Novo), Júlia teria procurado Luiz que, inclusive, teria cogitado formalizar uma união estável com a suspeita.

Segundo publicação nas redes sociais, Luiz chegou a mudar o status das suas redes sociais para casado. Nesse momento, dia 19 de abril, os dois já moravam juntos no apartamento do empresário, no Engenho Novo, Zona Norte do Rio. O local é o mesmo onde o corpo da vítima foi encontrado, cerca de um mês depois, no dia 20 de maio.