Antônio, Bruno e Maria Adélia se despedem do pai, Saturnino Braga, no Palácio da CidadeReginaldo Pimenta / Agência O Dia
Rio - Familiares, amigos e autoridades se despediram, na tarde desta sexta-feira (4), do ex-prefeito do Rio, Roberto Saturnino Braga, que morreu aos 93 anos. O político, que também foi senador, deputado federal e vereador, estava internado no Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital Pró-Cardíaco, em Botafogo, na Zona Sul, recebendo cuidados paliativos com um "quadro grave e irreversível", segundo a unidade.
O velório aconteceu no Palácio da Cidade, em Botafogo, sede oficial da prefeitura. Bruno Saturnino Braga, filho mais velho de Roberto, lembrou de como o pai era em casa e enquanto trabalhava.
"Como prefeito, a rotina nossa era aqui nesse Palácio. Ele despachava aqui. Eu trabalhei com ele, fui chefe de gabinete, o acompanhei durante boa parte de sua vida política. Em casa, ele era um pai bacana, bom educador, um cara sereno e tranquilo, que soube incutir em nós valores importantes de integridade e de ética. Todo mundo lembra muito do legado dele como uma figura pública, íntegra e honesta, mas tem mais. Ele era uma pessoa muito mansa, hábil, negociador, sabia ouvir e ser duro quando precisava. Era um homem muito agregador e uma pessoa muito boa de se viver. Gostava muito de ser filho dele", disse Bruno, hoje aposentado.
Bruno destacou que o pai foi um exemplo de integridade e de ética para diferentes gerações da família. Além dele, Saturnino teve outros dois filhos, Antônio e Maria Adélia, que estiveram presentes na cerimônia. O ex-prefeito, que morreu nesta quinta-feira (4), ainda deixou seis netos e dois bisnetos.
"Gostaria de ressaltar esse exemplo, que foi para nós e para as futuras gerações, de integridade, de ética, um homem público exemplar. Só escuto as pessoas dizerem que todo político é igual, que só tem ladrão, mas não é verdade, não é assim. Ele é um dos exemplos principais do contrário", disse o filho.
O prefeito Eduardo Paes (PSD) compareceu ao velório e valorizou o legado que Saturnino Braga deixou para a cidade, lembrando que ele foi o primeiro prefeito eleito diretamente, depois da redemocratização do país, com quase 40% dos votos válidos, como candidato do PDT.
"Primeiro, eu quero deixar registrado o meu agradecimento ao Saturnino e passo isso para os filhos e amigos dele. Ele foi uma pessoa que honrou a vida pública, que honrou a política. Nesse momento da história que nós estamos, lembrar do Saturnino e homenageá-lo é mais importante ainda. Ele deixou um legado da sua luta pela educação, da sua visão de cidade, de uma visão mais justa e mais humana, de diminuição de desigualdade, olhando para a população mais pobre e democrática. Era um sujeito de esquerda, progressista, que tinha uma visão humana do papel que a gente pode cumprir na prefeitura. Foi um grande homem público, honesto, sério, sempre muito equilibrado, elegante, respeitador de certas formalidades que a vida pública nos exige", destacou Paes.
Braga governou o município entre 1º de janeiro de 1986 a 1º de janeiro de 1989. Durante esse período, ele foi obrigado a declarar falência após ser surpreendido negativamente com a decisão do Banco Central que proibiu novos empréstimos para a prefeitura, que estava endividada. Segundo Paes, Saturnino merece destaque pelo o que teve que enfrentar.
"Ele enfrentou todas as dificuldades possíveis e inimagináveis. A Constituição de 1988 mudou a realidade dos municípios, que não tinham poder de arrecadação. Você vinha de uma ditadura, muita concentração de recursos a nível central e o fato do sujeito não ser amigo desse poder central tornava a vida muito difícil. Como representante dos cariocas, queria deixar esse agradecimento ao Saturnino por tudo que ele fez na nossa cidade, pelo tempo dedicado, pelo sacrifício que ele impôs a sua família. Que Deus possa confortar vocês, que possa conduzi-lo a esse mundo diferente e que ele possa continuar nos conduzindo e inspirando para que a gente possa construir um Brasil melhor. Viva Saturnino Braga", finalizou o prefeito.
O cineasta Luiz Carlos Prestes Filho contou sobre a importância do político para a valorização da democracia. Segundo o amigo, na década de 1980, Braga foi responsável por assinar o acordo de cidades-irmãs entre o Rio e Leningrado, município da União Soviética e atual São Petersburgo, na Rússia, que possibilitou a troca de informações, realização de atividades comerciais e destaque na área cultural.
"Antes de mais nada, estamos aqui prestando homenagens a um democrata. Tem dia que a democracia está acima das ideologias, acima dos regimes e acima dos governos. O Saturnino foi um combativo senador, a quem nós devemos o retorno da democracia ao Brasil. Como prefeito, foi aquele que colaborou muito para que a democracia fosse robusta. Devemos a ele a manutenção da democracia hoje no Brasil. Guardo muitas memórias, encontros interessantíssimos, mas todos muito breves. Perdemos um grande carioca, um grande brasileiro, mas a história do Brasil ganhou um homem muito coerente e muito firme", disse.
Entre as coroas de flores enviadas como homenagem estava a do Presidente Lula (PT) e da Primeira-Dama Janja, que descreveu Saturnino como "grande defensor da democracia no Brasil."
Após o velório no Palácio da Cidade, Braga foi enterrado no Cemitério São João Batista, também em Botafogo.
Carreira política
Carioca nascido em 13 de setembro de 1931, Saturnino se formou em Engenharia pela Universidade do Brasil - atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) -, em 1954. No mesmo ano, ingressou no BNDE (atual BNDES), onde se especializou em engenharia econômica. O político também foi aluno de Celso Furtado - um dos maiores economistas do país -, na Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL).
Vindo de uma família influente e tradicional na política de Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, era filho e neto dos deputados federais Francisco Saturnino Braga e Ramiro Saturnino Braga, respectivamente. Em 1963, deu início à sua carreira política, como deputado federal pelo estado do Rio, por uma coligação formada pelo PSB, MTR e PST, cargo que ocupou até 1967.
Com o início da Ditadura Militar e a instauração do bipartidarismo, ingressou no MDB e, no ano de 1975, iniciou seu primeiro mandato como senador pelo Rio, que durou até 1985. Entre 1992 e 1996, retornou à política como vereador do Rio e, após isso, assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Econômico da Prefeitura de Niterói, a convite de Jorge Roberto Silveira, onde permaneceu até 1998. Em 1999, retornou ao Senado, onde encerrou sua carreira política, em 2007.
*Colaboração de Reginaldo Pimenta
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.