Tradicional ato no Monumento Zumbi dos Palmares, na Avenida Presidente Vargas, no CentroArquivo / Agência O Dia

Rio - O Dia Nacional de Zumbi dos Palmares (1655-1695) e da Consciência Negra, celebrado nesta quarta-feira (20), relembra a morte do líder do maior quilombo da América Latina e busca educar a população sobre a resistência e o sofrimento dos negros escravizados, com a cidade do Rio sediando diversos eventos, incluindo um cortejo a Zumbi, rodas de samba, apresentações artísticas e o tradicional Jongo da Serrinha.
Pela primeira vez desde 2011, quando foi instituído oficialmente, o feriado será celebrado em todo o território nacional com o objetivo de reforçar a importância da cultura africana no Brasil. Em entrevista ao DIA, o babalaô doutor Ivanir dos Santos reforçou a importância da data para a população negra.
"Essa data e esse herói foram construídos de baixo para cima, pelo povo, por isso é muito importante essa celebração. Zumbi é de fato um herói popular. Mas não é só o Zumbi, é o que ele representa para uma luta de anos de resistência. É isso que simboliza essa data: dignidade, reflexão, e celebração", disse o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Uma das principais comemorações vai ocorrer no Monumento Zumbi dos Palmares, na Avenida Presidente Vargas, Centro do Rio, a partir das 9h. O espaço promete atrair muitos cariocas para uma série de atividades que acontecerão ao longo de todo o dia. Além da tradicional lavagem da estátua, o lugar será palco de diversas manifestações culturais.
O tradicional Cortejo da Tia Ciata é uma destas atrações. Ele acontece a partir de 12h, com um desfile de quase 2h pela avenida. Durante o percurso, o público será guiado por um passeio histórico e cultural pela região, resgatando memórias e celebrando a resistência da população negra carioca.
Gratuito, o evento começa às 10h, com uma apresentação das baianas no Centro de Artes Calouste Gulbenkian, na Praça Onze. Com entrada gratuita, a celebração vai receber representantes de escolas de samba e outros convidados, que farão shows musicais até o início do cortejo. Após o desfile, o público vai retornar ao Calouste para o encerramento da festividade, com show do "Samba da Cabaça".
"É uma celebração das nossas raízes e da potência da ancestralidade negra. É um momento de exaltar nossa história, afirmar nossos direitos e inspirar as futuras gerações a se reconhecerem como protagonistas de suas próprias narrativas", disse Gracy Mary Moreira, bisneta e gestora da Casa da Tia Ciata, que organiza o evento.
O Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira (Muhcab), na Gamboa, Zona Portuária, vai promover a Feijoada da Dida, unindo tradição, sabor e música. Com direito a roda de samba que vai homenagear mestres do gênero e celebrar a força da cultura negra, o evento também contará com uma apresentação da artista Rona Neves, com sua performance em "INCORPORAÇÃO N°1 - defumAÇÃO". A festividade tem entrada franca e acontece das 10h às 21h, na Rua Pedro Ernesto, nº 80.
Na mesma região, conhecida como Pequena África, o Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPN) vai exibir o documentário "Cais do Valongo: Luta pela Memória e Reconhecimento", promovendo uma reflexão sobre o legado de um dos sítios arqueológicos mais importantes para a história afro-brasileira. O evento, de realização da Defensoria Pública da União (DPU) no Rio de Janeiro, começa às 16h. Em seguida, a partir das 17h, o público poderá participar de uma roda de conversa com representantes de diversos setores, sobre a preservação e o reconhecimento do espaço.
Já em Padre Miguel, na Zona Oeste, a Praça das Juras será palco do festival Terreiro de Crioulo, que contará com shows de diversos artistas ligados ao movimento negro. A programação prevê uma festa com direito a apresentação do tradicional Jongo da Serrinha, além de sambas de rodas, capoeira, entre outras manifestações culturais afro-brasileiras. O evento é gratuito e para participar basta resgatar os ingressos neste site.
A Cidade das Artes, na Barra da Tijuca, vai receber diversos espetáculos musicais que buscam valorizar a cultura afro-brasileira, entre elas o "Minha Cútis é Negra", que propõe um olhar sensível para a realidade de artistas drags e negras do Rio; e o "Canjerê do Amaro", show do cantor e compositor Marcelo Amaro, com músicas de raízes africanas. As apresentações começam às 17h e os ingressos podem ser adquiridos no site oficial. As entradas custam entre R$ 10 e R$ 50, de acordo com cada atração. A Cidade das Artes fica na Avenida das Américas, número 5.300.
A Zona Norte do Rio vai abrir espaço para a 13ª Marcha da Periferia, que sai do Viaduto Negrão de Lima, em Madureira, até o quilombo urbano Agbara Dudu, em Oswaldo Cruz. Com concentração marcada para às 11h, a caminhada começa às 13h e promete levar diversão aos participantes, com samba, música e culinária de raízes afro-brasileiras.
Quem foi Zumbi dos Palmares
Zumbi nasceu em 1655, no Quilombo dos Palmares, em Alagoas e se tornou um ícone da resistência negra à escravidão ao liderar os palmarinos por 15 anos. O espaço era uma comunidade livre formada por escravos fugitivos das fazendas da região da Serra da Barriga, sendo considerado o maior quilombo da América Latina no período colonial.
Umas das vertentes sobre a história de Zumbi é que ele teria nascido livre, mas aos sete anos acabou sendo capturado e entregue como escravo a um padre católico. Aos 15 anos, teria fugido e retornado a Palmares. Esta versão, no entanto, não é considerada por muitos historiadores, que sugerem que ele era sobrinho de Ganga Zumba e viveu no local até se tornar general do quilombo.
Ganga Zumba liderava Palmares até 1678, quando recebeu uma oferta de paz das autoridades coloniais, concedendo a liberdade para os nascidos em Palmares. A proposta, porém, ordenava que todos os escravos fugidos deveriam retornar a seus donos. De acordo com historiadores, Zumbi ficou indignado e defendeu a liberdade de todos. Acredita-se que Zumbi, ou um de seus aliados, tenha assassinado Zumba.
Após este episódio, Zumbi se declarou líder do local e conduziu os palmarinos nos anos seguintes até as tropas do bandeirantes Domingos Jorge Velho (1641-1705) atacarem e destruírem o quilombo. Zumbi fugiu de Palmares e viveu cerca de um ano e meio se escondendo no mato e sobrevivendo de pequenos ataques realizados por ele e seus companheiros.
No dia 20 de novembro de 1695, Zumbi teve seu esconderijo denunciado por um de seus aliados. Ele foi capturado, torturado e morto, tendo a mão cortada e a cabeça decepada — esta foi levada à Recife para ser exposta em praça pública.
*Reportagem do estagiário João Pedro Bellizzi, sob supervisão de Thiago Antunes