Reflorestamento com mudas variadas do Projeto Guapiaçu para restauração da Mata AtlânticaFernando Frazão/Agência Brasil
Projeto em Cachoeiras de Macacu promove educação ambiental e reflorestamento da região
Patrocinado pela Petrobras, o Guapiaçu ainda trabalha com o monitoramento de animais, como o muriqui-do-sul, maior primata das Américas, e a anta
Rio – Promover transformação ambiental. Esse é o objetivo do projeto Guapiaçu, do Instituto Ação Socioambiental (ASA), em Cachoeiras de Macacu, Região Metropolitana do Rio. Recheado de belezas naturais, o município passou por períodos difíceis, vendo seus recursos mais preciosos — o verde e a água — esgotarem com o passar do tempo. No entanto, o trabalho realizado com o patrocínio da Petrobras tem ajudado a recuperar a esperança de dias melhores e qualidade de vida. Desde julho de 2013 a janeiro de 2016, na primeira fase da iniciativa, mais de 300 hectares foram reflorestados até o momento.
A convite da Petrobras, O DIA esteve em Cachoeiras de Macacu para visitar o projeto que visa reerguer o município. Em uma programação de dois dias, a reportagem visitou alguns dos locais onde são feitos trabalhos de educação ambiental, com alunos da rede pública da região, e os reflorestamentos, além de tomar um "banho de natureza" e visitar o maior Jequitibá-Rosa do estado.
Crianças são levadas à sala de aula da natureza
No Parque Estadual dos Três Picos, especificamente no Núcleo do Jequitibá, o projeto Guapiaçu trabalha com crianças do ensino fundamental até adolescentes do ensino médio. Na reserva ecológica, os pequeninos aprendem sobre a importância de preservar a natureza enquanto têm contato direto com ela.
"A partir do ensino fundamental a gente tira o aluno de sala de aula e traz para essa sala de aula aqui. A depender da idade, a gente leva para o parque dos Três Picos para fazer a trilha ou nós vamos para o parque que é Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio Macacu, bem dentro da cidade. Ali, a interação com o rio que é um tema que abordamos também em relação à saúde da cidade, a saúde do rio e a qualidade da água", explica a presidente do ASA, Gabriela Viana.
Na sede do Parque dos Três Picos, as crianças recebem uma explicação sobre a reserva ecológica e sua história, além de curiosidades. O coordenador do Núcleo Jequitibá, Leomir Ferreira, celebra a parceria do parque com o projeto, ressaltando a importância da conscientização ambiental desde a infância.
"É muito difícil, mas o trabalho que a gente desenvolve aqui no núcleo Jequitibá, em parceria com ASA, por exemplo, é importantíssimo. A gente está conscientizando desde a criancinha pequenininha até o adolescente. Isso acaba criando uma conexão, uma identidade das pessoas. E é aquela velha história: quem conhece quer proteger, preservar. As pessoas, conhecendo as unidades de conservação, têm a oportunidade de conhecer, criar um vínculo, identidade, e automaticamente vão querer proteger. A melhor forma de você proteger, de criar princípio de biodiversidade, é conscientizando, é educação ambiental. Eu entrei no parque há 12 anos e hoje eu consigo ver claramente que as coisas têm mudado", afirma.
"Se a gente for parar para analisar, o conceito de sustentabilidade é preservar hoje para ter amanhã, sabendo usar. A ideia do parque é basicamente essa: gerar pertencimento para que as pessoas possam se sentir parte daquele local e assim cuidar, amar. A gente cuida do que a gente ama", acrescenta a agente de defesa ambiental Elaine Simonato, responsável por conduzir uma atividade sensorial com as crianças.
Depois de conhecerem o parque, as crianças são pintadas com tinta neon e conduzidas a uma sala escura, com sons da natureza. Após alguns segundos, uma luz negra é acesa e desenhos com detalhes neons se revelam nas paredes, simulando a noite na floresta. Na atividade, os pequenos são desafiados a achar alguns animais camuflados. Depois, a luz é acesa e outros novos animais precisam ser encontrados. Tudo isto enquanto eles recebem explicações sobre as florestas e sua biodiversidade.
Feito isso, é chegada a hora de entrar na mata e conhecer a trilha do Jequitibá-Rosa. Definido como interpretativo, o percurso foi enriquecido com placas informativas, como sobre o ciclo da água, formação do solo e serrapilheira. Com idade estimada em mil anos e uma altura de cerca de 50 metros, a árvore imponente se destaca em meio às outras, localizada em cima de uma pedra. Em média, são necessários 12 adultos ou 20 crianças para contornar seu tronco.
Educação ambiental, reflorestamento e desenvolvimento de mãos dadas
Durante a trilha, Tatiana Horta, vice-presidente da ASA e coordenadora operacional do Guapiaçu, explica que, além do reflorestamento da região e da educação ambiental, o projeto também acompanha o desenvolvimento de alguns animais no Parque dos Três Picos. "As nossas ações de monitoramento de biodiversidade incluem monitoramento da paca, da onça parda, do muriqui-do-sul e da anta. A anta é um animal que está extinto aqui no estado do Rio".
Para Gabriela, o trabalho de educação ambiental vai além das crianças. "Falar para a criança sobre educação ambiental é mole. Agora, convencer o proprietário antigo de que ele pode ceder uma área para fazer restauração sem perder a produtividade e ainda ganhar com biodiversidade em sua propriedade, esse é um trabalho forte que a gente faz", diz.
"Qual é a vocação dessa região? A vocação dessa região é produzir água, mas para produzir água a gente tem que trabalhar com biodiversidade, gerar riqueza e valor para o indivíduo. O indivíduo tem que entender que aquilo é um modo de vida, ele não precisa só cortar a árvore para viver, ele tem outras alternativas. Para a gente, a biodiversidade já é valorosa, precisamos mostrar para o trabalhador rural que ele também pode ganhar dinheiro", acrescenta.
Com os alunos do ensino médio, o Guapiaçu trabalha com a aproximação dos jovens dos rios e explicam a importância da água para a região. Após um curso de capacitação de 40 horas, os adolescentes são levados a diversos pontos de coleta de água. Em seguida, vão ao laboratório para uma análise química, física e biológica da água coletada por eles.
"Os alunos de ensino médio são capacitados no curso de 40 horas e, depois disso, quando se tornam aptos a ir à beira dos rios, a gente vai numa van com pelo menos 12 pessoas. chegando lá, eles coletam as águas, medem a temperatura e a turbidez, que é muito importante para saber se está tendo a presença de iluminação", explica a educadora ambiental Ríllary Lemos.
"Aí vamos para o laboratório, fazemos a análise química, onde analisa o PH, oxigênio dissolvido... ao todo são 9 parâmetros químicos e 16 pontos de coleta. A gente tenta fazer pelo menos uns seis pontos a cada coleta é, mas a intenção é que todos os jovens visitem vários pontos para eles também conseguirem fazer essa comparação das diferenças entre os rios", finaliza.
Com mais de 65 mil hectares e formando um corredor ecológico que passa pelos municípios de Silva Jardim, Nova Friburgo, Cachoeira de Macacu, Guapimirim e Teresópolis, o Parque Estadual dos Três Picos é a maior Unidade de Proteção Integral estado do Rio de Janeiro. Sobre a parceria com o projeto Guapiaçu, a gestora do parque, Maria Alice Picoli, celebra:
"O parque tem uma área muito grande, e nós, enquanto órgão público, não temos braços para alcançar todos os lugares, então é por isso que a gente conta com os nossos parceiros. O projeto Guapiaçu, do ASA, tem um valor que a gente não consegue nem dimensionar, porque eles são um dos nossos olhos, um dos nossos braços, alcançando pessoas, trabalhando junto com a gente e assim a protegendo a nossa biodiversidade. Eles ajudam muito a proteger, guardar, conservar e levar a informação, conhecimento, educação ambiental, que é assim que acreditamos que vamos transformar as próximas gerações".
Instituto Vital Brazil foi um dos primeiros parceiros do Guapiaçu
Uma das abordagens de reflorestamento do Guapiaçu é em propriedades de moradores da região. O formato, no entanto, não foi muito bem-visto pela Petrobras de primeira. Foi então que surgiu a parceria com o Instituto Vital Brazil e a Universidade Federal Fluminense (UFF).
"A gente falou para a Petrobras: 'olha, nós vamos restaurar na área dos outros'. Eles ficaram assim, 'poxa, mas a gente vai fazer isso para os outros, ainda não vai ter curso nenhum e a gente tá pagando a restauração'. Então, a gente já foi procurar primeiro os parceiros que são institucionais. O Instituto Vital Brazil, sendo um órgão público, de pesquisa, e a fazendo escola da UFF, são dois parceiros que cederam áreas para fazermos a restauração", conta Gabriela.
"O instituto e a Petrobras viram com muito bons olhos, mas a área não era boa. Aqui tinha cavalo e era onde eles eram soltos para pastar. E a área que cederam era uma parte encharcada e a outra seca e compactada demais", explica.
Segundo ela, a parceria entre o Guapiaçu e o Vital Brazil começou com receios por parte do proprietário do terreno, mas logo se tornou bem-sucedida à medida que a floresta foi crescendo nos 10 hectares cedidos ao projeto.
"A gente não obrigou ninguém, somente oferecemos isso e, no final das contas, a nova gestão agradeceu e falou: 'Não, realmente vai ser muito bom para a propriedade toda'. Nossa melhor propaganda é a nossa presença na propriedade. Na hora que a gente começa a plantar e o proprietário, mesmo que não seja ele próprio plantando, vê a árvore crescendo, aquilo mexe por dentro. A melhor propaganda é quando um vizinho visita o outro".
Embora a floresta seja recente, já que o plantio começou em 2020, o antes e depois da região impressiona. Onde era uma área de pasto, hoje abriga diversas árvores, de várias espécies endêmicas, já que o projeto chegou à conclusão de que as mudas da região se adaptam melhor ao local.
"A semente que eu coleto aqui é de uma planta que já está adaptada aqui. Então, quando eu pego essa semente para germinar, ela germina muito mais. A nossa experiência mostra que, comprando sementes de fora, mesmo sendo da Mata Atlântica, mas de outras regiões, a taxa de germinação é bem inferior. Nós temos o trabalho de mapear onde é que estão essas matrizes, mobilizar esses coletores de semente, para mostrar a eles que podem coletar que a gente vai comprar essa semente", pontua Gabriela.
"Vamos produzir essas mudas com parceiros locais, com produtores e trabalhadores rurais da região. Também é uma outra opção de atividade econômica na região, para garantir, no final das contas, que essa floresta que a gente está plantando, seja mais adaptada a essa região. Então, o crescimento dela vai ser mais rápido também. Para cada hectare, você precisa de 1.000 a 1.700 mudas", enumera.
Gabriela explica, ainda, sobre como os reflorestamentos nas propriedades privadas contribuem para o Parque dos Três Picos: "A gente começou aqui, foi para UFF e o proprietário da frente também abriu a porteira. São três propriedades e estamos fazendo um corredor naturalmente, com uma ligação de pequenos fragmentos aqui, dando força para esse ecossistema de suporte do Parque Estadual dos Três Picos".
"Hoje, o que mais impacta os fragmentos de floresta é o que chamamos de efeito de borda. Essas árvores que ficam na borda, elas não conseguem se desenvolver plenamente, elas têm mais incidência de luz, então também têm menos fauna que vai fazer a dispersão. Porque a gente planta, mas depois quem que segue fazendo o trabalho são os bichos. Eles é que vão enriquecer esse ambiente. Quando fazemos outros pequenos fragmentos ou pequenos corredores ao redor de um grande fragmento, como o [Parque] dos Três Picos, a gente está diminuindo a pressão sobre esse grande fragmento. A viabilidade dele fica melhor é maior do que se ele tivesse sozinho, se ele fosse uma ilha no meio de um pasto", afirma.
Com as crises climáticas e os ecossistemas cada vez mais desequilibrados, muitas pessoas já desistiram de criar hábitos que ajudem a natureza, já que muito provavelmente não desfrutarão das mudanças positivas. Emocionada, a presidente do ASA falou sobre o assunto e a importância de pensar como o planeta será deixado para as gerações futuras.
"Ah, me motiva saber que eu estou deixando para os meus filhos um lugar melhor para viver. A gente planta para os outros, a gente não planta para a gente. Eu acho que plantar uma árvore é um ato muito generoso. Olha, eu sou veterinária, mas eu me emociono muito mais com as árvores do que com os bichos. Eu, eu plantei um Jequitibá com as cinzas do meu avô. E eu muito provavelmente não vou me sentar embaixo desse Jequitibá para usufruir da sombra. Mas eu vou deixar o Jequitibá para os meus filhos, para os meus netos".
Convencimento ainda trabalhoso
Sobre os parceiros, Gabriela conta que o trabalho de convencimento é o mais difícil. "A gente tem dois perfis de pessoas que têm uma fazenda: as que a renda não vem dali, mas ele também não quer desvalorizar. E aqueles que sobrevivem dali e não querem perder nenhum palmo de terra. Abordamos e falamos assim: 'Mas você tem uma nascente que você gostaria de recuperar?' Isso quando ele abre a porteira, porque várias vezes a gente vai 10 vezes na propriedade, consegue falar só com um funcionário e ele fala assim: 'ó, o patrão não deu autorização para seguir daqui adiante, então você tem que voltar'".
"Nos últimos 6 anos, nós visitamos mais de mil propriedades, fomos recebidos por duzentas e dezesseis aceitaram fazer parceria com a gente. Essa é a taxa de retorno. Mas a gente sabe que o começo é sempre mais difícil. Durante o nosso acordo de cooperação, a gente tem que manter aquela área, fazer aceiro, cerca, até porque é o nosso resultado. A gente também permite, que o proprietário escolha quais plantas quer colocar, contanto que não seja espécie exótica, ele pode dizer: 'Ah, mas eu queria colocar mais Araçá, eu queria colocar mais pitanga'. A gente a gente convida eles a pensar nas plantas que vão, justamente para criar esse vínculo com aquela área", explica.
Ao falar sobre os próximos passos do projeto, Gabriela revela um de seus maiores desejos: "O nosso sonho é fazer o nosso próprio pomar de sementes. Plantar essas árvores para a gente coletar. Acho é sim, é por aí mesmo. Trabalhar com agrofloresta e trabalhar com a cadeia produtiva da restauração, como alternativa inclusive econômica para a região, porque ela está muito pressionada pela região metropolitana. Hoje, a gente tem parceiros, proprietários rurais que tem fragmentos. Nós também vamos nos Três Picos, via Inea. Então assim, eles coletam no Três Picos, levam para o banco de sementes deles e aí a gente pega. Fazemos esse processo por ofício. O Estado também não pode vender isso, então a gente oferece em troca serviços ou equipamentos que eles precisam", conta.
Fazenda escola da UFF abriga floresta recém-plantada
Para iniciar uma floresta, não basta apenas jogar um punhado de sementes no solo e esperarem elas nasceres. Durante a visita ao plantio do Guapiaçu na fazenda escola da UFF, o encarregado de campo de florestamento Leonardo Wenderrosccky explicou o passo a passo necessário para começar uma floresta do zero.
"Usamos um perfurador de solo, que faz essa abertura, chamada de berço, já no tamanho ideal, suficiente para a raiz poder se expandir aqui dentro. Na hora do plantio, a gente vai colocar a terra, com adubo, e no fundo vem o hidrogel. Depois a gente completa com terra e no final de tudo, para a plantinha ter alimento, a gente pega matéria orgânica e vai cobrir formando uma coroa, justamente para manter a umidade no pé da muda. Quando essa matéria for se decompondo, vai liberando os nutrientes de volta para o solo, então serve como um tipo de adubação também", conta.
Um dos itens que mais chama a atenção no plantio é o hidrogel. Segundo a engenheira florestal do Guapiaçu, Erika Melo, o gel é "um polímero usado para garantir que a planta vai ter uma disponibilidade de umidade por um tempo de pelo menos uns 30 dias. Esse hidrogel depois ele hidrata de novo e consegue aguentar mais tempo. É tipo um gel de fralda de bebê, aquele mesmo mecanismo".
Durante a visita, o grupo de jornalistas teve a oportunidade de deixar sua marca e plantar uma árvore, contribuindo para o reflorestamento da área. A repórter do DIA escolheu plantar uma muda da espécie Peltophorum dubium, popularmente conhecida como Canafístula.
Amanda Borges, consultora de responsabilidade social da Petrobras, fala sobre a parceira com o projeto. "É uma parceria de mais de 10 anos que tem como objetivo principal trazer ganhos e biodiversidade. Esse apoio voluntário da Petrobras é uma iniciativa que potencializa esses ganhos para as pessoas e para a natureza. O programa Petrobras Socioambiental, que estrutura os investimentos socioambientais voluntários da companhia, traz essa proposta de que todo projeto tem que ter a integração da dimensão social com ambiental. E no projeto Guapiaçu isso fica bem claro", inicia.
"Para você promover a restauração das florestas e gerar um legado, em relação ao conhecimento sobre esse território, a biodiversidade, você precisa ter a inclusão das pessoas na execução, na elaboração dessas ações. O projeto traz ganhos para a biodiversidade, na restauração florestal, e ganhos para as pessoas, conscientização e envolvimento da comunidade nas ações", continua.
"Por meio do programa Petrobras Socioambiental, a gente se compromete, no nosso plano estratégico, em aumentar os nossos esforços em conservação da biodiversidade em 30%. Isso, em relação às espécies da fauna ameaçada de extinção, que são protegidas pelos projetos. Em relação à área que é trabalhada pelos projetos, tanto a área recuperada, conservada, como as áreas protegidas, que são fortalecidas, a gente vai aumentar de 2021 até 2030 em 30% essa situação".
"Esse projeto, o Guapiaçu, por exemplo, ele contribui para ambas as metas, tanto em área restaurada, quanto em espécies da fauna ameaçada de extinção que são protegidas. E essa meta está relacionada com o Marco Global da biodiversidade", finaliza.
Fazenda que abriga reflorestamento produz kombucha
Uma das primeiras parcerias do Guapiaçu com uma propriedade privada, o sítio Tamoios, além de abrigar algumas áreas de reflorestamento, também é utilizado para a produção de kombucha, um chá fermentado feito a partir de açúcar e uma cultura de bactérias e leveduras, conhecida como scoby. A fermentação acaba gerando CO2, o que deixa a bebida naturalmente gaseificada, a deixando conhecida como o "refrigerante dos veganos".
Na fazenda, o sócio da Pi Kombucha Tropical, Leonardo de Mattos, explicou sobre o passo a passo da bebida e contou um pouco da história da empresa, gerida por ele e Bruno Kemp.
Na primeira cozinha, baldes armazenam as kombuchas enquanto elas fermentam. Apelidados carinhosamente de berçários, os 35 recipientes, que geram 18 litros da bebida cada um, levam uma espécie de "touca" colorida para identificação dos sabores, nove, no total: pitanga, guaco, hibisco, abacaxi, chá verde, capim limão, alfazema, chá preto e lima da pérsia.
"Tem oito anos que a gente começou com a Pi Kombucha Tropical. Ela começou um pouco antes, mas a empresa existe desde 2016. No início, era só eu e o Bruno. A gente fazia tudo, produzia, envazava, distribuía, vendia... fazia tudo. Até que chegou um momento que não deu mais. Os colaboradores são aqui da região também, que é uma região muito carente de emprego. As pessoas aqui, que trabalham na lavoura jogando veneno em plantação de goiaba, ganha R$ 30, 40 por dia, isso para mim é inconcebível. E a gente conseguiu dar uma qualidade para essas famílias. Hoje são oito [funcionários] aqui e três colaboradores no Rio", conta Leonardo.
A fazenda, que na verdade pertencia ao pai de Bruno, foi um dos desafios de convencimento para o Guapiaçu. Antes de falecer, há cerca de dois anos, Mário Honório não queria abrir mão de parte de sua propriedade para o reflorestamento proposto pelo projeto. Até que tudo mudou depois que uma nascente do sítio secar.
"O primeiro reflorestamento que a gente teve foi por uma necessidade mesmo. Teve uma seca muito grande e o nosso olho d'água secou completamente. O poço ainda tinha água, mas o olho d'água secou, então o pai do Bruno liberou uma primeira parte aqui. Colocou árvores e no ano seguinte o olho d’água já voltou, foi muito rápido, ele regenerou rápido. O restante, que são esses outros 3,8 hectares, feito pela ASA, a gente fez também por estética e por necessidade, porque a gente trabalha com água. A gente precisa de água para poder produzir o que a gente faz. Não estamos plantando árvore, estamos plantando água", afirma Leonardo.
"O primeiro reflorestamento foi feito há quatro anos. E já tem uns dois anos já que a ASA começou a fazer aqui. E a gente assim não parou por aqui, ainda tem muito lugar para plantar. A gente está vendo muito pássaro voltando, coisa que não tinha 10 anos atrás. É uma alegria muito grande", conta ele.
De acordo com a engenheira florestal Erika, como a fazenda era utilizada para a criação de gado, o capim se tornou um dos maiores desafios para o projeto, já que ele pode impedir o crescimento das mudas menores. “Nosso desafio aqui no sítio Tamoios, não é nem problema com fogo, formiga aqui também não é um problema muito, mas aqui tem esse desafio do capim e tem algumas faces que são muito voltadas para o sol, então é um desafio também até que a planta consiga se estabelecer ali”, diz.
Primeiro reflorestamento impressiona
Parte da Reserva Ecológica de Guapiaçu, o local conhecido como Prainha é um dos destinos queridinhos dos turistas nos fins de semana. E quem a frequentava há cerca de 10 anos atrás, hoje encontra um lugar completamente diferente depois do reflorestamento feito pelo projeto, já que o antes e depois é de deixar os moradores boquiabertos.
Onde antes era uma área de pasto, hoje abriga uma floresta jovem que já se desenvolve sozinha. No primeiro projeto, em 2014, o Guapiaçu reflorestou 100 hectares. No seguinte, além de realizar a manutenção, mais 60 hectares foram restaurados. "Quando a gente monitora essa área, observa uma grande quantidade de aves, de animais que agora circulam nessa região, e o relato da população, que diz: 'Gente, no Guapiaçu agora tem uma floresta do outro lado da Prainha e antes era pasto, com gado'", conta Tatiana.
Confirmando o choque com a mudança, a autônoma Angelita Ferraz, de 55 anos, se emocionou ao visitar a Prainha depois de 26 anos sem ir ao local. "Está muito lindo! Bem arborizado, com muita sombra, está lindo. No lugar onde estão as árvores era uma grande praia de areia, por isso que é chamado de Prainha e o rio era mais largo. Nós vínhamos para cá, ficávamos acampados aqui, comendo camarão, tocando viola. Foi um trabalho bem bacana que fizeram aqui, porque está muito bonito, está muito bacana. Não tem palavra para descrever, se eu for falar vou ficar chorando. Muito, muito lindo, muito lindo. É uma sensação muito gostosa, muito é gratificante olhar e ver isso aqui", diz.
Drone termal permite melhor monitoramento dos Muriquis-do-Sul
Um dos investimentos para o projeto, adquirido no ano passado, o drone termal é um poderoso aliado ao monitoramento dos muriquis-do-sul, o maior primata das Américas, fortemente ameaçado de extinção. Com custo de R$ 80 mil, o equipamento permitiu que o projeto acompanhasse o crescimento e os hábitos dos grupos dos macacos.
De acordo com Reginaldo Honorato, membro da equipe técnica do ASA e do Caminho da Mata Atlântica, os macacos geralmente ficam a 300 metros de altitude, chegando até 1.600, 1800 metros.
"O meu trabalho aqui é monitorar a população, uma subpopulação que nós temos aqui nos Três Picos. Essa população tem em torno de quatro grupos, que eu consegui observar, e cada grupo tem mais ou menos de 15 a 20 indivíduos. E dentro desses grupos têm indivíduos menores, mais jovens, têm grupos de indivíduos mais adultos. No último monitoramento que eu fiz, em setembro, a gente viu bastante fêmea com filhote, então eles estão procriando, está tendo jovem. E isso é interessante para o monitoramento, saber que a população está crescendo", destaca.
"São aproximadamente 12 km a 15 km de caminhada diária, subindo umas trilhas já pré-definidas. Nessa trilha, a partir do momento em que eu chego no ponto em que já existe a ocorrência deles, já começo a diminuir o ritmo e observando mais, escutando mais. Chegando no ponto onde a gente sabe que eles ocorrem mais, a 700 metros de altitude mais ou menos, eu paro e escuto. A partir do momento em que eu tenho observação deles ou escuto alguma coisa, aí utilizo o drone termal. O drone termal vai ser utilizado como uma ferramenta para obter os dados quantitativos do grupo", afirma.
Devido a sua pelagem amarronzada, os macacos se camuflam na copa das árvores, o que dificulta o monitoramento sem a ajuda do drone termal. Para a observação, Reginaldo faz dois tipos de trilha: a de bate volta, em que retorna no mesmo dia, e a de pernoite, em que passa a noite e volta apenas no dia seguinte.
"Hoje eu faço duas logísticas no caso de monitoramento. Tem a logística bate e volta, que a gente vai acordar cedo e entrar na trilha por volta de 6h30 da manhã. Por volta de 1h,1h30 de trilha a gente está chegando no ponto ápice, aonde a gente vê mais os bichos, a 700, 800 metros de altitude. Nesse ponto, a gente fica esperando bastante, rodando ali por cima, e a partir do momento em que a gente tem escuta ou observação, vamos atrás. E é quando começa a busca ativa. Quando eu vejo os bichos ou quando eu percebo que eles estão próximos, subo o drone. Todo esse processo dura uma manhã inteira é às vezes pega o início da tarde. Quando está começando a ficar o meio da tarde, perto de escurecer, a gente desce".
"A outra logística, que também tem dado muito sucesso, é a de pernoitar lá em cima, então a gente sobe mais pesado, com comida, equipamento de camping, e vai todo equipado lá pra cima, preparado para frio, chuva e demora um pouco mais para chegar. Lá em cima, a gente arma o acampamento fica esperando os bichos aparecerem, dar algum sinal. Se eles não derem nenhum sinal, a gente vai para alguma outra trilha próxima e vai buscando ativamente, andando até ter algum sinal para poder subir o drone", detalha.
Reginaldo, que já avistou os macacos de perto, conta emocionado como é o encontro com os primatas. "Eles são fantásticos! Eles têm mais ou menos 1,5 metro e interagem muito com a gente. Eles veem e ficam curiosos. No geral, os grupos jovens, são mais curiosos que os adultos. Eles já nem ligam mais... eles sabem que nós não somos uma ameaça, sobretudo nessa região que a gente trabalha. Eles sabem que a gente está ali, sabem que tem alguma coisa diferente, mas eles não ligam, eles fazem as coisas deles, andam para lá e para cá".
"Já os jovens ficam mais curiosos. Eles olham mais, dão uns gritos, andam no galho, voltam, olham de novo, chamam outro, aí outro vem, fica olhando... é demais! A curiosidade deles é muito grande. Quando tem grupos mistos, de jovens e adultos, geralmente é mais confusão, mais bagunça. Tem uns pequenininhos também, que ficam mais espantados. É bem legal a interação que eles têm com a gente e até mesmo com o drone", conta, com os olhos brilhando.
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