Por monica.lima

São Paulo - Entre idas e vindas, a relação do americano Chris Torto com o Brasil já dura quase três décadas. Há 26 anos, o executivo desembarcou no Brasil, animado com as perspectivas de negócios no país. Nesse período, ele criou, em 1996, a operadora de TV por assinatura Vivax, ainda nos primórdios desse mercado. Com a venda da operação para a Net, em 2007, Torto regressou aos Estados Unidos. Em2010, no entanto, ele voltou a enxergar o mercado brasileiro como um polo de oportunidades. Com um aporte de R$ 250 milhões do fundo americano Great Hill Partners, ele criou a Ascenty, empresa de data centers com atuação local e comandada por Torto, a partir dos Estados Unidos. Passados pouco mais de quatro anos, as visitas do executivo ao país prometem ser ainda mais frequentes. A Ascenty planeja construir quatro novos data centers no Brasil a partir de 2015, com um investimento de cerca de R$ 600 milhões. As novas estruturas irão se juntar aos outros quatro centros de dados da empresa, que também tiveram um aporte de R$ 600 milhões.

“O Brasil tem 250 milhões de celulares e, a cada trimestre, mais smartphones são vendidos, mais aplicativos são baixados. O país é a segunda operação global do Facebook e do Twitter. Um mercado desse porte deveria ter 50, 60 data centers de qualidade para suportar essas operações, assim como acontece nos EUA, Europa e Ásia. Hoje, o Brasil tem apenas cinco data centers desse nível. Estamos ocupando esse espaço”, diz o executivo-chefe da empresa.

Além da explosão do consumo dos dispositivos e da oferta crescente dos serviços digitais no país, o executivo aponta outro fator por trás do horizonte positivo que a Ascenty vislumbra no mercado brasileiro. “Há um grande movimento de terceirização de tecnologia em todo mundo. As empresas estão percebendo que investir pesado em infraestrutura de data center não faz nenhum sentido e preferem transferir essa operação a um provedor. No Brasil, estamos apenas no início desse jogo”, diz.

O novo plano será financiado por recursos próprios e por uma segunda emissão de debêntures da Ascenty. A primeira envolveu o valor de R$ 200 milhões. Os projetos ainda estão em fase de desenvolvimento, mas Jundiaí já foi escolhida como uma das cidades que irá sediar um dos novos data centers. As outras três estruturas também serão instaladas no interior de São Paulo.Todas elas serão concebidas para se encaixar no padrão Tier 3, um dos mais altos níveis de certificação global de data centers.

O plano de desbravar o interior paulista segue a estratégia adotada pela Ascenty desde a sua criação. Dois fatores, diz Torto, estão por trás dessa orientação: a disponibilidade e a qualidade da energia elétrica. “Ao mesmo tempo, nós percebemos que boa parte das empresas estava migrando para regiões próximas a São Paulo. Hoje, o interior do estado cresce mais do que qualquer outra região no país”, afirma.

A evolução dos investimentos da Ascenty dão uma boa medida do aquecimento da demanda por serviços de data center no país. Inaugurada em Campinas, em 2012, a primeira unidade da companhia já está com todos os espaços contratados. “Em média, um data center leva de três anos a três anos e meio para atingir sua taxa de ocupação. Levamos menos de dois anos nessa primeira estrutura”, diz Torto. Segundo o executivo, juntamente com grande provedores de tecnologia, setores como transportes, finanças, comércio eletrônico e empresas de software estão impulsionando esse mercado.

Hoje, além dos investimentos anunciados e da unidade de Campinas, a Ascenty está construindo novas estruturas em Hortolândia e Fortaleza, com previsão de inauguração no início de 2015. Os dois projetos seguem a demanda de dois grandes clientes de tecnologia, cujos nomes não foram revelados. “Temos um grande cliente que contratou metade da área de 7 mil metros quadrados em Fortaleza. E já estamos negociando o restante da infraestrutura com outras empresas da região. No Nordeste, todas as companhias têm data center em casa. Talvez seja a região na qual a oferta de qualidade é a mais precária em todo o país”, explica.

A Ascenty também acaba de inaugurar um data center em Jundiaí. Com um aporte de R$ 200 milhões e instalada em uma área de 11 mil metros quadrados, a nova unidade traduz grande parte da estratégia da companhia para driblar alguns desafios do mercado brasileiro. Entre outros recursos, o centro de dados conta com uma subestação de energia, com uma disponibilidade de 25 MVA de potência. Com a estação, a empresa abre a possibilidade de comprar energia com preços um pouco abaixo do mercado, já que o processo de transformação ficará sob sua responsabilidade. “Só com esse investimento, conseguimos reduzir 10% dos custos de energia. E trabalhamos também com a possibilidade de compra no mercado livre de energia”, explica Felipe Caballero, diretor de infraestrutura de data center da Ascenty. Hoje, a energia representa cerca de 20% dos custos de uma unidade desse porte.

O novo centro conta também com um sistema que prevê a instalação de até dez refrigeradores de água. Com quatro equipamentos já em operação, o sistema permite, entre outros fatores, o restabelecimento, em segundos, da refrigeração nas estruturas da unidade.

Segundo Torto, o mesmo padrão de eficiência energética adotado em Jundiaí será replicado nas próximas unidades previstas no escopo da Ascenty. Para o executivo, essa questão, aliada ao alto custo de importação de equipamentos como servidores e outras máquinas,é um dos entraves para a evolução desse mercado no Brasil. “Com o alto índice de uso de tecnologia, o país vai atrair inevitavelmente os investimentos das grandes empresas do setor. Mas se o preço da energia e os impostos de importação de equipamentos fossem mais baixos, o Brasil teria um verdadeiro boom de data centers de qualidade em curto prazo”, diz.

Em meio aos desafios de infraestrutura do país, outra estratégia implantada pela Ascenty foi a construção de uma rede própria de fibra ótica. Hoje, essa rede já alcança 2,4 mil quilômetros em São Paulo. Para Fortaleza, está prevista a construção de 120 quilômetros, que irão conectar o data center aos cabos submarinos instalados na cidade e que são porta de entrada para conexões internacionais.

“Diferentemente de outros mercados, nos quais você tem dezenas de fornecedores com rede barata e de qualidade, no Brasil estes custos são estratosféricos. Por isso, decidimos que, se iríamos montar data centers sofisticados, teríamos que controlar esse processo de ponta a ponta”. Hoje, além de conectar seus clientes aos data centers, a Ascenty aluga parte de sua rede para mais de 20 clientes no país.
Outro ponto abordado é a discussão recente do Marco Civil, envolvendo a obrigatoriedade de instalação de data centers no país. “Em vez de criar uma lei para incentivar a instalação e reduzir os custos de importação de equipamentos, o governo prefere definir uma obrigação. Essa exigência não faz o menor sentido”, diz. “Mas mesmo com todas essas dificuldades, gosto do Brasil e vou continuar a investir no país”, afirma.

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