Por monica.lima

Em 2013, durante um trote produzido por estudantes da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), uma caloura foi pintada de preto e teve as mãos acorrentadas. Em seu pescoço, uma placa trazia os dizeres “Caloura Chica da Silva”. A imagem, que rodou as redes sociais e gerou polêmica, foi o ponto de partida que a coreógrafa Carmen Lúcia encontrou para produzir o espetáculo “Chica”, com a Companhia Étnica. Poeticamente inspirado no mito Chica da Silva, a apresentação foi construída por um cruzamento entre a dança e as artes visuais, com o intuito de abordar as diferentes esteriotipações e imaginários sobre o corpo negro feminino. “Persigo o mito da Chica há muito tempo, mas nunca achava que estava preparada para investir em uma coreografia sobre sua história. Então, fui adiando. Quando me deparei com esse episódio escabroso na internet, pensei que poderia dar uma resposta à ele através da arte. Precisava criar um diálogo sobre esse corpo, essa história e os rastros racistas que ainda permanecem em nosso cotidiano”, explica Carmen Lúcia. Contemplado com o Prêmio Afro 2014, patrocinado pela Petrobras, “Chica” estreia na próxima quinta-feira, dia 21, no Teatro Cacilda Becker, no Rio, com direção de produção de Sara Calaza.

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O espetáculo estreia no mês em que se comemora a Abolição da Escravatura e apresenta diferentes imagens de Chica da Silva produzidas ao longo do tempo. Para compor o enredo, a coreógrafa se inspirou também no gestos cotidianos das mulheres.“A peça se vale da história de Chica para contar nossa própria história. Reproduzimos o gestuário feminino em casa, no trem, no trabalho. Toda a mulher brasileira é um pouco Chica da Silva”, afirma Carmen Luz, que também é documentarista e produziu uma série de vídeos que serão projetados em determinados momentos da apresentação.

O espetáculo, que inicia a celebração de 21 anos da Cia Étnica, foi alimentado por extensa pesquisa com amparo da professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Liv Sovik. Em paralelo às apresentações, a pesquisadora ministra no dia 29, às 16h, no Teatro Cacilda Becker, a palestra “Gênero e política em Chica da Silva”, que trata como Chica da Silva surge e ressurge na cultura brasileira, se propaga e se desdobra em diversas versões, falas, imagens, figurações. “Chica permaneceu na história do Brasil ao longo dos séculos pelo seu caráter de exceção. Ela foi uma das únicas mulheres negras que ascendeu socialmente porque se casou com um homem branco, porém sempre foi retratada com preconceito. Sua imagem é de uma mulher arrogante, imponente, com a sexualidade animalizada. O filme e a novela corroboraram com essa versão de sua história”, acrescenta Carmen.

A peça “Chica” faz parte de um projeto mais amplo, dividido em três partes: a primeira é o espetáculo em questão, a segunda é a realização de um documentário, e a terceira parte é um vídeo instalação na casa de Chica da Silva, em Diamantina, que agrega o espetáculo e o documentário. “No documentário conto a história da coreografia que Mercedes Batista criou para a Salgueiro, em 1963, para o premiado enredo ‘Chica da Silva’. Nele, ela revolucionou ao misturar ballet clássico ao samba. Resolvi também contar essa história com a visão dos bailarinos, que ainda estão vivos hoje”, conclui.  Mariana Pitasse (mariana.pistasse@brasileconomico.com.br)

ONDE CONFERIR

“Chica” fica em cartaz do próximo dia 21 até 31 de maio no Teatro Cacilda Becker. Rua do Catete, 338, no Largo do Machado, Rio de Janeiro.

‘Vejo poucas produções com reflexões audazes sobre a humanidade’

5 MINUTOS
Miguel Machalski, roteirista e consultor

Argentino radicado na França, Miguel Machalski é um dos principais especialistas em cinema mundial hoje. Com trabalhos em diversos países, foi consultor de roteiros de filmes como “Billy Elliot”, de Stephen Daldry, e do brasileiro “O Lobo Atrás da Porta”, de Fernando Coimbra. Atualmente, está envolvido com projetos no Brasil, Letônia, Lituânia, Chile, Espanha, França, Bélgica e Canadá. Na próxima terça-feira, às 19h, ele ministra uma masterclass com o tema “O roteiro no documentário”, no Centro da Cultura Judaica, em São Paulo. A palestra faz parte da programação da segunda edição do “Histórias que Ficam”, programa da Fundação CSN para difusão do documentário brasileiro.

1. Como trabalha um consultor de roteiros?

O principal é entender qual é o filme que o autor que fazer e a essência da história. Considero que meu trabalho é acompanhar, inspirar, questionar, desafiar, mas nunca julgar. Todos nós consultores temos como método o socrático “biocêntrico”, que consiste na ideia de que o consultor não indica o caminho a seguir, mas ajuda que o assessorado veja mais claramente seu próprio caminho.

2. O que tem em comum trabalhos que estão sendo produzidos em países tão diferentes?

A maioria são filmes de produção independente que se enquadram na categoria de “cinema de autor”, em que se põe em destaque a voz e o universo individual do criador. É interessante observar que a tendência geral é de pensar em histórias que, ao mesmo tempo, refletem uma poética pessoal e têm um “gancho” para o público. O desafio é não vender a alma ao diabo: usar elementos dramáticos e narrativos que atraiam os espectadores sem perder a singularidade do autor.

3. Quais assuntos aparecem com maior frequência nos roteiros em diferentes países?

Certas problemáticas aparecem com maior frequência em determinados países. A desigualdade social é mais falada nos países latino-americanos do que nos escandinavos, já a imigração é mais retratada na Europa do que na África. Essas temáticas são mais contemporâneas do que as relações amorosas e familiares, que são inerentes ao ser humano desde sempre. Sem dúvida a globalização e os meios de comunicação têm contribuído muito para a propagação de problemas similares e, talvez, a um estímulo coletivo inconsciente em todas as partes do mundo. 

4. Qual a principal tendência do cinema contemporâneo mundial?

Na narrativa cinematográfica, a ficção pura está em crise, em parte porque a busca pela veracidade factual dispara contra a narrativa ficcional, assim como está acontecendo na literatura universal há muito tempo. Sinto que se está perdendo a noção de importância de contar histórias significativas para uma exploração e compreensão maiores da complexidade humana. Porém, vejo muitas propostas estéticas e formais interessantes, mas poucas com uma reflexão audaz e estimulante sobre a humanidade.

CCBB festeja com filmes os 20 anos do Dogma 95

No centenário da invenção do cinema, em 1995, os dinamarqueses Lars von Trier e Thomas Vinterberg apresentaram ao mundo o movimento Dogma 95. Algumas das regras estabelecidas pelo manifesto na produção de longas incluía a obrigatoriedade de filmar apenas em locações, com câmera na mão, sem iluminação especial ou uso de filtros, e a trama deveria se desenvolver em tempo real e sem deslocamentos geográficos. Vinte anos depois, o Centro Cultural Banco do Brasil do Rio exibe alguns dos filmes do Dogma. A mostra, que começou na quinta-feira, termina na próxima segunda-feira. Hoje, o CCBB exibe “Dogma do Amor”, “Hotel” e “Lovers”. Amanhã, às 19h, “Ondas do Destino”, um dos mais conhecidos de Von Trier. O cineasta volta no domingo, às 20h, com “Os Idiotas”. Ainda no domingo, às 17h30, “Festa de Família”, de Vinterberg. A programação inclui outras produções, que chegam aos tempos atuais.

Festival destaca obras de pequenos cineastas

Até 30 de junho estão abertas as inscrições para o “Festival Internacional Pequeno Cineasta”, que acontece de 2 a 6 de setembro, no CCBB, no Rio. É preciso ter entre 8 e 17 anos, uma câmera na mão e uma ideia na cabeça. Informações: www.pequenocineasta.com.br

Dona Ivone Lara é tema da Ocupação Itaú

De 16 de maio a 21 de junho, Dona Ivone Lara é a inspiração da Ocupação Itaú Cultural, em São Paulo. Além da programação musical, a ocupação conta a história da cantora em fotos e objetos pessoais e ressalta a fama da sambista também na cozinha.

Lee Mills à frente da OSB na Cidade das Artes

A OSB apresenta o programa “No gingado da orquestra” para o Concerto da Juventude. Lee Mills comanda os músicos nas peças “Danças de Galanta”, de Zoltán Kodály, e “O Quebra-Nozes, Op. 71”, entre outras. Domingo, às 11h, na Cidade das Artes no Rio.

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