O Brasil ultrapassou hoje a triste marca de meio milhão de mortes por covidDaniel Castelo Branco

Por Gabriel Leonan* e Gustavo Vicente*
Cerca de 15 meses após início da pandemia do novo coronavírus, o Brasil atingiu, neste sábado, a triste marca de 500 mil mortes por covid-19. Chegando a 500.022 óbitos e 17.822.659 casos confirmados. De acordo com especialistas, os números escancaram a má gestão da crise no país.
A média é de mais 1.080 mortos por covid-19 por dia ao longo de mais de 440 dias desde a primeira vítima fatal confirmada no país. No pior momento da pandemia, enquanto diversos países já avançavam com a vacinação, em abril, o Brasil chegou a ultrapassar mais de 4 mil mortes por dia. 
Publicidade
Em todo o mundo, o Brasil segue como o segundo país com mais mortes por coronavírus confirmadas, atrás apenas dos Estados Unidos, com mais de 600 mil vítimas perdidas.
Durante a pandemia, o Brasil passou por diversos momentos críticos, por exemplo, a falta de oxigênio no estado do Amazonas, além da escassez de medicamentos para o chamado "kit intubação".
Publicidade
Ainda nesse cenário trágico, o governo federal segue desestimulando a adoção de medidas restritivas mais rígidas para conter a propagação do vírus. O país também lida com novas variantes da covid-19, que apresentam maior poder de contágio. 
Ao longo desse mais de um ano de pandemia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) deu diversas declarações que iam em desencontro às recomendações das principais instituições de saúde do mundo, mostrando-se contrário às medidas sanitárias e de isolamento. As afirmações negacionistas sobre a covid colocaram em dúvida a gravidade da doença, confundindo e desinformando a população.
Publicidade
Vacinas em segundo plano
Bolsonaro, diversas vezes, colocou em dúvida a eficácia das vacinas. Além disso, contrariando as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), o governo apostou em medicamentos que a ciência já havia provado que eram ineficazes contra o coronavírus, como a hidroxicloroquina.
Publicidade
Vale lembrar que diversos países decidiram fechar contratos, em caráter emergencial, para a compra de imunizantes. A título de comparação, no mês de julho, os EUA já haviam tratado acordo com três farmacêuticas, já tendo a disposição um número de doses que cobriria 93% de sua população.
No mês seguinte, Canadá, Vietnã, Brasil e países da União Europeia conseguiram garantir as  suas primeiras reservas. No caso brasileiro, o anúncio envolvia 90 milhões de doses da AstraZeneca e a transferência de tecnologia para a produção da vacina no Instituto BioManguinhos, vinculado à Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz). Nesse mesmo mês de agosto, os Estados Unidos já contavam com uma quantidade de imunizantes suficiente para proteger 139% dos americanos, ou seja, o país já tinha sobras para vacinas.
Publicidade
Em 20 de outubro do ano passado, o Ministério da Saúde anunciou que tinha negociações avançadas para garantir 46 milhões de doses da Coronavac, que seriam fabricadas no Instituto Butantan, porém, no dia seguinte, Bolsonaro anunciou o desacordo através de um post em suas redes sociais.

"A vacina chinesa de João Doria, qualquer vacina antes de ser disponibilizada à população, deve ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa. O povo brasileiro não será cobaia de ninguém. Minha decisão é a de não adquirir a referida vacina", escreveu o presidente.

Após a negativa inicial de Bolsonaro, o contrato só foi assinado no dia 30 de dezembro de 2021.
No caso da Pfizer, o Brasil optou por esperar encontrar doses em um preço mais baixo, com isso, quando decidiu fazer negócio, ficou com poucas opções de compra e hoje o país encara uma vacinação em ritmo lento.
Publicidade
Um dos argumentos do governo para justificar a demora na negociação com a Pfizer seria a presença de algumas cláusulas no contrato da farmacêutica, classificadas como "draconianas", que poderiam isentar o laboratório de culpa caso acontecessem efeitos colaterais após a imunização.

"Lá no contrato da Pfizer, está bem claro: nós (a Pfizer) não nos responsabilizamos por qualquer efeito colateral. Se você virar um jacaré, é problema seu. Se você virar Super-Homem, se nascer barba em alguma mulher aí, ou algum homem começar a falar fino, eles (Pfizer) não têm nada a ver com isso. E, o que é pior, mexer no sistema imunológico das pessoas", disse o Jair Bolsonaro em uma frase que ficou marcada.
Segundo especialistas ouvidos pelo O DIA, a postura negacionista do governo foi prejudicial a população. A pesquisadora do Centro de Estudos em Gestão de Serviços de Saúde do COPPEAD/UFRJ, Chrystina Barros, afirmou, que o mundo todo sentia uma certa dúvida sobre o desenvolvimento das vacinas, além dos prazos de aprovação e capacidade de produção dos imunizantes, e que caberia assim a tomada de risco de maneira adequada, já que o Brasil tem uma equipe técnica que participou ativamente do processo de desenvolvimento de vacinas.
Publicidade
"Na ocasião, assim como hoje, havia uma demanda urgente da preservação da vida e nesse caso, o controle da pandemia, que representava para além da preservação da vida, a própria condição de recuperação de atividades econômicas. Isso não foi feito muito por conta da posição de visão de mundo negacionista de todo nosso Poder Executivo, que assim influenciou e não deixou que Ministério da Saúde trabalhasse baseado na ciência - que é exatamente a oposição ao negacionismo", destacou a pesquisadora.
Chrystina destacou, ainda, que quando se fala em saúde deve-se pensar sempre na cultura da segurança, que vem muita das vezes após lições apreendidas e que, infelizmente, a mistura entre ciência e negacionismo fez desperdiçar grandes aprendizados.

"A oportunidade de vermos outros países do mundo e vendo situações pelas quais a gente vai passar, foi assim início da pandemia quando a Europa viveu a chegada desse vírus antes de nós, está sendo assim com a vacinação quando outros países avançam na vacinação Antes de nós mas o negacionismo misturado com a política, tem feiro a gente perder essa oportunidade e fixarmos aprendizados e esses aprendizados perdidos nos custam vidas", disse.
Publicidade
O infectologista Alberto Chebabo falou sobre a gestão da gestão da crise pelo governo Bolsonaro e afirmou que, se as medidas de isolamento social tivessem sido implementadas, o país não teria chegado a números tão alarmantes. 
"Se tivéssemos feito lockdown em alguns momentos que foram necessários, certamente não teríamos chegado a esse número nesse momento. A gestão foi caótica, muito ruim. Não tivemos a implementação de medidas adequadas de controle da epidemia, não houve uma centralização das ações. Não tivemos uma organização do ministério da saúde, para que os estados e municípios tivessem orientações sobre as medidas adequadas, Fora a questão do atraso das vacinas".
Publicidade
Negacionismo e omissão
Foi montada pela Casa Civil da Presidência da República uma lista com acusações e críticas ao próprio governo federal no combate à pandemia de covid-19. Na lista são citados diversos casos casos de negacionismo e negligência quanto ao gerenciamento da crise causada pelo novo coronavírus.
Publicidade
- O governo minimizou a gravidade da pandemia (negacionismo);
- O governo Federal recusou 70 milhões de doses da vacina da Pfizer;
Publicidade
- O governo não incentivou a adoção de medidas restritivas;
- O governo promoveu tratamento precoce sem evidências científicas comprovadas;
Publicidade
- O governo não cumpriu as auditorias do TCU durante a pandemia;
- Brasil se tornou o epicentro da pandemia e 'covidário' de novas cepas pela inação do governo;
Publicidade
- O governo não foi transparente e nem elaborou um Plano de Comunicação de enfrentamento à Covid;
- O governo deixou faltar insumos diversos (kit intubação);
Publicidade
- O presidente Bolsonaro pressionou Mandetta e Teich (Luiz Henrique Mandetta e Nelson Taich, ex-ministros da Saúde demitidos por Bolsonaro) para obrigá-los a defender o uso da hidroxicloroquina e demais medicamentos com ineficácia comprovada;
- O governo Federal fabricou e disseminou "fake news" sobre a pandemia por intermédio do seu gabinete do ódio.
Publicidade
- O governo entregou a gestão do Ministério da Saúde, durante a crise, a gestores não especializados (militarização do MS);
- O governo politizou a pandemia;
Publicidade
- O governo foi negligente com processo de aquisição e desacreditou a eficácia das vacinas (que atualmente se encontram no Programa Nacional de Imunização - PNI).
Surgimento da CPI da Covid
Publicidade
No dia 27 de abril, foi instaurada, oficialmente, no Senado Federal uma Comissão Parlamentar de Inquérito, chamada de CPI da Covid, que investiga supostas as ações, omissões e possíveis irregularidades nas ações do governo federal durante a pandemia de covid-19 no Brasil.
A CPI foi idealizada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), por conta da grave crise sanitária no estado do Amazonas, destacando em seu texto supostos equívocos e omissões do Governo Federal nos protocolos sanitários de sua responsabilidade. A CPI da Covid tem como presidente, o senador Omar Aziz (PSD-AM), Randolfe como vice-presidente e na relatoria foi escolhido Renan Calheiros (MDB-AL). 
Publicidade
Os principais focos da comissão são as alegações de que o governo federal foi contrário às medidas restritivas e o uso obrigatório de máscaras, além do atraso na compra de vacinas e o uso de dinheiro público na compra de medicamentos sem comprovação científica de eficácia. As demissões de ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, também são alvo de esclarecimentos, bem como a causa da falta de oxigênio nos hospitais de Manaus, entre outros.
Nesse cenário de lentidão na vacinação e de críticas pela omissão do governo federal, milhares de brasileiros foram às ruas no dia 29 de maio em protesto contra o presidente Bolsonaro. Neste sábado, 19, o ato se repete e mais de 50 cidades registram manifestações em favor da saída do presidente, cobrança na compra de vacinas e contra o discurso negacionista.  
Publicidade
Polêmica da Copa América no Brasil
Em meio à polêmica da demora do governo federal em responder e-mails da fabricante de vacinas Pfizer para a negociação de compra de imunizantes, a Confederação Sulamericana de Futebol (Conmebol) anuncia o Brasil como sede da Copa América. Por meio do Twitter, a entidade agradeceu ao presidente Bolsonaro e à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) "por abrir as portas do país ao que hoje em dia é o evento esportivo mais seguro do mundo".
Publicidade
O agravamento da pandemia da covid-19 levou a Argentina a desistir de sediar a competição, seguindo a Colômbia, que havia aberto mão do torneio diante de um momento de instabilidade política no país.
A decisão do Brasil em aceitar receber a competição foi criticada por políticos da oposição e pela sociedade no geral. Da sua parte, o governo federal, assim como os estados e cidades que aceitaram a Copa América, declaram confiar nos protocolos sanitários da Conmebol, bem como ressaltam que o país já permite partidas de diversas competições, nacionais e internacionais. Além de Brasília, Cuiabá, Goiânia e Rio de Janeiro receberão os jogos.
Publicidade
Na última quinta-feira, 17, foi confirmado que 13 jogadores venezuelanos foram infectados pela variante gama do coronavírus, originada em Manaus, na véspera do jogo contra a Colômbia. Segunda a pesquisadora Chrystina Barros, esse fato mostra como a realização de eventos de caráter internacional e feito às pressas não é seguro.
"Já temos esportes como o futebol sendo realizados? sim. Mas a gente está falando de receber pessoas de outros países, circulação de pessoas que podem trazer outras cepas, outras variantes. Com isso, o que vemos, além de tudo, é o esporte que deixa de inspirar saúde desviando esforço público, atenção pública e todos os serviços para dar suporte a um evento deste tipo quando na verdade temos uma grande urgência de saúde pública acontecendo em nosso país", concluiu Chrystina.
Publicidade
 
Cronologia da Covid-19 no Brasil
Publicidade
10 de abril 2020
Número de mortes decorrentes do novo coronavírus passa de mil. As Secretarias estaduais de Saúde registram 1.074 mortes e 19.943 casos confirmados da covid-19.
16 de abril 2020
A primeira morte pelo novo coronavírus no Brasil completa um mês. O Presidente da República, Jair Bolsonaro, decide exonerar o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Quem assume o ministério é o médico oncologista Nelson Teich.
Publicidade
9 de maio 2020
Brasil supera a marca de 10 mil mortos decorrentes do novo coronavírus.
15 de maio 2020
Ministro da Saúde, Nelson Teich, pede demissão do cargo pouco menos de um mês à frente da pasta. O médico alertou sobre riscos da cloroquina e defendeu medidas de distanciamento social, medidas defendidas por cientistas, mas contrários ao que Bolsonaro defende.
Publicidade
19 de maio 2020
Mais um dia de recorde no Brasil: país ultrapassa a marca de 1.000 mortos pelo coronavírus em 24 horas. Dados do Ministério da Saúde indicam o registro de 1.179 novas mortes em um dia. Ao todo, são 17.971 óbitos desde o início da pandemia.
8 de agosto 2020
País ultrapassa os 100 mil mortos. Além disso, país registra mais de 3 milhões de pessoas infectadas pelo novo coronavírus.
Publicidade
16 de setembro de 2020
O general do Exército Eduardo Pazuello toma posse como o terceiro ministro da saúde durante a pandemia.
7 de Janeiro de 2021
Após as festas de final de ano, o Brasil atingiu o número de 200 mil mortes pela Covid-19 e um outro número recorde foi batido neste mesmo dia: 1.841 mortes nas últimas 24 horas.
Publicidade
17 de janeiro de 2021
A enfermeira Mônica Calazans foi a primeira pessoa a ser vacinada contra a Covid-19 no Brasil. Ela recebeu o imunizante Coronavac, desenvolvido pelo Instituto Butantan.
10 de março de 2021
Após pronunciamento de Lula, Bolsonaro muda o tom do discurso, surge de máscara e passa a defender o uso das vacinas como forma de combater à covid-19.
Publicidade
16 de março 2021
O Brasil teve 2.798 mortes registradas em 24 horas, outro recorde. O total de mortes desde o começo da pandemia foi para mais de 282 mil, com média móvel de 1.976 mortes em uma semana.
23 de março de 2021
O médico Marcelo Queiroga toma posse como Ministro da Saúde. Ele é o quarto homem a ocupar o posto e assumiu o lugar de Pazuello, no momento em que até então era considerado o pior da pandemia no país.
Publicidade
24 de março de 2021
O Brasil alcança a marca de mais de 300 mil mortes desde o começo da pandemia de covid-19 no país. Os casos confirmados somam 12.183.338. O Brasil é o país com o maior número diário de mortes pela doença desde 5 de março e sozinho responde por 11% das mortes por Covid-19 de todos os países, de acordo com dados da Universidade Johns Hopkins.
6 de abril de 2021
Brasil registra pela primeira vez mais de 4 mil mortes por covid-19 em 24 horas. Dois dias depois, no dia 8, o país volta a bater a mesma marca, com 4.249 óbitos.
Publicidade
25 de abril de 2021
Nos quatro primeiros meses de 2021, o Brasil registrou mais mortes do que em todo ano de 2020.
27 de abril de 2021
O Senado instala a CPI da covid-19, Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar ações e omissões do governo federal e eventuais desvios de verbas federais enviadas aos estados para o enfrentamento da pandemia. 
Publicidade
29 de abril de 2021
O Brasil atinge a marca dos 400 mil mortos pela covid-19. Com 3.001 novos óbitos registrados neste dia, o total de pessoas que perderam a vida para o novo coronavírus chegou a 401.186.
06 de maio de 2021
A Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro identificou uma nova variante do coronavírus em circulação no estado. A cepa é batizada de P.1.2, por ser uma alteração ocorrida na linhagem P.1, que surgiu em Manaus. Também neste dia, o Brasil ultrapassou a marca de 15 milhões de casos de covid-19 contabilizados.
Publicidade
10 de maio de 2021
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu nota técnica recomendando a suspensão da vacina Oxford/AstraZeneca para grávidas. A bula da vacina, como lembra a agência, não inclui esse grupo entre os indicados para a imunização.
29 de maio de 2021
Em meio à polêmica da demora do Governo Federal em responder e-mails da farmacêutica, Pfizer, para a negociação de compra de imunizantes, a Confederação Sul-americana de Futebol (Conmebol) anuncia o Brasil como sede da Copa América. O País foi escolhido para substituir a Argentina, que desistiu de sediar por causa da pandemia, e a Colômbia, por conta de protestos em todo o país. Por meio do Twitter, a entidade agradeceu ao presidente Jair Bolsonaro por "abrir as portas do país ao evento".
Publicidade
*Estagiários sob supervisão de Marina Cardoso