CPI realiza oitiva de um dos sócios da farmacêutica Belcher, Emanuel Catori. A empresa atuou como intermediária do laboratório chinês CanSino na negociação com o Ministério da Saúde pelo fornecimento de 60 mi de doses da vacina Convidencia ao custo de R$ 5 biEdilson Rodrigues/Agência Senad

Brasília - O sócio da farmacêutica Belcher, Emanuel Catori, presta depoimento à CPI da Covid nesta terça-feira, 24. A farmacêutica foi intermediária no Brasil do laboratório chinês CanSino para a negociação de compras da vacina Convidecia pelo Ministério da Saúde. Durante inquirição da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), o depoente voltou a afirmar que o deputado Ricardo Barros (PP-PR) não teve nenhuma participação nas tratativas acerca da vacina Convidecia.

“A carta de intenção foi emitida em apenas oito dias. Por quê? A Pfizer levou vários meses, quase um ano. É muita rapidez. Um tratamento muito diferenciado em relação à empresa. Há uma tentativa de venda de uma vacina 77% mais cara do que uma outra, também com dose única, é o caso da Janssen. Ao mesmo tempo, você tem uma empresa que vem de um processo de investigação com um prejuízo da ordem de R$ 18 milhões, é o caso do ‘falso negativo’, aqui no DF. (...) Para essa empresa, houve uma agilidade para tudo, com todas essas dificuldades. (...) Qual o nível de importância que o Ricardo Barros teve nessas tratativas?”, perguntou a senadora.

Em resposta, Catori afirmou que Barros não teve nenhuma participação nas tratativas. Minutos depois, ele pontuou que teria conversas periódicas de âmbito pessoal com Barros, devido à proximidade local dos dois - ambos residem em Maringá, no Paraná. O depoente reiterou que, mesmo com a quebra de sigilo telemático solicitada pela CPI, os senadores não encontrarão nenhuma conversa dele com o parlamentar com tratativas sobre a vacina.
Catori apresentou à CPI um cronograma com datas que envolvem a representação da CanSino pela Belcher. De acordo com o empresário, a farmacêutica chinesa estabeleceu uma carta de autorização para a brasileira no dia 19 de abril. Em 27 de maio, a Belcher solicitou uma carta de intenção de compra junto ao Ministério da Saúde. O documento foi expedido pela pasta apenas uma semana depois, no dia 4 de junho.

Catori acrescentou ainda que foi recebido pelo secretário-executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, durante as tratativas envolvendo a vacina.

Logo depois, durante sua inquirição, o senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou que seria falsa a alegação de Catori sobre nunca ter tratado da venda de vacinas com Barros.

“Eu não consigo acreditar que nos dias 13, 14 e 15 [de abril] esses empresários todos se reuniram com o secretário-executivo [do Ministério da Saúde], com a Embaixada da China, com o Ministério da Saúde, por um 'espírito humanitário' de doar vacinas para o SUS. Ao contrário, o tempo inteiro essas empresas atuaram no Congresso Nacional para facilitar a comercialização de vacinas. Houve aqui, sim, tráfico de influência, advocacia administrativa e outros crimes mais. (...) Quem ofereceu a vacina, eles não quiseram, mas foram atrás de outros que eram mais caras ou que tinham intermediação, algum interesse”, enfatizou o senador.
Publicidade
Reunião 
Depois, o depoente admitiu que participou de uma reunião agendada por Barros. Ele reconheceu ainda que no dia do encontro, em 15 de abril, a Belcher já havia assinado um termo de confidencialidade com a farmacêutica chinesa CanSino para a venda da vacina Convidecia no Brasil. Apesar disso, Catori negou que tenha negociado a venda do imunizante com o ministro Marcelo Queiroga.
Publicidade
Questionado pelo relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), o empresário disse que tentou vender ao governo federal o antiviral Favipiravir. Ele afirmou que não poderia ter negociado a venda da Convidecia porque ainda não contava com a carta de autorização da CanSino. O documento só teria sido emitido quatro dias depois do encontro intermediado por Ricardo Barros no Ministério da Saúde.
"Eu tive apenas dois ou três minutos. Falei apenas do medicamento antiviral Favipiravir", disse.

Renan contestou a declaração do empresário. Para o relator da CPI, há “uma contradição muito grande” no depoimento de Emanuel Catori e “um envolvimento muito sério” do líder do governo na Câmara na negociação de vacinas.

"É a repetição do modus operandi na aquisição de vacinas pelo governo federal. Recusou contatos com a Pfizer e com o Butantan, enquanto priorizou atravessadores com Belcher, Davati e Ricardo Barros. Enquanto brasileiros morriam e continuam a morrer. O senhor tenta passar a ideia de que, no encontro com Ricardo Barros, não poderia ter tratado da questão, uma vez que a CanSino não havia credenciado a Belcher. Mas não é verdade. Já havia uma carta de confidencialidade", afirmou.

O representante da Belcher admitiu conhecer o advogado Flávio Pansieri. Sócio do genro de Barros até março deste ano, Pansieri participou de uma reunião na Agência Nacional de vigilância Sanitária (Anvisa) sobre o uso emergencial do imunizante Convidecia. Apesar disso, Catori negou que o deputado paranaense tenha atuado como “facilitador político” para a compra da CanSino.
Publicidade
"O deputado Ricardo Barros não fez gestões com órgãos neste sentido. Não há vínculo comercial ou societário direto ou indireto da Belcher ou seus sócios com o parlamentar. Ele não iria receber valores pelo sucesso da negociação da Convidecia. A Belcher não o procurou nas tratativas com vacinas. Participação zero. Em nenhum momento ele me ajudou em nada sobre a vacina", afirmou.

Calheiros perguntou por que a vacina da CanSino era 70% mais cara do que o imunizante da farmacêutica Jansen, que também é aplicado em dose única. Segundo o empresário, isso se deve ao modelo de importação contratado pelo Ministério da Saúde. Enquanto a Jansen foi comprada pelo sistema CIF, em que frete e seguro são pagos pelos fornecedores, a Convidecia seria adquirida pelo sistema FOB, em que essas despesas já estão embutidas no valor final.

"Isso envolve logística, envolve frete. Por precisar manter uma temperatura de dois a oito graus, é um frete extremamente caro. Por isso tem toda essa diferença de valores", afirmou.
Operação Falso Negativo
Publicidade
Emanuel Catori também admitiu a comissão que a Belcher participou de diversas licitações no Distrito Federal e saiu vencedora de uma para venda de máscaras. Ele confirmou que a empresa participou de licitação para compra de testes covid, mas negou que a Belcher tenha combinado valores com outros participantes. O caso é objeto de investigação da Operação Falso Negativo.
Calheiros disse que a Belcher alega que uma empresa teria usado o nome da farmacêutica para participar do processo.
Publicidade
Catori presta depoimento amparado por um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Com a possibilidade de permanecer em silêncio sobre temas que o incriminem, o empresário se recusou a responder, por exemplo, quanto a Belcher receberia de comissão pela venda de 60 milhões de doses do imunizante ao governo brasileiro.
Acompanhe ao vivo
Publicidade
*Com informações da Agência Senado