Secretária Municipal de Políticas para Mulheres e Cuidados, Joyce TrindadeMichelle Gomes

Joyce Trindade, gestora pública formada pela UFRJ, é secretária Municipal de Políticas para Mulheres e Cuidados, vereadora no Rio de Janeiro e coordenadora estadual do PSD. Lidera políticas de equidade de gênero, cuidado e enfrentamento à violência contra a mulher, com impacto direto em mais de 1 milhão de pessoas. Com passagens por espaços como a ONU e a diplomacia francesa, atua na formação de lideranças femininas. Já recebeu a Medalha Chiquinha Gonzaga, da Câmara Municipal, pela atuação em políticas públicas para mulheres.

SIDNEY: Qual é o significado político da comemoração do "Julho das Pretas"?

JOYCE TRINDADE: Essa data homenageia Tereza de Benguela, uma mulher revolucionária que liderou um quilombo fortalecido por outras mulheres e pessoas escravizadas. Ao lembrar de Tereza, reconhecemos a presença histórica das mulheres negras em posições de liderança. O "Julho das Pretas" é um momento de reflexão sobre essa trajetória. Embora sejamos maioria na sociedade, ainda somos minoria nos espaços de decisão. Por isso, é fundamental provocar empresas, instituições e o poder público a debater representatividade e ampliar a presença de mulheres negras em cargos de liderança. Só assim podemos nos aproximar da igualdade prevista na Constituição, mas ainda distante da realidade. Durante este mês, a Secretaria promoveu uma série de ações com as alunas, como rodas de conversa, oficinas e visitas à Pequena África, no Centro do Rio. Esses encontros fortaleceram o sentimento de pertencimento, estimularam o debate sobre identidade, cuidado e autonomia, e permitiram que mais mulheres se reconhecessem como parte fundamental da construção política e social da cidade. Se não conhecemos a nossa história, o nosso passado, não conseguimos acertar o futuro. "Julho das Pretas" é sobre isso: memória, escuta, formação, presença e reconhecimento das pessoas que lutaram e ainda lutam pela emancipação do povo negro.

Quais medidas vêm sendo adotadas pela Secretaria para enfrentar a violência contra as mulheres no município do Rio?

A violência atinge mulheres de diferentes formas: psicológica, patrimonial, física, entre outras. A Secretaria oferece uma rede de acolhimento para mulheres em situação de violência, com atendimento gratuito nos Centros Especializados que garantem apoio psicológico, jurídico e social. Também contamos com os Núcleos de Atendimento à Mulher, que funcionam nas Casas da Mulher Carioca de Madureira e Realengo. Além disso, os Núcleos oferecem acompanhamento psicológico continuado por meio de psicoterapia. Em caso de risco grave, pode ser acionado o acolhimento sigiloso na Casa Viva Mulher Coralina. A prioridade é oferecer proteção, escuta e caminhos para que essas mulheres possam reconstruir suas vidas com segurança.

Mulheres negras enfrentam ainda mais obstáculos no cotidiano. Quais os principais desafios?

As mulheres negras seguem sendo as principais vítimas de violência, e isso está diretamente ligado à desigualdade socioeconômica. No Rio, a maioria da população em situação de pobreza é negra, e entre elas, são as mulheres que mais enfrentam a falta de acesso à renda, educação e segurança. Esse cenário se reflete também nos nossos atendimentos: a maior parte das alunas das Salas da Mulher Cidadã e das Casas da Mulher Carioca são mulheres negras em busca de oportunidades. Por isso, cuidamos não só da parte psicológica, jurídica e social, mas também da empregabilidade com cursos de capacitação para que essas mulheres conquistem autonomia financeira e possam romper o ciclo da violência. Investimos em qualificação profissional, com cursos nas áreas de tecnologia, audiovisual, estética, gastronomia, moda, entre outros. Os retornos que recebemos são muito positivos, porque além de romperem com o ciclo da violência, elas conquistam autonomia financeira. Enfrentar essas desigualdades exige um compromisso coletivo. Sem isso, continuaremos apenas reagindo, sem transformar de fato a realidade.

Do que trata o site "Mulheres.rio"?
O site é uma plataforma criada pela Secretaria da Mulher para ajudar mulheres a reconhecerem situações de violência e saber onde buscar ajuda de forma rápida e segura. Através de perguntas simples, é possível  identificar o tipo de violência e indicar os serviços próximos, como delegacias, unidades de saúde, Casas da Mulher Carioca e até abrigos sigilosos, se for necessário. Também reúne contatos importantes, como Polícia Militar e SAMU, e mostra opções de apoio psicológico, jurídico, financeiro e cursos de capacitação. Tudo direto no celular, com navegação anônima e pensada para proteger quem acessa.

Este mês foi realizada a 5ª Conferência Municipal de Políticas para Mulheres. Qual foi o objetivo do evento?

Depois de 10 anos, a Conferência Municipal voltou com força, participação popular e articulação política. Foram mais de 900 mulheres inscritas nos dois dias de evento, representando diversas regiões da cidade. O objetivo foi escutar essas mulheres, debater propostas e eleger delegadas que vão defender as pautas do Rio na etapa estadual. A conferência é parte de um processo democrático e coletivo que começou com as pré-conferências em bairros como Campo Grande, Jacarepaguá e Madureira, garantindo escuta ativa e inclusão das diferentes realidades. Os debates giraram em torno de temas como saúde, enfrentamento à violência de gênero, autonomia econômica, educação, cuidado e participação política.

Existem projetos específicos da Secretaria para as mulheres das periferias?

A Secretaria atua com uma rede de equipamentos espalhados por diversas regiões da cidade, garantindo que os serviços estejam acessíveis. As Salas da Mulher Cidadã funcionam nos bairros Cosmos, Paciência, Santa Cruz, Sepetiba, Campinho, Gouveia e Penha. Também contamos com as Casas da Mulher Carioca em Madureira, Realengo, Padre Miguel, Campo Grande e Coelho Neto, assim como o Centro Especializado Tia Gaúcha, em Santa Cruz. Nesses espaços, as mulheres encontram acolhimento psicológico, jurídico e social, além de cursos de capacitação para empregabilidade e geração de renda. O nosso compromisso é garantir presença, escuta e oportunidade, principalmente onde a desigualdade é mais sentida.