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Estou cansado de falar que nos falta um poder moderador. A ideia ressurge sempre que há desequilíbrio entre os poderes da República (a cada cinco anos?), mas ninguém leva adiante a busca pela solução, porque, dizem, "não é possível restaurar a monarquia hoje". A premissa me parece falsa: será que é preciso uma monarquia para termos um poder moderador?
O debate sobre um poder que impedisse abusos de outros poderes vem de longe, mas com esse nome, num contexto moderno, começou na França do século XVIII, e chegou ao Brasil logo na independência, materializando o conceito de poder moderador como chave do sistema constitucional do império.
Acontece que a presença oculta de um poder semelhante ao moderador nos ordenamentos das repúblicas tem atraído atenção. A associação do poder moderador ao topo do poder judiciário remonta a discussões sobre a Supreme Court dos EUA e ao pensamento de Rui Barbosa na Primeira República.
A discussão é interessante. George Washington, em carta a John Jay, na qual o cumprimentava por assumir a presidência da Suprema Corte, falou que esta era pedra angular de seu tecido político. Washington pensava assim levando em conta o que escreveu Alexander Hamilton em um de seus artigos federalistas, quando argumentou que o "ramo menos perigoso" era o poder judiciário.
Apesar de não constar na Constituição de 1988, a menção a um substituto do poder moderador é frequente. Qual dos dois, as Forças Armadas ou o Poder Judiciário, especialmente o STF, assume o papel de moderador? Se é assim, temos hoje um poder moderador oculto e concorrente? Ou não há concorrência alguma, exceto em teoria? Ou ainda, será que temos, pura e simplesmente, excessos perigosos por parte de um dos poderes?
Se esse não é um dos assuntos mais sérios de hoje em dia, eu não sei qual é. A compreensão do tema demanda uma análise aprofundada das fontes, buscando as raízes do conceito, suas formulações teóricas e seu histórico prático - de como o Brasil Imperial incorporou esse instituto, por exemplo. Farei isso em livro, oportunamente. Mas precisamos urgentemente tomar pé do assunto e começar a pensar em soluções práticas. A fim de provocar reações e dar início ao debate, vou contar ao leitor uma conversa que tive com um amigo erudito que reside em Brasília.
Disse o amigo: "O Tribunal de Contas da União (TCU) tem o papel de fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos órgãos e entidades públicas do Brasil, assegurando a legalidade, legitimidade e economicidade de suas ações. Tenho uma proposta ousada: uma reforma na estrutura do TCU, a fim de torná-lo o poder moderador."
"Seria preciso implementar mandatos eletivos e temporários para os membros do TCU, para fortalecer sua representatividade e a independência, aumentando ao máximo sua legitimidade democrática. O exercício do poder moderador se daria na forma exclusiva de veto a todo e qualquer ato de um dos três poderes da república, assim como cabia os tribunos romanos. É uma medida prudente que garantiria a imparcialidade do TCU em suas decisões, evitando influências externas e alinhando-o ainda mais aos princípios republicanos. Tal reforma, longe de enfraquecer as atribuições fiscalizadoras do TCU, busca fortalecer seu papel como guardião da legalidade e equilíbrio nos assuntos públicos."
Não sei se meu amigo está certo, mas é importante ser livre para discutir uma maior diversidade de modelos. Podemos, sim, encontrar uma solução especial para o contexto de hoje, contribuindo para a consolidação de uma prática democrática sólida, em que o equilíbrio, a legitimidade e a justiça preservem a saúde do estado brasileiro para que este sirva ao cidadão, em vez de se servir dele.