Colunista Rafael Nogueirareprodução

A pergunta pode soar gratuita ou até meio doida. Mas ao que parece é uma nova tendência nas redes sociais, que leva mulheres a perguntarem a seus homens com que frequência pensam na Roma Antiga. Muitos responderam semanalmente, outros, três vezes por semana, e alguns disseram que até mesmo todo dia. Ou mais — para surpresa e confusão da mulherada. Vejam o meu caso, que foi invertido: minha esposa lembrou da trend ao me surpreender lendo uma biografia de Marco Aurélio.
A enxurrada no Tiktok foi provocada por Artur Hulu, um sueco de 32 anos que, se fazendo de antigo romano, conquistou grande número de seguidores. Conhecido como "Gaius Flavius", ele posta vídeos como se fosse um legionário, e realiza esquetes de comédia como gladiador. Viralizou depois de escrever no Instagram: "Senhoras, muitas de vocês não percebem com que frequência os homens pensam no Império Romano... Vocês ficarão surpresas com as respostas deles!".
A Antiga Roma abrange uma miríade de tópicos intrigantes, desde as guerras até as artes, da oratória à religião, da filosofia à política, da linguagem à comida, do entretenimento à mitologia, do teatro aos esportes.
Mas algumas questões intrigam particularmente. Uma das mais fascinantes é a seguinte: "Os romanos testaram quase todas as formas políticas. Qual foi a mais bem-sucedida?". Era outro contexto, é verdade, mas a experiência acumulada é incrível: Roma transitou de uma monarquia de base religiosa para algumas formas de República, para enfim voltar a ser monárquica durante o Império, com experiências diversas de transmissão hereditária e eletiva de poder.
Outra indagação que destaco diz respeito à "humanitas" e às concepções de virtude dos romanos, assim como ensinadas por Cícero. As virtudes cardeais do cristianismo eram já conhecidas e cultivadas.
Parece maluco que o político, aquele que se dedica a servir a "res-publica”, precursora do que atualmente denominamos Estado, era visto como o auge do desenvolvimento humano. Isso nos provoca — hoje buscamos melhorar o espaço público menosprezando cada vez mais a atividade política.
O que mais me instiga é o modo como os romanos, conhecidos por sua pragmática eficiência, lidavam com os filósofos. Será que viam os intelectuais com despeito, com indiferença ou com admiração? Marco Aurélio, encarnação mais perfeita do rei-filósofo de Platão, é o melhor exemplo dessa relação positiva entre o poder e a filosofia.
Roma foi fonte de inspiração para pensadores do Renascimento, como Maquiavel. Seu impacto reverberou até tempos mais modernos, orientando notáveis como Montesquieu, os fundadores dos Estados Unidos e os líderes do recém-independente Brasil. Ela é mais do que mil páginas de história, é um legado que persiste — à medida que a exploramos, descobrimos mais sobre nossas origens, afinal, nossas pontes, aquedutos, padarias, igrejas e até a língua (esse latim novo) são legado romano.
Enfim, a pergunta que não quer calar: por que os homens pensam em Roma com mais frequência do que as mulheres?
Você pensa, minha leitora, na legião romana, na águia imperial, nos gladiadores, nos imperadores, nos políticos brilhantes e nos oradores invencíveis, em toda aquela violência e também na virtude dos antigos?
Nada disso é assunto só de homem — muitas romanas tiveram agência histórica e poder —, mas é longa e profunda sua associação com a virilidade. Coisa biológica, diriam os brontossauros. Se estavam certos, não sei. O movimento de "Gaius Flavius" parece reforçar a velha tese.