Por tabata.uchoa

Rio - Outcasts, A Bolha, Equipe Mercado, Som Beat, Analfabitles, Módulo 1000, Os Lobos. Esses grupos de rock brasileiro, ativos entre os anos 60 e 70, não têm o mesmo espaço na memória coletiva que bandas como Secos & Molhados e Mutantes ocupam. O pesquisador e escritor Nélio Rodrigues relembra a vida e a obra dessas e outras bandas em seu terceiro livro, 'Histórias Secretas do Rock Brasileiro' (Editora 5W, 353 pgs, R$ 59,90), cujo lançamento acontece nesta quinta (22) na livraria Blooks, na Praia de Botafogo, às 21h.

"Essas bandas não estão na memória social do fã de rock. Ninguém fala desse cenário. É como se essa cena não tivesse existido. Mas eram grupos que faziam muitos shows, em festas, clubes e casas, no Rio e em vários outros estados", relata Nélio, que já havia lançado 'Histórias Perdidas do Rock Brasileiro, vol.1' em 2009, com outros artistas pouco conhecidos dessa época. "Os Mutantes conseguiram sucesso porque, além de serem uma banda talentosíssima, tiveram desde cedo a chancela do Tropicalismo. Mas nem mesmo eles vendiam tantos discos".

Livro 'Histórias Secretas do Rock Brasileiro' fala de grupos pouco conhecidos dos anos 60 e 70Divulgação

De fato, em boa parte de 'Histórias Secretas do Rock Brasileiro' o que se vê são bandas em ação. Mesmo não conseguindo tanto sucesso quanto outros artistas da época, grupos como Analfabitles e A Bolha estavam sempre em busca de oportunidades para tocar, divulgando seus trabalhos ou driblando a censura - o Módulo 1000 chegou quase a ser encarcerado, durante um show em Minas, por militares encucados com as enigmáticas letras do grupo, como a da música 'Turpe Est Sine Crine Caput'.

Bandas como Analfabitles e Brazilian Bitles (ambas inspiradíssimas, obviamente, no quarteto mais ilustre de Liverpool) tocavam em eventos promovidos por jornais, confecções e refrigerantes. E quase sempre com muita demanda.

"Os grupos do livro gravaram LPs e singles, mas os discos vendiam para uma galera pequena. No caso do Módulo 1000, fui a shows deles em que o Daniel Romani (guitarrista) mostrava o álbum para a plateia e anunciava: 'Olha aí, saiu nosso disco' ('Não Fale Com Paredes', lançado em 1971). Não havia uma imprensa musical preparada para isso, não havia resenhas de discos deles como havia de um álbum novo do Edu Lobo ou do Chico Buarque. Esse tipo de som circulava no gueto. Eu mesmo nem soube do primeiro compacto da Bolha, de 1971. Fiquei sabendo anos depois", lembra Nélio. Ainda assim havia todo um circuito de bailes - muitas vezes sem repertório autoral - a desbravar. "Era comum também esses grupos fazerem shows em teatros, sempre nas segundas-feiras, que era quando não tinha peças".

Como rock não era o padrão, quem lidava com o ritmo passava por situações bem complexas. Vocalista do The Bubbles, depois A Bolha, Renato Ladeira foi proibido de girar o microfone - imitando Roger Daltrey, do The Who - durante uma apresentação de TV. "O Brazilian Bitles, que gravava pela mesma gravadora dos Mutantes (Polydor, hoje Universal), queria usar distorção na guitarra numa das músicas e foi impedido pelo técnico de som: 'Ah, isso aí não vende disco'", recorda Nélio. "Eram grupos que davam mesmo murro em ponta de faca. Alguns existem até hoje e ainda dão shows, como o Módulo 1000".

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