Por luis.araujo

Rio - Falar, falar e falar tudo e nunca guardar sentimento nenhum, negativo ou positivo: muitos psicólogos e médicos recomendam isso para a saúde de seus pacientes. A veteraníssima (93 anos) cantora e atriz Bibi Ferreira faz exatamente o contrário. “Eu poupo a voz e evito falar ao máximo. Guardo para mim. No telefone, não falo nunca.

Ele tira completamente a voz, é muito ruim. Só estou agora ao telefone porque estou conversando com você”, diz ao repórter de O DIA. “E nunca nem precisei de psicólogo. Minha cabeça é muito simples e tive uma mãe fantástica que cuidou disso”. A artista comemora impressionantes 75 anos de carreira com o espetáculo ‘4XBibi’ (hoje e amanhã no Vivo Rio) fazendo vários projetos para 2016. E recordando sua história.

Bibi em cena%3A sem nervosismo%2C só “senso de responsabilidade”Divulgação

Em ‘4XBibi’, ela lembra canções de quatro cantores ligados à sua carreira: Edith Piaf, a fadista Amália Rodrigues, o cantor de tango Carlos Gardel e Frank Sinatra. O roteiro une sucessos de todos, como ‘Povo Que Lavas no Rio’ (de Amália), ‘The Lady Is a Tramp’ (de Sinatra) e ‘Je Ne Regrette Rien’ (de Edith) com histórias envolvendo Bibi e cada um dos quatro artistas. Bibi recorda que foi assistida por Amália Rodrigues 14 vezes em Lisboa, quando interpretava justamente a obra de Piaf.

“Estávamos em cartaz as duas num lugar em que tinha um teatro e um cassino. Ela gostava muito do acordeonista que tocava comigo, até pedia músicas, perguntava: ‘A música tal já foi cantada?’. Mas não chegamos a conversar”, lembra.

No palco, Bibi tem 11 músicos e a regência do maestro Flávio Mendes, que está com ela há dez anos e ressalta que o rigor e o profissionalismo da artista vêm acompanhado de muita doçura e bom humor. “A Bibi sabe tudo de tudo! Mas ela é muito gentil e educada, e muito parceira. Não há um clima tenso nos bastidores, do tipo ‘chegou a diva’”, brinca, ressaltando que Bibi entende tudo de música para teatro. “Ela é atriz, cantora e musicista. Vemos partituras, trocamos ideias sobre arranjos”.

Na juventude%2C a filha de Procópio Ferreira%3A “Ele me deu disciplina”Divulgação

Filha do ator Procópio Ferreira e da bailarina espanhola Aída Izquierdo, Bibi começou em 1941, quando criança, apresentada no teatro pelo próprio pai. “Aprendi muito com meus pais, principalmente a ter disciplina e educação. Meu pai foi muito famoso. Começou fazendo papéis pequenos e depois chegou a um público muito grande. Minha mãe é que nunca ligou muito para a fama”.

Levando os agudos dramáticos de Amália e o grave de Sinatra para sua própria tessitura vocal no show (“nem faço nenhum tipo de exercício vocal, isso é pra quem faz canto lírico”, conta), Bibi diz que ainda sente certa tensão antes dos espetáculos. “Não é um nervosismo, é um senso de responsabilidade, na verdade. Na coxia, fico preocupada em não fazer tudo o que sei fazer de melhor”, conta.

Interpretando Joana, no musical ‘Gota D’agua’, durante os anos 70Divulgação

Outro dia, tive um branco no meio de um show. “Eu estava nos bastidores, crente que estava bem, e quando dei de cara com o microfone... Minha costureira, que estava lá comigo, me deu a deixa. Gritou bem alto ‘foi a noite’ (de ‘Foi a Noite’, sucesso de Sylvia Telles) e comecei a cantar”, conta.

Inevitável perguntar sobre receita de longevidade a quem já passou dos 90, mas Bibi desconversa. “Isso é bobagem”, diz. “Basicamente, eu tenho muita saúde mental e física e cuido das duas. Mas nem gosto de falar disso. Não é bom ficar falando das coisas boas que a gente tem!”

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