Blocos de rua prometem arrastar multidões neste fim de semanaArquivo / Agência O Dia

Carnaval é ambiente de festa, celebração e inclusão, entretanto, historicamente caminhou lado a lado também com o preconceito e a intolerância. Nos dias de hoje, cânticos, marchinhas e letras ofensivas não têm mais cabimento na sociedade e alguns comportamentos devem ser evitados. Um grande exemplo disso são as marchinhas de Carnaval, que em muitas delas continham termos preconceituosos e hoje, felizmente, são combatidos e muitas vezes nem sequer citados.
O historiador Luiz Antônio Simas falou um pouco sobre estes termos preconceituosos utilizados historicamente nas marchinhas e ressaltou o fato de hoje tudo isso ser combatido.
“A marchinha de Carnaval a rigor, ela sempre brincou, zombou de muita coisa. E muitas marchinhas retrataram um Brasil profundamente misógino, homofóbico, que desqualifica as populações originárias, os indígenas, um Brasil que é racista. Então eu acho positivo que hoje ocorra um certo sentido crítico em relação a muitas dessas letras de marchinhas mais antigas, porque mostra que de certa forma a sociedade brasileira hoje discute coisas que antes não discutia. Então era comum, era aceito e era considerado engraçado que você mexesse com a nega maluca, que você mexesse com o indígena dizendo que o índio quer apito, que você mexesse com o gay falando da cabeleira do Zezé… É positivo que hoje muitos blocos de carnaval questionem essas marchinhas, porque tem um repertório muito vasto. Você não precisa ficar cantando marchas que falem disso, que brinquem com a cabeleira do Zezé, com a nega maluca, ou a objetificação da mulher que é muito forte. Isso não é ser chato nem contra o espírito do carnaval, mas é entender que uma sociedade vai amadurecendo, vai discutindo certas pautas que antes não discutia”, contou o professor Simas.
Ainda no âmbito do Carnaval, as letras e enredos dos sambas das escolas, muitas vezes têm relações com religiões de matrizes africanas. Porém, mesmo assim, se tratando do maior espetáculo da terra, a intolerância está presente.
“Não é exatamente intolerância religiosa, é mais profundo, é um racismo religioso, porque basicamente está inserido num contexto de desqualificação das manifestações, inclusive religiosas que não são brancas. Durante muito tempo, os candomblés e umbandas foram proibidos e quando foram legalizados tinham que se registrar em delegacia de polícia. Então essa intolerância que é fruto de um racismo entranhado na formação brasileira marca a nossa história. Hoje evidentemente isso está mais aflorado, até porque existe um preconceito explícito que é fruto do racismo e que se manifesta nessas questões. No Carnaval da Sapucaí, quando você pega escolas de samba, de 12 escolas que vão desfilar no grupo especial, 10 vão com temáticas de culturas afro-brasileiras, afro-cariocas, afro-indígenas. Então de certa maneira a Escola de Samba nesse sentido, ela tem um papel pedagógico para contar belas histórias, mostrar que essas culturas são sofisticadas e esse é um caminho pra gente lidar com o racismo religioso e a intolerância”, concluiu Luiz Antônio Simas.
Carnaval fruto da interação
Quando pensamos nas primeiras manifestações da festa popular conhecida como Carnaval, está presente desde o início uma interação entre povos africanos, nativos e colonos dentro do Brasil. Porém, com o passar dos anos, as partes que foram ficando à margem da sociedade eram combatidas de forma racista, preconceituosa e elitista. Para o Prof. Dr. Babalawô Ivanir dos Santos acredita que com o tempo está havendo uma recuperação desta ancestralidade.
“O carnaval brasileiro é frutos das interações das culturas de matrizes africanas. Culturas essas que contribuíram de forma significativa para a construção das nossas identidades. O carnaval brasileiro é um reflexo dessas interações e construções que potencializa e tira a marginalidade. No carnaval, nossas representações sagradas passam a ter destaque e saem da subalternidade social. Assim, contribuem para o fortalecimento das nossas lutas contra a intolerância e em prol da diversidade. A nossa sociedade foi forjada sobre a ideia de que essas práticas não são intolerantes e racistas. Assim, para construir uma sociedade com base na equidade e na diversidade, práticas como essas precisam ser abolidas. Ao levar a riqueza da cultura, da diversidade e da pluralidade das religiões de matrizes africanas para a avenida, o carnaval faz uma narrativa histórica sobre os nossos corpos em solo brasileiro e fortalece as nossas experiências sociais, políticas, culturais e espirituais”, pontuou o Babalawô.
Xô, preconceito!
Para curtir o Carnaval sem fomentar o ódio, o projeto Badauerj, que cobre eventos do Carnaval, também deu seus pontos sobre o assunto. Para eles, a celebração é um espaço para todos e longe de preconceitos.
“Acho que o combate aos preconceitos deve partir dos próprios blocos ou bailes. Se não forem tocadas músicas e marchinhas preconceituosas, não serão cantadas. Não conheço nenhuma festa onde a aceitação à diversidade seja tão espontânea quanto no carnaval. A intolerância e os preconceitos estão entranhados na sociedade brasileira. O Carnaval é um oásis nesse cenário”, explicou Rafael Casé, um dos coordenadores do Badauerj.
Ou seja, se você quer ter um Carnaval longe de preconceitos fique longe de lugares que propaguem a intolerância.