Primeira mulher trans a se apresentar no Palco Mundo, Majur faz história no Rock in Rio 2024ALEX SANTANA / Divulgação

Rio - Majur, de 28 anos, será a primeira mulher trans a se apresentar no Palco Mundo do Rock in Rio. A artista faz show, neste sábado (21), no "Dia Brasil", no bloco "Pra Sempre MPB". Já no domingo (22), ela é um dos nomes convidados para a homenagem aos 50 anos de carreira de Alcione, no Palco Sunset. "Acho que ainda vai cair a ficha para mim", confessa Majur ao DIA.
De Salvador, na Bahia, a artista reflete sobre o feito histórico na carreira. "Ainda estou imaginando como vai ser, é muito doido, e falta pouco agora… Esse dia será um dos dias mais felizes da minha vida. Ser a primeira mulher trans a estar no Palco Mundo, na história do Rock in Rio, é algo absoluto", exalta ela, que deseja: "Eu quero impactar os brasileiros e o mundo com a minha cultura, e me conectar com mais pessoas através da minha arte. E que esse seja um trampolim para voos ainda mais altos". 
Transexual e negra, ela faz questão de relembrar as pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ que abriram caminhos no passado e deixa, ainda, uma mensagem para as que, assim como ela, enfrentam as estatísticas no país que mais mata transexuais e travestis no mundo. "Só tenho a agradecer às minhas antepassadas, e digo para as meninas de agora: O futuro é seu quando você quiser fazer!".
A cantora também conta como a idade que tem hoje impacta sua forma de estar no mundo: "Sou grata a todas as fases, a cada segundo da minha jornada e às infinitas possibilidades de ser. Me descobri aos 4, me transformei aos 23, me casei aos 27, me separei no mesmo ano e descobri que 28 anos ainda é o início de tudo. Não me arrependo de nada. Para mim, é tudo ou nada e tudo foi fomento! Tudo parte daquele mesmo crescimento para me tornar a grande mulher que sou hoje, Majur dos Santos Conceição".
Inspiradora para muitas, Majur também teve, ao longo de toda sua vida, uma mulher para admirar: sua mãe. "O grande amor da minha vida", declara. Criada apenas pela matriarca, que trabalhava como catadora de recicláveis, a artista sempre teve o apoio familiar. "Me levou aos 5 anos para cantar no coral, incentivou todas as minhas inscrições em curso de música, a primeira a me ver ser artista. É a minha base, minha essência e educação", fala.
Uma das marcas da música da soteropolitana é a influência da espiritualidade. Até os 14 anos, Majur esteve ligada à religião evangélica, que foi, inclusive, onde começou a cantar. Atualmente, ela encontrou um lugar no candomblé. "Eu sou uma aprendiz do mundo e suas infinitas magias. Agora, completando três anos da minha iniciação", relembra. "Conectada a espiritualidade desde a infância, nos próximos trabalhos verão a ancestralidade mais forte e potente nas músicas e palco", avisa a cantora.
Majur comenta que a expressão "A arte salva", muito mencionada no meio artístico e em geral, significa, para ela, "um renascimento". "Costumo dizer que o que mudou mesmo a minha vida foi a música". 
Carreira na moda
Majur foi a primeira artista brasileira a trabalhar com uma grife italiana, construindo uma carreira na moda em paralelo à música. Ela demonstra que Naomi Campbell, a primeira modelo negra a ter destaque mundial e sucesso nos anos 1990, é sua grande inspiração no ramo. "Me influencia muito, desde muito nova. Inclusive, quando teve o primeiro encontro dela com a Gisele Bündchen, eu vi, e me lembro que eu era criança, e o quanto eu estava emocionada de me sentir representada a partir dali", narra.
Ela considera que, a partir da modelo, percebeu que também poderia ser exemplo de representatividade. "A Naomi sempre diz que uma top model nasce para inspirar outras pessoas. E eu só percebi que eu inspirava outras pessoas quando o meu corpo andava pelos meus sonhos, quando conseguia conquistar os meus sonhos e acabava representando os sonhos de outras pessoas que não conseguiam chegar naquele mesmo lugar ou que não pensavam que poderiam chegar naquele lugar", revela a cantora.
Ela acrescenta: "Então, eu entendi que eu era uma top model, entendi que o meu corpo iria passar por esse lugar de inspirar outras pessoas. Daí veio o estilo, o estilo eu acho que é a construção - é o que permeia isso tudo. Eu tive uma grande caminhada nesse processo inteiro, até chegar nesse entendimento. E, hoje, tudo isso mostra como eu me sinto, como eu me visto".
Majur valoriza seu stylist, Bruno Pimentel, que conta, desde 2019, ter ajudado a encontrar o que ela mais gostava para se apresentar. "De lá para cá, eu consegui, e claro, você, consegue fazer de todos os lugares. Eu digo isso em todas as condições financeiras, é possível, sim, você ter o seu estilo. Porque o estilo é sobre a sua forma de se expressar. Então, não é aprender, não é chegar até esse lugar. É conseguir se expressar através do seu próprio corpo - e eu acho que todo mundo faz isso no dia a dia", avalia.
*Reportagem da estagiária Mylena Larrubia, sob supervisão de Isabelle Rosa