Cena da série Os Quatro da CandeláriaDivulgação

Rio - 'Os Quatro da Candelária', série ficcional da Netflix, estreou no último dia 30 de outubro, e conta as histórias que antecedem a tragédia pelo olhar de quatro sobreviventes da chacina, que aconteceu no dia 23 de julho de 1993 no Centro do Rio e teve uma repercussão mundial. Diferente do caso real, a ideia do projeto é focar no olhar sonhador dessas crianças e adolescentes e todas as dificuldades enfrentadas para sobreviverem na rua.
"Todo mundo quando ouve uma série sobre Candelária espera que ver corpos negros estirados no chão, sangue, tristeza e não é isso. A série é sobre a trajetória dessas crianças nas últimas 36 horas antes da chacina, mas em cima dos sonhos, dos desejos, dos desafios e das lutas diárias nas ruas do Rio de Janeiro", explica o diretor Luis Lomenha.
"Toda a narrativa foi traçada a partir dos sonhos dessas crianças, é comum, independente da nossa origem. Embora a sociedade na totalidade não tenha essa consciência de que, o fato de uma criança estar na rua não significa que ela não sonha, que ela não queira sair daquela realidade e ser acolhida, sem precisar passar por medo e todas as dificuldades", complementa.
Apesar de ser uma ficção, a produção ouviu histórias reais de alguns sobreviventes que inspiraram as dos personagens. "Pegamos relatos reais e foi bacana porque a gente mergulha na ideia de trazer o realismo fantástico para ele navegar com o realismo, através da imaginação, da fantasia e isso que acho que é o grande motor que cativa o espectador e leva ele embarcar a um lugar onde ele não imaginaria".  
O elenco principal é formado por Jesus (Andrei Marques), Douglas (Samuel Silva), Sete (Patrick Congo) e Pipoca (Wendy Queiroz), três deles estreantes, que impressionam com a desenvoltura em cena. Entre as participações especiais estão:  Antonio Pitanga, Leandro Firmino, Péricles e Stepan Nercessian, que aparecem no primeiro episódio e Bruno Gagliasso, que surge no segundo episódio como o comerciante Jorge, do Centro do Rio, que tem uma "família tradicional"e mantém em segredo um relacionamento extraconjugal com um dos jovens, o Sete. Os dois estão dando o que falar ao aparecerem em cenas quentes de sexo.
"De certa forma, ele não deixa de ser um pedófilo porque ele tem caso com um menino de 16, 17 anos", conta Bruno, acostumado a interpretar papéis fortes em sua trajetória profissional. "Gosto de personagens assim, só que tem um peso grande porque o mundo sabe da história da Candelária, pesa muito e a responsabilidade só me fez querer entender mais sobre. Costumo dizer que essa série não é uma série sobre a chacina, é uma série sobre o sonho interrompido desses meninos, que moravam na Candelária, acredito nisso. Acho que por isso todo mundo está orgulhoso de fazer parte desse projeto", avalia.
Bruno e Giovanna Ewbank são pais de Titi, Bless e Zyan, os dois primeiros nascidos em Malawi e adotados pelo casal. O ator diz que o filho do meio já demonstra interesse pela arte e se orgulha de trabalhar em um projeto que o elenco negro prevalece para serem referências para seus herdeiros."Sem dúvida esse protagonismo negro contribuiu muito para minha entrada na série. Quis fazer parte disso, mais de 80% do elenco é preto, equipe e eu quis fazer parte disso. É uma representatividade grande para os meus filhos".
Leandro Firmino indicou um dos protagonistas para teste
Leandro Firmino faz Paulinho, pai adotivo de Douglas, interpretado pelo ator estreante Samuel Silva, descoberto por ele tocando violino em um ônibus em São Gonçalo. 
"Acabei indicando o Samuel para fazer o teste porque ele tinha me dito: 'pô, tio, meu sonho era ser ator'. Estar no Candelária para mim é estar num projeto que eu já conhecia há mais de 10 anos porque o Luis Lomenha é meu amigo há mais de 20 anos e por indicar alguém da cidade que vivo, atualmente, para fazer o teste e ele acabou virando um dos protagonistas da série", comemora Firmino.  
O ator analisa as dificuldades que esses jovens em situação de rua sofrem por serem invisívies para a sociedade. "É uma luta constante, a luta por igualdade, por justiça. A arte presta um serviço essencial quando ela aborda esses temas, porque isso a leva a uma série de discussões. Como a gente pode, de alguma forma, fazer a sua parte para amenizar essa problemática?", conclui. 
Oito mortos
No dia 23 de julho de 1993, oito crianças e adolescentes em situação de rua - com idade entre 11 e 19 anos - foram assassinados a tiros enquanto dormiam na calçada, em frente à igreja da Candelária. Eles foram vítimas de ataques de três policiais militares e um ex-PM e foram condenados a penas que ultrapassam os 200 anos de prisão e já soltos. O motivo do crime foi por, um dia antes, eles terem jogado pedras na viatura da polícia. O PM Nelson Oliveira dos Santos cumpriu pena até sua extinção, em 2008, o PM Marco Aurélio Dias de Alcântara e o ex-PM Marcus Vinícius Emmanuel Borges cumpriram suas penas até receberem indultos em 2011 e 2012.