Rio - Não importava onde estivesse Panmela Castro, de 38 anos. Nem os horários mais, que eram os mais variados. Mulheres passaram a abordá-la para contar suas histórias de violência. Na internet, a artista plástica recebia relatos praticamente todos os dias. Tudo porque ela usou um relato pessoal (foi espancada e colocada em cárcere privado por um ex) para se conectar com mulheres e promover a Lei Maria da Penha.
O resultado está na exposição 'Retratos Relatos', no Museu da República, no Catete, até 31 de maio, com 15 portraits (retratos), inspirados não só pela imagem da autora do depoimento, como na temática da narrativa. O ingresso custa R$ 6, mas é grátis às quartas-feiras e domingos (horário: das 10h às 17h de terça a sexta e, 11h às 18h, fim de semana e feriados.
"O tipo de pintura solta, que namora com a abstração é proposital. Com essa onda de ódio na internet eu não queria que essas moças se tornassem alvos de ataques misóginos por suas histórias, por isso elas aparecem anônimas. Mas ainda sim trabalhei traços marcantes onde as retratadas pudessem se reconhecer na pintura", conta ela, cujo projeto reúne retratos inspirados em mulheres de todo o país.
SUPERAÇÃO
Panmela explica que muito dos relatos que recebe são de superação. Em geral, de mulheres que passaram por situações de abuso, lidaram com isso e seguiram suas vidas. Como o da jovem jovem que foi abusada por parentes durante a infância, mas sofreu um apagão de memória e só foi lembrar muitos anos depois, o que a fez romper com a família.
"Cada um tem sua maneira de superar uma passagem negativa, e eu através da minha prática, procurei criar uma caminha para que pudéssemos nos abraçar e nos cuidar em um processo de cura coletiva", detalha a carioca.
CASOS
Tem o caso de uma mulher que sofreu violência psicológica, moral e física do namorado 10 anos mais velhos e não sabia como sair da relação porque tinha vergonha de contar o que estava passando. E outra, que foi filmada sem saber durante uma relação sexual e tempos depois viu seu vídeo exposto na internet.
"Os relatos contam histórias que as mulheres acham importante que outras saibam. Situações positivas e negativas: seu entendimento do mundo. Uma forma de se comunicar com outras, de mostrar que uma coisa ruim é só uma coisa ruim e sobre a dor que pode ser transformada em potência política para nos protegermos", defende.
PLANOS
Ao todo foram 40 telas pintadas. Com a curadoria é Keyna Eleison, Panmela escolheu as histórias que ficaram mais marcadas no imaginário dela. Mas ela reforça que todas são importantes e precisam ser abordadas, por isso não teve uma escolha a partir da relevância. A exposição no Museu da República ocupa três salas das exposições pontuais.
"Se houvesse mais espaço no museu poderíamos ter escolhido mais. Temos planos para levar as outras obras para serem exibidas em São Paulo e Nova York, nos Estados Unidos, e eu fico contente de receber convites neste sentido", confidencia.