BotafogoVitor Silva/ Botafogo
Trocas no comando, derrotas duras e reclamação: Botafogo e seu segundo turno trágico
Glorioso liderou da 3ª à 33ª rodada da competição, mas acumulou problemas graves
Rio - O que parecia ser uma temporada incrível para quebrar o jejum de 28 anos acabou se transformando em um dos maiores traumas da história do Botafogo, cheio de ingredientes para tornar cruel o fracasso do clube no Brasileirão de 2023. Outrora líder com 14 pontos de diferença, mesmo superando problemas na caminhada, o Alvinegro se perdeu no segundo turno e agonizou nas rodadas finais até ser ultrapassado e ver o sonho acabar.
A temporada do Botafogo foi dividida em recortes com cenários bem diferentes de otimismo, superação, queda de rendimento, demissões e crise profunda. Ainda que dentro do planejamento inicial de John Textor quanto à classificação para a Libertadores, as cartas apresentadas no fim frustraram torcedores e clube, que liderou da 3ª à 33ª rodada da competição.
O Botafogo não tomou conhecimento dos rivais em boa parte do primeiro turno do Brasileirão sob o comando de Luís Castro. Com ele, em 12 rodadas, foram 30 pontos conquistados de 36 possíveis e boa gordura na liderança, com sete de frente em relação aos concorrentes da época (Grêmio, Flamengo e Palmeiras). Um elenco unido e que mostrava força, no entanto, foi surpreendido com a notícia de que o português havia dado "ok" à proposta recebida do Al-Nassr, da Arábia Saudita, clube de Cristiano Ronaldo.
A notícia foi um baque para o projeto da SAF do Botafogo, que apostou todas as fichas em Castro visando a reestruturação do futebol alvinegro com o chamado "Botafogo Way", um modelo de jogo que ficaria marcado no clube em sua nova fase. Com o elenco empolgado e "fechado" com o treinador, ficou a dúvida: seria o Botafogo capaz de superar a perda do grande nome? A resposta foi positiva.
Para tentar não mudar drasticamente o planejamento, Textor contrata Cláudio Caçapa, então auxiliar do Lyon, como interino. À frente do Glorioso, o atual técnico do RWD Molenbeek (BEL) comandou três jogos pelo Brasileirão e teve 100% de aproveitamento, aumentando a vantagem na ponta para 12 pontos. "Cheirinho de campeão", disse Caçapa, quando se despediu do clube. Para ocupar a cadeira de forma definitiva, Bruno Lage, campeão português pelo Benfica e ex-Premier League com o Wolverhampton, foi contratado.
Bruno Lage chegou cercado de expectativas no Estádio Nilton Santos, conseguiu administrar a boa vantagem, mas ficou marcado por situações que arruinaram sua passagem pelo Alvinegro. Após a derrota por 2 a 1 para o Flamengo, ele, percebendo um ambiente de pressão, colocou o cargo à disposição em entrevista coletiva e a postura desagradou internamente - ainda que tenha sido uma medida para aliviar o elenco líder da época.
Decisões ao longo do trabalho foram minando sua sequência à frente da equipe, como as alterações no sistema tático que apresentava resultado em campo, improvisações e insistências mesmo em meio aos sinais de queda na metade da temporada, até o último ato: artilheiro do ano, Tiquinho Soares foi barrado da partida contra o Goiás pela 25ª rodada, entrou no segundo tempo e marcou o gol que garantiu o empate no Rio de Janeiro.
As ações do técnico português desagradaram muito staff e elenco do Botafogo, que se reuniram um dia após o quarto jogo seguido sem vitória no início do segundo turno. Jogadores externaram insatisfação com o trabalho, indicaram necessidade de mudanças na comissão técnica e foram atendidos.
Bruno Lage foi demitido carregando incerteza e uma eliminação na Copa Sul-Americana, onde a equipe era a grande favorita. Para seu lugar, um velho conhecido foi acionado a pedido do plantel: Lucio Flavio e Joel Carli, recém-aposentado, assumiram a rotina no CT Lonier.
Lucio Flavio, no entanto, não correspondeu à altura aquilo que foi passado por todo o grupo. Ainda que tenha começado bem, com duas vitórias sobre Fluminense e América-MG nas rodadas 26 e 27, o ex-jogador do Botafogo viu o bom ano, que parecia caminhar a passos largos para o título, ser arruinado jogo após jogo.
O quarto treinador do Glorioso em 2023 acumulou seis tropeços consecutivos (dois empates e quatro derrotas), mas um deles deu início ao caos: a virada histórica sofrida no Nilton Santos para o Palmeiras, por 4 a 3, após descer para o intervalo vencendo por 3 a 0.
A partir do duelo com o Verdão, o Botafogo se afundou psicologicamente e foi acumulando problemas em sua caminhada. Textor e jogadores passaram a protestar contra a arbitragem do Brasileirão entendendo um movimento para prejudicar o clube. Enquanto isso, em campo, os resultados ruins batiam na porta e entravam sem um sinal de mudança no ambiente. Cenário de tragédia anunciada. O péssimo desempenho puniu o Alvinegro.
Ainda que Lucio Flavio tenha comandado a equipe em mais três oportunidades com boas chances de reverter o quadro, a cada dia que passava o Botafogo se via mais distante de voltar a encantar. Se não bastasse a dura derrota para o Palmeiras, logo depois a equipe perdeu clássico para o Vasco e levou mais uma virada histórica, desta vez para o Grêmio. O time não respondeu e, o que era inimaginável ao fim da primeira metade, acabou acontecendo.
O cansaço físico e mental era aparente em um grupo que recebeu muito apoio, mas perdeu as forças quando a briga pelo título apertou. Na 34ª rodada, após empate com o Bragantino, o Glorioso caiu para a segunda colocação e passou o bastão para o Palmeiras.
Para tentar salvar o ano e eliminar as dúvidas sobre o título, Tiago Nunes foi contratado como técnico para assumir em um jogo atrasado contra o Fortaleza que, em caso de vitória, devolveria a ponta ao Botafogo. O novo comandante, no entanto, tentou implementar uma nova disposição tática dentro de campo para dar oxigênio na briga pelo tricampeonato. Nada feito.
Nas últimas rodadas, o Botafogo foi a campo com uma estrutura completamente diferente daquela que levou a equipe até as primeiras posições. Uma cartada de Tiago Nunes, com algo diferente do restante do ano, para mostrar seu trabalho. A grave crise, escancarada apenas no fim, levantou pontos importantes do vividos até a metade do segundo turno.
Os jogos seguintes com a intenção de ao menos manter a briga pela taça mostraram como o Botafogo não superou os problemas que ocasionaram a derrocada. Resultados contra Santos e Coritiba, com empates cedidos nos últimos lances, foram apenas reflexos de um elenco abalado e pouco inspirado. Heróis do início de 2023 se transformaram em vilões em um ano que não sairá da memória alvinegra.
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