O Iraque continua sob tensão por uma crise política que deixou o país sem governo desde as legislativas de outubro de 2021 AFP
Manifestantes deixam Zona Verde de Bagdá após violentos confrontos de segunda
Conflito na região mais segura do país deixou 30 mortos e mais de 500 feridos
Bagdá - Apoiadores de Moqtada Sadr deixaram nesta terça-feira, 30, a Zona Verde de Bagdá depois que o líder xiita pediu o fim dos confrontos com o exército, que deixaram 30 mortos e centenas de feridos na segunda-feira. O violento embate foi protagonizado pelos seguidores de Sadr e facções xiitas apoiadas pelo Irã. Considerada a região mais segura da capital, o Centro de Bagdá virou uma praça de guerra, com troca de tiros em barricadas dos dois lados.
Nesta terça-feira, momentos depois do discurso de Sadr ser transmitido ao vivo pela TV, seus apoiadores começaram a abandonar a Zona Verde. Minutos depois, o exército levantou o toque de recolher que havia decretado em todo o país.
Sadr, um pregador com milhões de seguidores que liderou uma milícia contra os ocupantes após a invasão do Iraque liderada pelos Estados Unidos em março de 2003, deu a seus seguidores "60 minutos" para se retirarem, ameaçando "desautorizar" aqueles que ficassem.
"Peço desculpas ao povo iraquiano, o único afetado pelos acontecimentos", disse Sadr a repórteres de sua base na cidade iraquiana de Nayaf (centro).
Ao menos 30 de seus seguidores morreram nos confrontos e 570 ficaram feridos, segundo fontes médicas. Um balanço interior apontava para 23 mortos.
O Iraque continua sob tensão por uma crise política que deixou o país sem governo, sem primeiro-ministro e sem presidente desde as legislativas de outubro de 2021.
Na segunda-feira, a tensão aumentou bruscamente quando os partidários de Sadr invadiram o Palácio da República dentro da Zona Verde, após o anúncio de seu líder de que deixaria a política.
Durante a noite, houve disparos contra a Zona Verde, que abriga estabelecimentos do governo e missões diplomáticas. Os protestos começaram quando Sadr anunciou inesperadamente sua "retirada definitiva" da política.
Os confrontos continuaram nesta terça entre os apoiadores de Sadr contra o exército e os homens das Unidades de Mobilização Popular (Hashed al Shabi), ex-paramilitares apoiados pelo Irã, que depois se integraram às forças iraquianas.
A Missão da ONU de Assistência no Iraque (Unami) classificou os fatos como "uma escalada extremamente perigosa" e pediu a todas as partes que "se abstenham de atos que possam levar a uma cadeia implacável de eventos".
Nesta terça-feira aconteceu na cidade sagrada xiita de Najaf um funeral para alguns dos manifestantes mortos em Bagdá, que contou com uma multidão. Segundo testemunhas, os apoiadores de Sadr e de um grupo xiita rival, o Marco de Coordenação, pró-iraniano, trocaram disparos em Bagdá.
O Marco de Coordenação condenou um "ataque às instituições estatais" e pediu aos sadristas que comecem um diálogo. O primeiro-ministro interino Mustafa al-Kadhemi, por sua vez, disse que "as forças militares, de segurança e os homens armados" estão proibidos de abrir fogo contra os manifestantes.
Os Estados Unidos também pediram calma em meio aos relatos "preocupantes" sobre a situação, enquanto a França pediu "às partes que exerçam moderação máxima".
Pouco depois de Sadr anunciar sua renúncia na segunda-feira, seus apoiadores invadiram o Palácio da República em Bagdá, onde geralmente acontecem as reuniões do gabinete.
Sadr, um homem-chave na cena política do país devastado pela guerra, embora nunca tenha participado diretamente do governo, pediu no fim de semana a "todos os partidos", incluindo o seu, que renunciassem aos seus cargos no governo para ajudar a resolver a crise política.
Nas eleições legislativas de outubro de 2021, o bloco de Sadr ficou inicialmente com 73 cadeiras (de 329), mas por não conseguir formar uma maioria, fez seus deputados renunciarem em junho, alegando querer "reformar" o sistema e acabar com a corrupção.
A renúncia fez o Marco de Coordenação se tornar o principal partido político. Antes de seu anúncio na segunda-feira, Sadr, um líder muito influente e imprevisível, aumentou a pressão nas últimas semanas e há um mês seus apoiadores acampam em frente ao Parlamento, bloqueando brevemente o acesso ao máximo órgão judicial do país.