Putin enfrenta uma crise interna no país após anunciar a convocação de 300 mil pessoas para a guerra contra a UcrâniaAFP

A Rússia reiterou nesta terça-feira (27) a ameaça de utilizar armas nucleares, no último dia dos referendos de anexação de quatro territórios sob seu controle, onde o "sim" está em clara vantagem numa consulta denunciada pelo Ocidente.
Os referendos ocorrem nas regiões separatistas pró-Rússia de Donetsk e Lugansk (leste), assim como nas regiões de Kherson e Zaporizhzhia (sul), sob ocupação russa.
A comissão eleitoral russa afirmou que o "sim" lidera nas quatro regiões ucranianas onde são realizados, segundo os resultados preliminares dos centros de votação em território russo, de acordo com as agências russas de notícias.
A comissão afirmou que o "sim" obtém entre 97% e 98% dos votos após a contagem de entre 20% e 27% das cédulas nos centros de votação na Rússia, enquanto a contagem começava nas regiões ucranianas sob controle de Moscou, afirmaram as agências Ria Novosti, Tass e Interfax.
Falando à imprensa russa, o chefe da administração ocupante de Kherson, Vladimir Saldo, já reivindicou a vitória do "sim" nesta votação organizada desde 23 de setembro, na presença de tropas russas e apesar dos bombardeios.
"Está claro que a esmagadora maioria das pessoas apoiou a saída da Ucrânia e a união com a Rússia", disse Saldo, referindo-se à área sob seu controle.
Já o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, minimizou o valor desses referendos.
"Nada mudará em nossa política, na nossa diplomacia, ou em nossas ações no campo militar", garantiu o ministro em entrevista coletiva em Kiev, ao lado dea chanceler francesa, Catherine Colonna.
Os países do G7 prometeram nunca reconhecer os resultados. O governo dos Estados Unidos citou uma resposta "rápida e severa" por meio de sanções econômicas adicionais.
A UE destacou que considera os referendos de anexação "ilegais" e "ilegítimos". Também advertiu que as pessoas que colaboraram em sua organização serão alvos de sanções.
Os referendos de anexação organizados pela Rússia em quatro regiões do sul e leste da Ucrânia são uma "farsa" e uma "flagrante violação do direito internacional", afirmou Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan.
Stoltenberg informou no Twitter que há pouco conversou com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, para "deixar claro que os aliados da Otan não hesitam em apoiar a soberania da Ucrânia e seu direito à autodefesa".
Por sua vez, o ex-presidente russo e atual número dois do Conselho de Segurança da Rússia, Dmitri Medvedev, afirmou que Moscou defenderá os novos territórios que pretende incorporar após as votações com o uso de "todas as armas russas, incluindo as armas estratégicas".
"Eu vou repetir mais uma vez para os ouvidos surdos (...) A Rússia tem o direito de usar a arma atômica, caso seja necessário", disse.
As votações foram organizadas como resposta à contraofensiva de Kiev, que com o apoio das armas fornecidas pelas potências ocidentais recuperou milhares de quilômetros quadrados dos russos desde o início de setembro, e recordam a estratégia utilizada para a anexação da Crimeia em 2014.
As cinco regiões representam pouco mais de 20% da superfície ucraniana.
Nesta terça-feira, o presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que os referendos pretendem "salvar as populações" que moram nestes territórios.
A China, aliado importante da Rússia, não criticou abertamente os referendos, mas pediu o respeito à "integridade territorial de todos os países".
Nenhuma crítica ou ameaça parece abalar Moscou, que organizou os referendos às pressas, em um momento de vitórias militares ucranianas, com a abertura de centenas de locais de votação nos quatro territórios e na Rússia - para permitir o voto dos deslocados pelo conflito.
As autoridades pró-Rússia informaram que na terça-feira à noite ou nos próximos dias serão anunciados "resultados provisórios". Em seguida, o Parlamento russo deve aprovar um texto para formalizar a integração das quatro regiões
Na atual fase do conflito, a Rússia anunciou uma mobilização de reservistas que pretende recrutar 300.000 soldados, o que provocou um êxodo de russos para países vizinhos.
Nesta terça-feira, a tendência foi confirmada por Geórgia e Cazaquistão. Os deslocamentos também são observados para países como Finlândia e Mongólia.
"Eu não sou bucha de canhão, não sou um assassino", disse à AFP Nikita, um russo de 23 anos que cruzou a fronteira com a Geórgia.
O ministério da Defesa da Rússia informou que não solicitará a extradição dos milhares de homens que fugiram para países vizinhos para escapar do recrutamento.
No campo de batalha, a Ucrânia reivindicou avanços territoriais no leste e o governador de Kharkiv anunciou que as forças ucranianas recuperaram a localidade de Kupiansk-Vuzlovyi, "um dos centros logísticos e ferroviários" da região.
A Rússia afirmou que provocou grandes perdas a seu adversário.
Nos últimos dias, os ataques russos com drones de fabricação iraniana aumentaram, em particular na cidade costeira de Odessa, um grande porto do Mar Negro, onde dois aparelhos atingiram na segunda-feira a infraestrutura militar e provocaram um grande incêndio, assim como a explosão de munições, de acordo com o comando militar.
Ao mesmo tempo, os dois gasodutos Nord Stream que transportam gás russo para a Europa sofreram vazamentos significativos, segundo Suécia e Dinamarca.
Os dois gasodutos, no Mar Báltico, estão fora de serviço, mas cheios de gás. De acordo com sismólogos suecos, pouco antes de os vazamentos serem observados, duas explosões submarinas foram registradas, provavelmente devido "a algum tipo de detonação".
A Ucrânia disse que provavelmente foi um "ataque terrorista" planejado por Moscou contra a União Europeia. A Rússia afirmou estar "extremamente preocupada" e disse que não descarta "nenhuma" hipótese, incluindo sabotagem.