Assembleia geral da ONUYuki IWAMURA / AFP

A Assembleia Geral da ONU começou a analisar nesta quarta-feira (2) uma nova proposta de resolução apresentada por Cuba, que exige o "fim do bloqueio econômico, comercial e financeiro" imposto pelos Estados Unidos há 60 anos.
O projeto de resolução, que será votado nesta quinta-feira, manifesta "preocupação" com a manutenção do embargo econômico e seus "efeitos negativos sobre a população cubana".
Cuba defende a "igualdade soberana" dos Estados, a "não ingerência em seus assuntos internos" e a "liberdade de comércio e de navegação" para exigir o fim do embargo, imposto em fevereiro de 1962, em plena Guerra Fria, pelo então presidente John F. Kennedy e reforçado progressivamente desde essa época.
Um relatório preparado pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, a pedido da Assembleia Geral, conclui que "a continuação do bloqueio financeiro e comercial dos Estados Unidos contra Cuba é incompatível com um sistema baseado no Estado de Direito". "Baseia-se mais no exercício do poder político e econômico", diz.
 Medidas
"Ilegal", "inaceitável", "criminoso", "desumano", "agressão econômica": estes foram alguns dos adjetivos mais usados por cerca de 30 palestrantes, dos 44 inscritos, que se sucederam na tribuna ao longo desta manhã, muitos deles latino-americanos.
Presente na sessão, o chanceler cubano, Bruno Rodríguez, deve se dirigir ao plenário da casa nesta quinta-feira.
"Os Estados Unidos devem cessar essas medidas e reparar os danos" infligidos ao povo cubano, disse o embaixador mexicano, Juan Ramón de la Fuente.
Para a embaixadora argentina, María del Carmen Squeff, que falou em nome da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), o bloqueio "é contrário à letra, ao espírito, aos princípios e aos propósitos da Carta das Nações Unidas e do Direito Internacional". A Colômbia, por sua vez, rejeitou a "inclusão injusta" de Cuba na lista de países patrocinadores do terrorismo.
Esta é a 30ª resolução apresentada por Cuba desde 1992 contra o embargo dos Estados Unidos. Somente em 2020 não houve resolução, em razão da pandemia da covid-19.
Na primeira resolução de 1992, apenas 59 países votaram a favor, mas agora ela tem o apoio de quase todos os membros da ONU, com exceção dos Estados Unidos e Israel.
Washington se absteve somente em 2016. E isso como consequência da política de reaproximação do governo do presidente democrata Barack Obama, que restabeleceu relações com o regime cubano em 2015.
A abertura americana durou pouco. O republicano Donald Trump introduziu cerca de 250 novas sanções e declarou o país comunista patrocinador do terrorismo. Apesar de suas promessas de campanha, seu sucessor, o democrata Joe Biden, ex-vice-presidente de Obama, mantém essas sanções, salvo algumas mudanças em vistos, viagens e remessas para a ilha.
 Situação delicada
Dezoito ex-presidentes latino-americanos, entre eles a brasileira Dilma Rousseff, o uruguaio José Mujica, o colombiano Juan Manuel Santos e o equatoriano Rafael Correa, enviaram uma carta a Biden nesta quarta-feira, pedindo que, diante "da situação delicada que o povo cubano enfrenta, ele disponha o que for necessário para levantar essas restrições, que atingem os mais vulneráveis".
A carta também pede que Biden retire Cuba da lista de países que patrocinam o terrorismo, na qual o presidente republicano Donald Trump a inseriu dias antes de concluir seu mandato, em janeiro de 2021.
 
"A 'trumpificação' da política dos Estados Unidos em relação a Cuba se solidificou", disse à AFP o diretor do blog La Joven Cuba, Harold Cárdenas.
"Passamos 60 anos neste jogo entre os dois governos, e o povo cubano apanhado no meio", denunciou.
Após a passagem devastadora do furacão Ian sobre a ilha, em 19 de outubro, o governo cubano pediu a Biden que suspendesse as sanções atribuíveis ao presidente, já que o restante pode ser suspenso somente pelo Congresso.
Cuba vive sua pior crise econômica em três décadas, com escassez de alimentos, remédios e combustíveis, enquanto enfrenta apagões diários, devido à tecnologia obsoleta de suas usinas termelétricas, agravada pelos efeitos da pandemia de coronavírus.
Segundo as autoridades cubanas, o embargo causa prejuízos econômicos de US$ 154 bilhões atuais à ilha. Destes, foram US$ 3,8 bilhões apenas entre agosto de 2021 e fevereiro de 2022, segundo o chanceler Bruno Rodríguez. De acordo com o governo cubano, isso teria se traduzido em um crescimento de 4,5% na economia.
A falta de mudanças políticas e a repressão às manifestações de 11 de julho de 2021 - que deixaram 1.395 detidos, dos quais 728 ainda estão presos, segundo a última contagem da ONG Cubalex, com sede em Miami - não contribuem para uma mudança na política americana em relação à ilha.
Nos últimos anos, os Estados Unidos justificaram seu embargo contra Cuba por duas questões: violações de direitos humanos e apoio de Havana ao governo de Nicolás Maduro na Venezuela.
Essa é a 30ª resolução apresentada desde 1992 por Cuba contra o embargo dos Estados Unidos. Apenas em 2020 não houve resolução, devido à pandemia de Covid-19.