Allan Borges e Andrea Pulici  Opinião O Dia - divulgação
Allan Borges e Andrea Pulici Opinião O Diadivulgação
Por Allan Borges e Andrea Pulici*
No ano de 2020, 8,4% dos alunos, de 6 a 14 anos de idade e matriculados antes do período de isolamento social, abandonaram os estudos, segundo o Datafolha. O percentual parece irrelevante, mas corresponde a quatro milhões de estudantes, número superior ao da população do Uruguai. No mês de março, momento anterior à pandemia no país, as escolas públicas tinham 35,9 milhões de matrículas, no entanto, em 2019 eram 36,6 milhões, segundo os dados do censo escolar (IBGE).
A interrupção dos serviços educacionais gera consequências de longo prazo para a sociedade, agravando as desigualdades, impactos negativos na Economia e na coesão social. Em estudos recentes do Insper, a conta é de que o jovem fora da escola custa mais ao país que o investimento feito para que ele conclua a educação básica. Segundo a pesquisa, são gastos cerca de R$ 90 mil por aluno na educação básica. Quando ele não conclui, a perda é de R$ 372 mil por ano para o Brasil.
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Outro estudo feito pelo Datafolha revela que três em cada dez responsáveis de estudantes de escolas públicas temiam que os jovens desistissem da escola se não conseguissem acompanhar as aulas não presenciais. Entre os que têm três ou mais estudantes em casa, esse índice chegou a 38%.
Atualmente, fala-se em retomada das aulas, mas não existe uma explicação sobre como a vida real para além dos protocolos sanitários será abordada. Será que teremos capacidade de atrair estes alunos de volta para a escola, fazer a recuperação da rotina, do estímulo ao estudo e restaurar o abismo educacional que está posto?
A escola pública está longe de ter um repertório sedutor, que incite o desejo do estudante retomar velhos hábitos no eixo casa-escola-casa. Por esse motivo, a atual conjuntura é uma oportunidade de desconstruir e fazer algo novo, repensando o método de estudo e avaliação.
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Perseguir, portanto, o sonho do ensino público - universal - gratuito – de qualidade, neste momento, passa pela reestruturação do que isso realmente significa em essência e oferta para esse estudante. Será preciso investir em tecnologia e avançar na linha do cuidado integral com apoio psicossocial aos alunos e profissionais da Educação que vivenciaram tantas perdas. É importante que haja um alinhamento e constantes discussões com os atores que constroem o espaço escolar – diretores, professores, alunos, família e comunidade.
O mais impressionante é que o governo federal e boa parte dos estados e municípios não convocam o SUS, SUAS e a CULTURA, não incluem essas estruturas como aliadas dividindo a responsabilidade sobre a segurança e eficácia da volta às aulas no contexto da pandemia. Essa integração nunca foi tão necessária, o trabalho precisa ser articulado.
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Se por um lado temos todas as questões ligadas à pandemia e à dificuldade de retomada de aulas presenciais para todos, é preciso lembrar que, para muitas famílias brasileiras, é na escola que grande parte das crianças consegue realizar as quatro refeições diárias. Não se trata de uma argumentação retórica, mas de enfrentar uma contingência.
A retomada das aulas urge como forma de recuperação do conteúdo, reconstrução dos vínculos, diminuição da violência e mitigação da insegurança alimentar dos estudantes. Por fim, nenhum “plano perfeito” resistirá ao primeiro contato com esses agentes eventualmente desmotivados e exigentes ao mesmo tempo. Decerto, temos uma hipótese baseada em inúmeras evidências: a escola ainda é um espaço mais seguro que a rua e suas injunções.
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Allan Borges é Mestre em Bens Culturais e Projetos Sociais pela FGV.RJ
Andrea Pulici é Doutora em Planejamento Urbano pela UFRJ