Raul Velloso analisa situaçãoReprodução

Causaram recentemente estranheza a vários segmentos da mídia os elevados valores dos déficits públicos divulgados pelo Banco Central para os municípios, e relativos ao período dos últimos 12 meses até outubro último, algo cujo principal fator explicativo, mas de baixa percepção por parte dos observadores da área macroeconômica, se refere aos elevados déficits previdenciários que vêm sendo registrados por esses entes.
Aqui, cabe lembrar que o envelhecimento dos regimes (isto é, os elevados números de beneficiários em relação aos de contribuintes que já foram atingidos) e fatores demográficos (como o de que as pessoas estejam vivendo mais do que anteriormente) têm sido decisivos para explicar os maiores déficits das previdências respectivas. Além disso, deve-se mencionar que a Emenda 103/19, aprovada na última reforma, não obrigou que os demais entes seguissem automaticamente as novas (e mais duras) regras previdenciárias aprovadas pela União para si, muito embora tenha se tornado uma obrigação de todos implementar a tarefa mais complicada que se possa imaginar, que é a do "juízo final", ou zeragem dos déficits previdenciários respectivos, o que, como seria de se esperar, tem acontecido muito pouco frequentemente na prática.
O pior de tudo é que, se dividirmos a fase 2006-2022 em dois subperíodos, 2006-13 e 2014-22, e por conta da falta de ajuste previdenciário relevante, se vê que o valor real dos investimentos em infraestrutura do conjunto dos entes públicos, que, na primeira fase, ainda subira bastante (à taxa média real de 6,1% a.a.), na segunda teve crescimento praticamente nulo. Ou seja, é preciso ajustar os desequilíbrios previdenciários de todos esses entes para o país voltar a investir em montantes mais elevados, de modo a crescer economicamente a taxas minimamente razoáveis. Na verdade, o que acabou acontecendo foi uma queda expressiva da taxa de crescimento do PIB, segunda e última etapa do processo de ajuste. Com efeito, o crescimento do PIB, que havia alcançado a taxa média de 3,1% a.a. em 2007-13, acabou despencando para a média zero, entre 2014 e 2022.
Para concluir, uma dúvida que surge aqui e ali é por que motivo, segundo o Banco Central, o conjunto dos municípios vem mostrando resultados fiscais globais tão desfavoráveis comparativamente ao dos estados, onde o conjunto dos entes registrava superávits na mesma época.
Isso tem basicamente a ver com o crescimento real super rápido dos gastos previdenciários municipais nos últimos tempos, bem acima do que ocorria no resto do setor público. Enquanto aqueles cresciam a 12,5% a.a., em média, em 2011-18, nos estados a mesma taxa era de 5,9% (em 2006-18); no Regime Geral (INSS), era de 5,1% (em 2006-20) e, no Regime Próprio da União, era de 3,1 a.a. (em 2006-21).
Raul Velloso
Consultor econômico