Júlio Furtado é professor e escritorLindsay Romariz / divulgação

Ao perguntar para uma plateia de professores com quem eles aprenderam a ser professor, quem os ensinou a dar aulas do jeito que o fazem, sempre me deparo com um silêncio ensurdecedor. Certa vez, tal silêncio foi quebrado por uma professora, que, bem alto, falou: "Aprendi com meus professores de Didática!". Após essa resposta, o silêncio tornou-se mais ensurdecedor ainda e, diante de tal silêncio, perguntei para a plateia em tom de cochicho: "Vocês também acham que aprenderam a ser professores nas aulas de Didática?". Dessa vez a resposta foi um uníssono "não!" que pareceu ter sido ensaiado.
É verdade, não somos os professores que, supostamente, aprendemos a ser nas aulas de Didática. Se assim fosse, as salas de aula não estariam arrumadas em fileiras, não daríamos tantas aulas expositivas e nem exigiríamos silêncio o tempo todo. Nossa prática docente é fruto inconsciente de como percebemos o fazer dos professores que passaram por nossa vida escolar. Por menos que tenhamos gostado, fazemos, em sala, algo bem parecido com o que fizeram conosco quando éramos alunos.
Essa constatação nos leva à necessidade de identificarmos se somos meros repetidores inconscientes de uma prática profissional ou se, lá no fundo, acreditamos nas verdades subjacentes a essa prática. Vamos colocar de forma mais clara. Acreditamos que o conhecimento é transmitido ou construído? Parece que a escola onde quase todos nós estudamos acreditava na pura transmissão do conhecimento. A crença é a de que o conhecimento está, a princípio, na cabeça do professor que o transmite, através da fala, para dentro da cabeça do aluno. Logo, ensinar é falar e aprender é ouvir. Essa ação requer um professor que fale claramente e um aluno que ouça silenciosa e atenciosamente o que o professor diz.
Pronto, estamos diante de uma configuração, no mínimo, difícil de ser implantada numa sala de aula onde os alunos são seres interativos de nascença. Mas foi assim que aprendemos a ser professor, falando e foi também assim que aprendemos a ser alunos, ouvindo. Por mais que compreendamos que a melhor forma
de aprender é interagir com o objeto de conhecimento, temos dificuldades em darmos esse salto qualitativo. Por isso, é natural em nós a resistência a novos modelos. Somos muito mais filhos da prática do que da teoria.
Júlio Furtado
Professor e escritor