De fato, não há como negar que os idosos conquistaram importantes direitos em nosso país. Mas outros ainda precisam ser inseridos em nossa legislaçãoArte: Kiko

Era uma manhã de segunda-feira no aeroporto de Congonhas, Zona Sul de São Paulo. Passageiros interessados em antecipar seus voos formavam longas filas perto dos portões de embarque. Até aí nada de novo. Até a chegada de um senhor simpático, que também queria chegar em casa mais cedo. Com mais de oitenta anos, chegara algumas horas antes do previsto, na esperança de ter prioridade no embarque. Bem afável, o senhor lembrava dos tempos da antiga ponte aérea, quando a compra de um bilhete garantia o embarque no primeiro voo disponível. Mesmo sabendo de seus direitos de idoso, se constrangia por estar de pé, ao lado de outros candidatos a um assento no avião. Constrangido porque ele tinha certeza de que seria o primeiro a ser chamado. Ledo engano. A empresa disponibilizou as sete poltronas para os passageiros com cartão fidelidade. Deu para perceber sua frustração por não embarcar. Sem reclamar, aguardou outras oportunidades. Todas em vão. Embarcou em seu próprio voo, com a certeza de que o Brasil não é um país para idosos, a despeito de algum alento trazido pelo Estatuto da Pessoa Idosa.


De fato, não há como negar que os idosos conquistaram importantes direitos em nosso país. Mas outros ainda precisam ser inseridos em nossa legislação. Em relação ao transporte aéreo, as leis se limitam a lhes garantir prioridade em filas de check-in e embarque, a mesma prerrogativa que as companhias aéreas concedem aos participantes de seus programas de fidelidade. Em suma, basta obter um cartão de crédito top de linha para estes superarem os idosos em termos de tratamento. Se é certo que os primeiros obtiveram essa conquista pela fidelidade à empresa, é justo dizer que os idosos deveriam ter o mesmo benefício pelo critério da idade.


Em julho de 2024, uma reportagem da Agência Brasil informou que apenas 2% da ocupação nas aeronaves brasileiras é de pessoas com mais de 65 anos de idade, sendo que a população brasileira nessa faixa etária é de 10% do total. Bem provável que este baixo percentual tenha alguma relação com o fato de o Estatuto não assegurar qualquer reserva de vaga para idosos no transporte aéreo, assunto que tem sido foco de algumas proposições, tal como o Projeto de Lei 3.912 que, em essência, busca alterar a lei para reservar três vagas gratuitas em cada avião para pessoas acima de 60 anos.


Comparado ao PL 3.912, o pleito ora formulado nem chega a ir tão longe. O que se postula é apenas a possibilidade de o idoso antecipar o horário de seu voo sem custo algum, qualquer que seja o tipo de tarifa que ele tenha adquirido, desde que o faça pouco tempo antes do horário de embarque. Lógico que isso estaria condicionado à disponibilidade de assento na aeronave, não causando, portanto, qualquer ônus para a empresa. Ele também teria prioridade na antecipação de voo em relação a todos os outros, inclusive os detentores desses cartões. Como se vê, trata-se de uma proposta simples, mas que busca prestigiar aqueles que já deram seu suor pelo Brasil.
* Reis Friede é desembargador federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região