Daniel Guanaes, PhD em Teologia pela Universidade de Aberdeen, é pastor presbiteriano, psicólogo e líder do movimento Pastores pela Vida (Visão Mundial). Divulgação
O alto preço de amar, num mundo de ódios
Vivemos tempos em que o ódio parece ser a moeda mais utilizada na convivência. É só olhar em volta: redes sociais, política, relações familiares. E ele se espalha com rapidez porque sua lógica é a da destruição. Destruir é sempre mais fácil. Para demolir um prédio, bastam alguns segundos de explosão; para construí-lo, são necessários meses de cálculo, investimento, disciplina e paciência.
O amor, ao contrário, é um método de construção. Amar é erguer pontes, sustentar vínculos, cultivar espaços de confiança. Nada disso acontece num estalo; exige tempo, trabalho e perseverança. Por isso, num mundo viciado em atalhos, o amor soa quase subversivo.
Em suas “Confissões”, Santo Agostinho ensina que a medida do amor é amar (a Deus) sem medida. Essa radicalidade nos convida a compreender que o amor não se limita a conveniências, mas pede entrega contínua e sem reservas.
A ética do amor não é um sentimentalismo ingênuo. Não se trata de esperar que o coração esteja tomado por uma emoção para, só então, agir. É justamente o oposto: o amor se manifesta primeiro como gesto, escolha e atitude. É uma decisão concreta que, ao ser repetida, dá origem a sentimentos mais estáveis. Amamos quando fazemos, e só depois, às vezes, sentimos.
Essa inversão é essencial. Odiar é reativo: basta descarregar energia bruta em palavras agressivas ou atitudes violentas. Amar é proativo: requer intenção, exige planejar como tratar alguém com dignidade, mesmo quando essa pessoa não desperta simpatia.
Na tradição cristã, o imperativo do amor é radical: amar o próximo e, ainda mais perturbador, amar o inimigo. Trata-se de um chamado que ultrapassa conveniências e afinidades. Não é convite a uma emoção piedosa, mas a uma prática que desafia a lógica da autopreservação. Amar o inimigo é sabotar o ciclo do ódio, é interromper a engrenagem que alimenta ressentimentos e guerras. Em “De Trinitate”, o mesmo Santo Agostinho é incisivo: “Ama e faze o que quiseres.” O amor, como princípio, orienta e purifica toda ação.
Essa visão é profundamente atual. Num cenário em que discursos de ódio ganham força porque são fáceis, rápidos e baratos, insistir em construir pela via do amor é revolucionário. O amor disciplina, demora e constrói. Amar não é fechar os olhos para o mal, mas escolher não se tornar igual a ele.
O mundo está odioso porque odiar custa pouco. Mas se quisermos um futuro que valha a pena, precisaremos pagar o alto preço de amar. O amor é mais difícil, mas é a única obra que permanece de pé.
Daniel Guanaes, PhD em Teologia pela Universidade de Aberdeen, é pastor presbiteriano e psicólogo clínico

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