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Livro resgata trajetória de Arariboia

Obra revive história do líder indígena que marcou a história do Rio e de Niterói

PAUTA ESPECIAL - Será lançado um livro sobre o indígena Araribóia. Na foto: Estátua do Araribóia em Niterói. Pedro Ivo/ Agência O Dia

Rio - No terminal das barcas e na grande estátua na praça batizada com seu nome, moradores de Niterói e visitantes "esbarram" diariamente com referências a Arariboia. Muitos, no entanto, desconhecem a trajetória do líder indígena que marcou a história do Rio e da Cidade Sorriso. No ano em que Niterói completa 450 anos, um livro recém-lançado resgata a memória de seu fundador.
Herói para uns, traidor para outros, Arariboia (cobra arara, em tupi) é indiscutivelmente um dos personagens mais importantes para a formação da sociedade fluminense após a chegada dos portugueses. Atuou em guerras, negociou com europeus e foi o primeiro e único indígena a fundar uma cidade no país. Sua rica trajetória é tema da biografia "Arariboia – O Indígena que Mudou a História do Brasil" (editora Bazar do Tempo), do jornalista Rafael Freitas da Silva.
Embora Niterói seja um dos raros locais onde a história do líder temiminó é devidamente reconhecida, sua relação com a cidade foi apenas um dos capítulos finais de uma vida repleta de conquistas. A atuação na batalha contra a invasão francesa ao Rio de Janeiro, em 1567, foi determinante para manter o território sob domínio de Portugal, então aliado de sua tribo, graças ao conhecimento da Baía de Guanabara e seus arredores.
Além disso, travou duelos com outras tribos que resistiam à colonização. Foi por isso que convenceu Mem de Sá, então governador-geral do Brasil, a cedê-lo um generoso pedaço de terra do outro lado da Baía de Guanabara, dando origem à Cidade Sorriso.
"Sem ele, não seria possível Portugal fundar a cidade do Rio. Quem fala isso são os próprios portugueses, que sempre louvaram o papel de Arariboia na conquista do Rio de Janeiro. Na fundação do Rio, acontece realmente uma resistência muito grande dos indígenas que habitavam a Baía de Guanabara, que se organizam para impedir que os portugueses tomassem posse da terra que era deles. Então, há uma resistência muito grande, uma guerra que dura 30 anos e envolve todas as tribos indígenas da Baía de Guanabara e as tribos ligadas a Arariboia, que eram da Ilha do Governador. E se Portugal perde o controle da Baía de Guanabara para outra nação europeia, provavelmente perderia todo o Sul do Brasil. O Brasil não seria o que é hoje", revela Rafael.

A relação com os portugueses, porém, esteve longe de ser apenas comercial. Catequisado pelos padres jesuítas, o indígena chegou a se converter ao cristianismo e era tratado como um cristão exemplar pelos próprios colonizadores. Chegou ser batizado com o nome de Martim Afonso de Sousa, mas isso não significava subserviência. Quando necessário, Arariboia foi cobrar pessoalmente o governador Mem de Sá pelo pedaço de terra que lhe fora prometido.
Livro resgata trajetória de Arariboia

Livro resgata trajetória de Arariboia

Obra revive história do líder indígena que marcou a história do Rio e de Niterói

PAUTA ESPECIAL - Será lançado um livro sobre o indígena Araribóia. Na foto: Estátua do Araribóia em Niterói. Pedro Ivo/ Agência O Dia

Rio - No terminal das barcas e na grande estátua na praça batizada com seu nome, moradores de Niterói e visitantes "esbarram" diariamente com referências a Arariboia. Muitos, no entanto, desconhecem a trajetória do líder indígena que marcou a história do Rio e da Cidade Sorriso. No ano em que Niterói completa 450 anos, um livro recém-lançado resgata a memória de seu fundador.
Herói para uns, traidor para outros, Arariboia (cobra arara, em tupi) é indiscutivelmente um dos personagens mais importantes para a formação da sociedade fluminense após a chegada dos portugueses. Atuou em guerras, negociou com europeus e foi o primeiro e único indígena a fundar uma cidade no país. Sua rica trajetória é tema da biografia "Arariboia – O Indígena que Mudou a História do Brasil" (editora Bazar do Tempo), do jornalista Rafael Freitas da Silva.
Embora Niterói seja um dos raros locais onde a história do líder temiminó é devidamente reconhecida, sua relação com a cidade foi apenas um dos capítulos finais de uma vida repleta de conquistas. A atuação na batalha contra a invasão francesa ao Rio de Janeiro, em 1567, foi determinante para manter o território sob domínio de Portugal, então aliado de sua tribo, graças ao conhecimento da Baía de Guanabara e seus arredores.
Além disso, travou duelos com outras tribos que resistiam à colonização. Foi por isso que convenceu Mem de Sá, então governador-geral do Brasil, a cedê-lo um generoso pedaço de terra do outro lado da Baía de Guanabara, dando origem à Cidade Sorriso.
"Sem ele, não seria possível Portugal fundar a cidade do Rio. Quem fala isso são os próprios portugueses, que sempre louvaram o papel de Arariboia na conquista do Rio de Janeiro. Na fundação do Rio, acontece realmente uma resistência muito grande dos indígenas que habitavam a Baía de Guanabara, que se organizam para impedir que os portugueses tomassem posse da terra que era deles. Então, há uma resistência muito grande, uma guerra que dura 30 anos e envolve todas as tribos indígenas da Baía de Guanabara e as tribos ligadas a Arariboia, que eram da Ilha do Governador. E se Portugal perde o controle da Baía de Guanabara para outra nação europeia, provavelmente perderia todo o Sul do Brasil. O Brasil não seria o que é hoje", revela Rafael.

A relação com os portugueses, porém, esteve longe de ser apenas comercial. Catequisado pelos padres jesuítas, o indígena chegou a se converter ao cristianismo e era tratado como um cristão exemplar pelos próprios colonizadores. Chegou ser batizado com o nome de Martim Afonso de Sousa, mas isso não significava subserviência. Quando necessário, Arariboia foi cobrar pessoalmente o governador Mem de Sá pelo pedaço de terra que lhe fora prometido.
É justamente essa proximidade com os colonizadores que fez Arariboia ganhar fama negativa entre outros indígenas, sobretudo rivais. Mas é fato que, por seus meios, o cacique conseguiu garantir uma vida tranquila para si e sua tribo enquanto esteve em vida. Enquanto grande parte dos povos originários ainda era escravizado pelos portugueses em sua própria terra, os temiminós conseguiam viver com dignidade e desenvolver até mesmo uma relação de trabalho ao proteger a Baía de Guanabara. Rafael Freitas da Silva, inclusive, não concorda com as críticas severas à atuação do cacique ao lado dos portugueses.
"A gente não pode querer interpretar uma história que aconteceu há 500 anos como se fosse hoje. Naquele momento, Arariboia lutava por si, pelos seus, pela sua tribo. Ele não poderia imaginar todo o processo capitalista, colonial, o capitalismo moderno que resultou numa ampla degradação da terra, de exploração que a gente vive até hoje e que é resultado de todo esse processo. Mas, dentro da história, o Arariboia é um ator que lutou por sua própria dignidade", diz o autor.
Para além das homenagens, o legado dos temiminós e de outras tribos que pisaram onde hoje é Niterói está em quase toda parte, principalmente no nome dos bairros, muitos ainda herdados da denominação em tupi, como Icaraí, Itacoatiara, Pendotiba, Jurujuba e Camboinhas. O próprio nome da cidade significa "águas escondidas" na língua dos povos originários. Quase 450 anos depois da fundação, em novembro de 1573, a presença dos indígenas na região, graças a Arariboia, foi fundamental para resquícios do passado façam parte do cotidiano dos niteroienses.
"Como legado, ele deixa esse processo que vai resultar no povo brasileiro: a miscigenação, a inclusão, esse caldo genético brasileiro. Hoje em dia, várias famílias de Niterói, as mais antigas, são ligadas a Arariboia. Há quem diga ser parente de Arariboia, as pessoas sabem. Então ele deixa como legado essa formação do povo brasileiro. A gente deve a Arariboia a permanência do nome da nossa terra, das coisas como elas são", explica Rafael, que escreveu também "O Rio Antes do Rio", obra que inspirou o enredo da Portela de 2020, "Guajupiá, Terra Sem Males".

Cristão, mas nem tanto
Ao passo em que agradava os jesuítas por ter se convertido ao cristianismo, Arariboia não abandonou completamente os hábitos da sua tribo. Muito pelo contrário. Embora seu conhecimento bíblico fosse até mesmo exaltado por portugueses e considerado superior ao de muitos colonizadores, algumas passagens estudadas por Rafael evidenciam que ele manteve boa parte de suas crenças e costumes, entre eles a poligamia, que gerou conflito com padres. Alguns deles queriam exigir o casamento entre as mulheres e os indígenas, que se recusaram e foram protestar com o governador-geral com armas em punho. O embate ajudou os temiminós a irem definitivamente para Niterói.
"Eles eram um braço militar do governo, então ninguém mexia com eles. E quando os jesuítas resolveram mexer, eles foram reclamar. Do meu ponto de vista, histórico, a partir desse momento que é feito o auto de posse do Arariboia, como um ato de precaução dos brancos por medo de não terem o Arariboia por perto e ser novamente ameaçado. A partir de então, os padres ficavam no Rio de Janeiro e o Arariboia, em Niterói", conta o jornalista.
Rafael posa com livro sobre a história do indígena - Arquivo pessoal
Rafael posa com livro sobre a história do indígenaArquivo pessoal

Celebração em vida e a morte
Ainda em vida, as glórias de Arariboia já eram celebradas no Rio de Janeiro por indígenas e portugueses, com direito a desfiles de canoas com a presença do próprio cacique, que era, por sinal, um exímio nadador. Por séculos, a tradição se manteve para lembrar a vitória na Batalha das Canoas, contra os tamoios, em 1566.
Sua morte aconteceu em 1589, aos 70 anos, idade extraordinária para a expectativa de vida da época. A notícia foi dada ao reino de Portugal em uma carta, que era enviada anualmente para comunicar as novidades. Em versões não oficiais, existem alegações de que ele teria morrido afogado no mesmo ano, mas não passa de um boato. No documento, consta que Arariboia faleceu acamado durante uma epidemia da época, provavelmente de varíola. 
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