Maria Eugênia começou fazendo bazar de suas próprias roupas e abriu seu brechó em 2017, em CopacabanaPedro Ivo / Agência O DIA
Maria Eugênia contou ao DIA que sempre trabalhou com comércio porque não estava satisfeita com a sua área. Ela aproveitou para fazer um curso de design de moda e passou a organizar eventos de bazar com as suas amigas. Tudo começou dentro de seu apartamento, apenas para pessoas conhecidas, até que tomou uma proporção maior. "Eu comecei a fazer no play da minha mãe porque estava vindo muita gente, de outros nichos, amigos de amigos, pessoas que eu nem conhecia".
Quando concluiu o seu curso, ela decidiu empreender, abrindo um brechó em Copacabana, Zona Sul do Rio de Janeiro. "Eu não queria mais trabalhar para grandes marcas, então preferi abrir um pequeno negócio. No começo fui atrás de conhecidos para pegar roupas e ter peças na loja, e com o tempo fui fazendo público, conhecendo gente e garimpando. Hoje estou aqui há cinco anos", disse.
Segundo Maria Eugênia, o início não foi fácil. Nem todos os clientes eram adeptos ao segmento e ainda havia muito preconceito entre o público consumudor. "Muitos entravam na loja e me perguntavam se era roupa usada, faziam cara de nojo. Essa pergunta ainda existe hoje em dia, mas muito menos. Quando as pessoas percebem que é brechó, elas amam. A reação agora é muito mais positiva do que antigamente. Acredito que seja por mil fatores, como a conscientização de que precisamos urgentemente mudar nossa forma de consumo buscando vias sustentáveis. Também tem gente que vem por causa da crise, porque gostam de tal marca e não tem mais como comprar direto na loja. Enfim, os preços abusivos acabam fazendo a procura ser maior".
Ela também afirmou que a procura pelo estilo mais vintage é, principalmente, por causa da história. Para quem vende, é uma fonte de renda extra. Para quem compra, é uma oportunidade de consumir com consciência e responsabilidade, a preços mais acessíveis. "Peças de família ou encontradas em brechós especializados em vintage possuem um valor sentimental que é atemporal. Isso não quer dizer que o estilo se relaciona com roupas baratas ou sem qualidade. Para quem empreende nesse mercado, é necessário ser muito criterioso com as peças que serão compradas e vendidas para operar de forma segura".
O costume de comprar em lojas de shopping mudou. A publicitária Luiza Dupim, 29, prefere adquirir roupas de segunda mão de conhecidos ou até mesmo de brechó, seja pelo estilo ou pelo preço. "Eu prefiro comprar dessa forma do que em lojas ou sites. Primeiramente por causa do preço, porque são sempre roupas mais baratas e, segundo, por me identificar com o estilo. Quando eu compro de amigos, eu já conheço o corpo da pessoa, sei como fica e sei que vai combinar comigo. Acho uma compra mais certeira, melhor do que ficar procurando algo que pareça comigo. Além disso, penso na questão da sustentabilidade, a indústria da moda contribui muito para o excesso de lixo e para o desperdício também, usando trabalho escravo para produção das peças", explicou.
Para a comerciante Flávia Millar, 61, o preconceito com o brechó ainda é um obstáculo. "Ainda há certa resistência de presentear terceiros, por exemplo, visto que a maioria dos estabelecimentos não efetua troca ou porque não se sentem tão seguros de como a presenteada receberá a peça. Muitos ainda preferem as roupas com etiquetas, que são novas e nunca foram usadas".
O coordenador do MBA em Gestão Financeira da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Rio), Ricardo Teixeira, explicou que o Brasil não tem o hábito de fazer compras em lojas de artigos de segunda mão porque as pessoas acham que são produtos desgastados, velhos, sem uso. "Há três aspectos para se observar: os produtos de bazar não necessariamente são muito usados, alguns são até novos, com etiquetas; a moda hoje é o indivíduo que faz e dá para economizar comprando em brechó".
Bazar online
Além das lojas físicas, há também os brechós online, criados através de perfis nas redes sociais. Lá, o empreendedor tira fotos da roupa, informa o tamanho, às vezes até prova a peça para mostrar o caimento, e publica. É o caso do bazar Vendinhas da Taty, da administradora Tatiana Jardim Varela, 41, feito em um ambiente totalmente virtual, com mais de quatro mil seguidores no Instagram. Tatiana começou o negócio de forma despretensiosa, mas decidiu mergulhar de cabeça quando seu marido perdeu um de seus empregos.
"Eu comecei vendendo roupas do meu filho porque via que elas eram pouco usadas e achava um pecado jogá-las fora ou não aproveitar. Mas, eu também gostava de comprar peças caras, de grife, em bazar. Eu amava esse universo já. Fui tomando mais gosto pela moda sustentável e, quando meu marido perdeu um de seus trabalhos, eu precisei realmente fazer disso uma segunda renda. Foi quando investi e passei a levar mais a sério, até que o negócio foi crescendo e quando vi já estava com 200 fornecedores que foram me indicando e me ajudando", contou
Segundo Tatiana, a procura aumentou muito neste período de Natal. "Muita gente comprando pela primeira vez também em brechó. Essa ideia peça fedorenta, velha ou rasgada, está sendo desmistificada. Tenho clientes comprando até mesmo para dar de presente, ou para usar nas festas de fim de ano. Quando me falam que é para presente eu até faço um embrulho diferenciado".
Depois de ficar quatro meses na Bahia, a designer Isabela Carvalho, 26, voltou com o objetivo de fazer uma geral no seu armário. A partir de então, teve a ideia de criar um bazar online, para desapegar das roupas. "Quando eu voltei de viagem, sentia que não me identificava mais com as coisas que eu tinha. Então, fiz uma geral. Normalmente, coloco para doação, mas dessa vez eu quis fazer um desapego. Fiquei com medo no início, mas aí minha amiga também estava com algumas peças separadas, aproveitamos e criamos um perfil para o nosso negócio. Como sou designer, eu fiz a logo, a identidade visual, pensei no nome, tudo direito. Até que lançamos e foi fluindo, o pessoal foi comprando. Teve até um pai que comprou cinco roupas para a sua filha, achamos um gesto muito legal".
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