Cleide Canellas participando a oficina de artesanato Projeto Menina-MoçaMauro Touguinhó

Rio - A camareira Cleide Canellas, de 46 anos, já viveu dias melhores. Moradora do Rio Comprido, ela tinha trabalho, namorado e um lar, mas tudo mudou de uma hora pra outra. Terminou o relacionamento, perdeu a avó e ficou desempregada. Sem assistência e com depressão, mal tinha forças para comer e tomar banho. Até ser encaminhada para o projeto Menina-Moça, Mulher, iniciativa do Instituto Carlos Chagas que atende mulheres em situação de rua na cidade do Rio de Janeiro.
"Eu nunca tinha recebido esse tipo de atendimento. Quando terminei o namoro, fiquei meses largada, engatinhava para tomar banho e não queria comer. Depois que a minha avó morreu então, fiquei pior ainda. Hoje eu estou bem melhor, tenho até namorado e estou procurando trabalho", diz.
De acordo com o último Censo, do ano de 2020, cerca de 7.200 pessoas vivem em situação de rua na capital fluminense. A Cleide, que hoje mora em abrigo, foi uma das mais de 450 atendidas pelo programa, que, desde agosto de 2022, promove ações de intervenção e prevenção e acolhe, além de ouvir e suprir as principais necessidades de jovens a partir de 12 anos, adolescentes e mulheres adultas.
"Embora existam diversas estruturas governamentais, não existia esse espaço de atendimento voltado para a população feminina em situação de vulnerabilidade. E muitas delas não frequentam UPAs ou Clínicas da Família, então criamos um trabalho formativo, que não dá o peixe, mas ensina a pescar. Nós as reintegramos á sociedade", afirma o cirurgião plástico Ricardo Cavalcanti Ribeiro, presidente do Instituto e um dos idealizadores da iniciativa.
Entre as mulheres atendidas estão profissionais do sexo, vítimas de abuso sexual e todas as que tenham dificuldade no acesso ao sistema de saúde e precisem de atendimento especializado. O instituto promove ações ligadas a direitos sexuais e reprodutivos, oferece apoio jurídico e cursos e palestras de capacitação para a geração de trabalho e renda, além de atendimento médico clínico, ginecológico e psicológico.
Projeto conta com estrutura e equipe multidisciplinar
A sede do projeto, na Lapa, conta com salas voltadas para atendimento médico, além de auditório. As mulheres podem requerer documentos como RG, carteira de trabalho e outros tipos de processos. No campo da prevenção são desenvolvidas ações de educação em saúde, direitos reprodutivos e sexuais, acesso aos métodos contraceptivos e preservativos, serviços de contracepção e planejamento familiar e cuidado com os filhos.

"O nosso diferencial é oferecer uma equipe multidisciplinar qualificada para acolher as mulheres e construir um programa de acompanhamento integral", conta a assistente social da equipe, Bianca Capelli.

O transexual Jander Silva, 42 anos, que também vive em um abrigo na Região Central do Rio, já está colhendo os resultados do atendimento. Enquanto aguarda a fila do Sisreg para passar pelo processo de mudança de sexo (feito por outro instituto), foi muito bem recebido e frequenta as atividades com a esperança de dias melhores.

"Eu vim atrás de atendimento psicológico porque fiquei desempregado durante a pandemia. Fora que eu sofro muito bullyng por ser transexual. Eu cheguei aqui deprimido, mas depois que eu comecei a participar das rodas de conversa e oficinas, me sinto alegre", disse o auxiliar de cozinha, que também está em busca de trabalho.
Ao todo já foram feitos no projeto Menina-Moça, Mulher mais de 300 consultas, 70 testes de prevenção de câncer de colo de útero e detecção de HIV, quase 400 atendimentos psicológicos, de assistência social e jurídicos, além de 80 oficinas de capacitação, empregabilidade e sensibilização. O Instituto Carlos Chagas atende na Avenida Mem de Sá, 254, Lapa, de segunda a sexta, das 8h às 18h. A casa também funciona em parceria com órgãos públicos.