Cais do Valongo, declarado patrimônio da humanidade pela Unesco em 2017Pedro Ivo/ Agência O Dia
"O sítio arqueológico não está em risco iminente, mas como é um espaço aberto, e está abaixo do nível do mar, sofre com as intempéries, como alagamentos, o que provoca o deslocamento de pedras e pode descaracterizar o local. Nos últimos anos, o Estado brasileiro virou as costas para o espaço. Agora, esperamos avançar com as obrigações da Unesco", afirma o procurador da República Sergio Suiama.
Dentre as exigências estão a instalação de um comitê gestor com participação da sociedade civil, constante limpeza e manutenção do sítio e a criação do Centro de Interpretação do Sítio Arqueológico, do Memorial da Herança Africana no Brasil e do Laboratório Aberto de Arqueologia Urbana (Laau). Esses equipamentos, explica Suiama, devem ser instalados no Galpão Docas Pedro II, que fica em frente ao Cais do Valongo, e é também um espaço de memória. Erguido na década de 1870 pelo engenheiro negro André Rebouças, não utilizou mão de obra escravizada em sua construção.
"O galpão é um símbolo de superação dos negros em relação à escravidão", diz Suiama.
O galpão hoje está sob responsabilidade da Fundação Palmares, e guarda, em caixas acondicionadas em contêineres, o acervo de 1,3 milhão de peças históricas encontradas nas escavações das obras do Porto Maravilha. O espaço sofre com problemas de infraestrutura, como rachaduras, falta de energia elétrica e goteiras, além de pichações nos tijolos originais da área externa.
Já em relação ao Cais do Valongo, a falta de sinalização e conservação adequada, além iluminação própria e explicações mais detalhadas sobre o local, também são um problema.
"Eu sei da importância do local, mas não em profundidade, e desconheço ainda mais a história do galpão. Não há quase explicação por aqui. Essa região deveria ser mais valorizada pelo poder público, inclusive em relação ao turismo, mas sinto que há uma certa anestesia cultural por aqui", diz o estudante de artes Jonatas Moreira, de 23 anos, que visitava a região, na última quinta-feira, para tirar fotos.
Para o estudante Tarcísio Oliveira, de 25 anos, que passava pela região com colegas da faculdade de serviço social da Uerj, a falta de atenção para a região significa um apagamento da memória dos negros no Brasil:
"Eu vejo isso como um projeto proposital para que nossa herança afro-brasileira fique velada, escondida".
Já o turista francês Antoine Seignez, de 35 anos, que visita o Rio pela segunda vez, fez uma comparação com seu país de origem:
"Na França, tem placas por todos os locais. Às vezes até mesmo supervalorizando os espaços, tornando-os mais importantes do que realmente são".
Acervo exposto no Muhcab
Parte do acervo de peças históricas acondicionadas no Galpão Docas Pedro II está em exposição no Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira (Muhcab), na Rua Pedro Ernesto, na Gamboa. São relíquias como figas de madeira e osso, brincos, anéis de piaçava, cachimbos e miçangas.
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