Alessandra dos Santos Silva acredita em erro médico e pediu por justiçaCléber Mendes/Agência O Dia

Rio - A passista e trancista Alessandra dos Santos Silva, de 35 anos, recebeu "altas doses" de aminas vasoativas, que provocam o estreitamento dos vasos sanguíneos para manter a pressão arterial, após a histerectomia a qual foi submetida no Hospital da Mulher Heloneida Studart, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (26) pela Secretaria de Estado de Saúde (SES). A paciente se internou na unidade de saúde para uma cirurgia de retirada de miomas, mas uma série de complicações levou à amputação de parte do braço esquerdo. 
De acordo com a SES, o primeiro atendimento de Alessandra ocorreu na emergência do hospital, em julho de 2020, quando ela fez uma ultrassonografia que constatou o quadro de miomatose uterina múltipla e, na ocasião, ela foi encaminhada para o acompanhamento do ambulatório de ginecologia. Em novembro de 2022, foi indicada a cirurgia de retirada de 17 miomas e, no mês seguinte, a passista passou por consulta e exames para risco cirúrgico e chegou a realizar uma transfusão sanguínea devido ao quadro de anemia causado pelos tumores. 
Em 2 de fevereiro deste ano, a trancista se internou no Hospital da Mulher e foi feita uma nova transfusão sanguínea pré-operatória. A paciente também precisou assinar um termo de consentimento, depois que a equipe médica esclareceu sobre a complexidade do procedimento. A cirurgia teve início às 14h do dia seguinte, e a retirada dos miomas preservava o útero, ovários e trompas, para respeitar o desejo de Alessandra de engravidar. 
No início da madrugada do dia 4, as primeiras complicações clínicas apareceram e, segundo a pasta, à 0h10, a passista foi submetida a um novo procedimento para conter um sangramento no local da cirurgia e acabou fazendo uma histerectomia, que é a retirada do útero. Após a operação, a mulher foi internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para continuidade do tratamento do choque hemorrágico, quando foram administradas altas doses de aminas vasoativas. 
Segundo a Secretaria, "um dos possíveis efeitos adversos desta medicação é a oclusão vaso arterial, que leva à redução do fluxo sanguíneo, podendo levar à necrose das extremidades do corpo". Às 14h do mesmo dia, ela passou pelo terceiro procedimento para investigação de um possível novo sangramento, em função da piora clínica do quadro, com hipotensão grave. Após a cirurgia, a passista voltou para UTI em estado grave. 
No dia 5, foi observado que as extremidades do corpo de Alessandra estavam frias e arroxeadas, momento em que equipe enfaixou os membros da paciente para melhorar a circulação sanguínea. Também foi realizado um doppler (ultrassom que mede a quantidade de fluxo sanguíneo através das artérias e veias) que constatou obstrução arterial no braço esquerdo. Ela foi estabilizada e transferida para o Instituto Estadual de Cardiologia (Iecac), em Botafogo, na Zona Sul do Rio, que é referência em cirurgias cardiológicas e vasculares.
A nota da SES afirma que a gravidade do quadro de saúde e a transferência foram informados para a família da trancista. No Iecac, em 6 de fevereiro, ela passou por mais um procedimento, dessa vez para desobstrução das artérias. Em seguida, ela foi levada para o Centro de Terapia Intensiva (CTI) em estado grave, tendo evoluído para insuficiência hepática e renal e distúrbio de coagulação grave. No dia 10, com ela ainda com quadro grave e sedada, parentes foram comunicados de que a amputação parcial do membro superior esquerdo era necessária "a fim de preservar a vida de Alessandra". 
Os pais da mulher assinaram um termo de consentimento e ela então foi submetida à quinta cirurgia, para amputação. Depois do procedimento, seguiu sendo acompanhada no CTI, com melhora progressiva até a alta hospitalar, em 16 de fevereiro. Na mesma data, ela foi orientada e seus pais contatados para retornar para acompanhamento no ambulatório de ginecologia no Hospital da Mulher de São João de Meriti. 

"A Fundação Saúde se solidariza com a paciente e sua família e ressalta que Alessandra foi atendida durante todo seu período de internação por especialistas e tendo acesso aos tratamentos e medicamentos necessários para a preservação da sua vida", completou a pasta. De acordo com a SES, a entidade pública instaurou uma sindicância para apurar toda a conduta médica e administrativa nas duas unidades de saúde. O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio (Cremerj) também vai apurar os fatos. 
Médico cita 'problema vascular' em depoimento
Em depoimento na 64ª DP (São João de Meriti), nesta terça-feira (25), o cirurgião Gustavo Machado, que participou da operação de retirada de miomas e histerectomia de Alessandra, citou um problema vascular da paciente após os procedimentos, que podem ter levado à amputação do braço esquerdo. O médico explicou detalhadamente o procedimento realizado no Hospital da Mulher e ressaltou que a decisão pela amputação do membro foi da equipe do Iecac. 
"Primeiro uma retirada de miomas (19 com 2,5kg) ao final o quadro agravou para uma hemorragia interna e uma nova cirurgia culminou com a histerectomia. Depois identificou-se um problema vascular, levando a transferência para novo hospital especializado neste tipo de tratamento. Nesse novo hospital optou-se pela retirada do membro", disse o delegado Bruno Enrique de Abreu Menezes, titular da distrital, após a oitiva. 
Além do cirurgião, outros dois médicos também procuraram a distrital para se colocar à disposição dos investigadores. O prontuário médico de Alessandra do Hospital da Mulher foi recebido na 64ª DP e encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) para exames periciais. Segundo o delegado, a passista já foi ouvida e os próximos depoimentos devem acontecer nesta quinta (27) e sexta-feira (28). 
Passista diz não ter dúvidas de erro médico
passista afirmou não ter dúvidas que o seu caso se trata de um erro médico por parte do Hospital da Mulher. "Só espero que a justiça seja feita", pediu. A mãe de Alessandra, Ana Maria, também disse estar indignada com as insinuações de que a responsabilidade pela amputação do membro da filha tenha sido do Iecac. "Os profissionais do Hospital da Mulher em momento nenhum conversaram com a gente, ainda querem jogar a culpa para o hospital que salvou a vida dela", disse.