Cerca de 80% dos réus absolvidos por reconhecimento fotográfico passaram mais de um ano na prisão Divulgação

Rio - O governo do estado sancionou a lei que determina que a prisão de investigados deve ser feita mediante a indícios de autoria e materialidade, e não apenas por reconhecimento fotográfico. A medida foi publicada no Diário Oficial nesta quinta-feira (19).

O projeto, de autoria dos deputados Carlos Minc (PSB) e Luiz Paulo (PSD), foi aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado (Alerj) em 21 de setembro.

De acordo com a medida, a identificação do suspeito poderá ser feita através de cruzamentos de dados fornecidos por operadoras de telefonia e dados telemáticos, pela verificação do cadastro funcional do investigado para comparar o horário de trabalho/ocupação com a ocorrência, além de entrevista prévia com a vítima ou testemunha para a descrição da pessoa investigada ou processada.

"A inclusão da pessoa ou de sua fotografia em procedimento de reconhecimento, na condição de investigada ou processada, será embasada em outros indícios de sua participação no delito, como a averiguação de sua presença no dia e local do fato ou outra circunstância relevante", explica um trecho da decisão.

O texto esclarece ainda que em caso de reconhecimento fotográfico, o suspeito deve ser reconhecido pessoalmente ao lado de pessoas com características físicas parecidas.

"No procedimento investigatório de polícia judiciária o reconhecimento fotográfico deverá, em qualquer caso, ser antecedido de descrição física mínima do suspeito e de detalhes que interessem à composição de seu perfil. A pessoa investigada ou processada será apresentada com, no mínimo, outras quatro pessoas não relacionadas ao fato investigado, que atendam igualmente à descrição dada pela vítima ou testemunha às características da pessoa investigada ou processada", diz mais um trecho.

A decisão visa impedir a condenação de inocentes e possibilitar a responsabilização dos culpados. De acordo com a Defensoria Pública do Rio, um levantamento da Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça da instituição apontou que 80% dos réus absolvidos por erros no uso do reconhecimento fotográfico passaram mais de um ano na prisão.
Relembre alguns casos
Diversos casos de pessoas presas por reconhecimento fotográfico foram divulgados pelo O DIA ao longo dos últimos anos.

Em maio deste ano, por exemplo, a Justiça mandou soltar o porteiro Paulo Alberto da Silva Costa, de 36 anos, acusado em 62 ações penais apenas com base no reconhecimento fotográfico. Paulo ficou em Bangu por três anos, por crimes que, segundo a família, não cometeu.

Na decisão, os ministros da Terceira Seção do tribunal votaram, por unanimidade, pela soltura de Paulo ao entenderem que as acusações contra ele foram baseadas em reconhecimento fotográfico falho. A Terceira Seção determinou, ainda, que a decisão seja comunicada à Corregedoria da Polícia Civil do Rio.

No início do mês, o educador social Danillo Félix Vicente de Oliveira, de 27 anos, foi novamente absolvido pela Justiça do Rio, em seu terceiro inquérito, após ser apontado como responsável por um roubo a um casal, em Niterói, Região Metropolitana do Rio, em 2020. A investigação usou um registro fotográfico, incluído no álbum de suspeitos da 76ª DP (Niterói), como forma de culpá-lo pelo crime. Esse foi o terceiro inquérito que o educador respondeu com as mesmas características. Em 2020, Danillo ficou preso preventivamente por 55 dias no Presídio Evaristo de Moraes, em São Cristóvão.

O supervisor Alberto Meireles Santana, um homem negro de 40 anos, sem antecedentes criminais, tentava provar sua inocência desde 2020 após ter prisão preventiva decretada por ser acusado de participação em um assalto à mão armada, em Bangu, na Zona Oeste do Rio, no dia 13 de abril de 2019. Ele foi acusado pela vítima do roubo que afirma ter o reconhecido através da foto 3x4 de sua Carteira Nacional de Habilitação, documento que perdeu na mesma data e ao sofrer, ele também, um assalto no mesmo bairro. Alberto chegou a ficar 20 dias preso e só teve a inocência provada em 2022.

Outro caso foi o do jovem Tiago Vianna Gomes, 28 anos, acusado nove vezes como autor de crimes por reconhecimento fotográfico. As acusações iniciaram em 2018 após um mal entendido dois anos antes. Tiago chegou a ficar preso por 10 meses. Ele teve a foto retirada do livro de suspeitos da 57ª DP (Nilópolis) em 2022 após decisão do Tribunal de Justiça do Rio.

O violoncelista Luiz Carlos Justino foi absolvido em 2021 da acusação de roubo que o levou à prisão em setembro de 2020. O jovem foi preso após ter uma foto sua apresentada em delegacia a uma vítima de roubo, que o reconheceu em 2017. O músico teve a prisão preventiva revogada por uma liminar no plantão judiciário, mas o processo não foi arquivado e apenas em 2021 foi absolvido.