Pai de menina morta pela PRF desabafa após três meses do crime: 'estamos à base de remédios'
Willian da Silva deseja que a Justiça Federal condene e exonere os policiais que participaram da abordagem policial que terminou na morte de Heloisa dos Santos Silva, de 3 anos
Willian Silva, de 28 anos, desabafa sobre os três meses da morte da filha H.S.S - Arquivo/ Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia
Willian Silva, de 28 anos, desabafa sobre os três meses da morte da filha H.S.SArquivo/ Reginaldo Pimenta / Agencia O Dia
Rio - O pai da menina Heloisa dos Santos Silva, de 3 anos, morta durante uma abordagem da Polícia Rodoviária Federal (PRF) há pouco mais de três meses, disse que a família continua vivendo à base de remédios para enfrentar a dor da perda. Ao DIA, Willian da Silva, de 28 anos, pai da criança, disse que a irmã da menina, de 8 anos, ainda não consegue lidar com a ausência da criança.
"Está sendo um dia após o outro, acreditando que haverá o mínimo de responsabilização dos policiais que tiverem essa atitude covarde e cruel que desestabilizou toda a nossa família. Inclusive minha filha de 8 anos, que não está nada bem a cada dia que passa", desabafou Willian.
Na semana passada, a Justiça Federal do Rio recebeu a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra três policiais rodoviários federais pela morte da menina Heloisa, que estava no carro com a família e foi baleada na nuca durante uma abordagem dos agentes no Arco Metropolitano, na altura de Seropédica, no dia 7 de setembro deste ano.
Willian reagiu a mais um avanço no processo e reformou que deseja que os policiais sejam presos e exonerados da corporação. "Achamos que demos um passo, mas não ainda, o que de fato eles merecem, que é a prisão de pena máxima e exoneração dos seus cargos", disse.
Fabiano Menacho Ferreira, Matheus Domicioli Soares Viégas Pinheiro e Wesley Santos da Silva são acusados pelo homicídio consumado e quatro tentativas de homicídio, além do crime de fraude processual. O MPF ainda pede que o caso seja levado a júri popular, por se tratar de crime contra a vida.
Ao receber a denúncia, a Justiça manteve as medidas cautelares já impostas aos réus, entre elas o uso de tornozeleira eletrônica e a proibição de se aproximarem das vítimas.
O que diz a denúncia do MPF
A denúncia detalha o processo de apuração do caso que envolveu depoimentos de familiares da vítima, de testemunhas do fato e dos acusados, além de perícias no veículo, um Peugeot 207 Passion, e nas armas dos agentes. Ao reproduzir o que aconteceu naquela noite, feriado de 7 de setembro, a denúncia descreve que, ao perceber que o carro que dirigia era seguido por uma viatura, o pai de Heloisa, Willian de Souza, resolveu parar o veículo. Ele ligou a seta e dirigiu para acostamento. No entanto, os disparos ocorreram antes mesmo que as rodas travassem, com o carro ainda em movimento.
As armas usadas pelos policiais foram fuzis 5.56 X 45mn, considerados de grosso calibre e longo alcance. Na denúncia, o procurador lembra que essas armas foram projetadas para uso militar, por terem maior velocidade, menor recuo e, consequentemente, por aumentar a letalidade. "Apesar do longo alcance do fuzil utilizado e seu alto poder de fogo, o teor dos depoimentos prestados pelas testemunhas prova que a distância entre atiradores na viatura policial e vítimas não era mais do que vinte metros no momento dos disparos", afirma, frisando que, mesmo portando pistolas no momento da perseguição, os agentes optaram por usar os fuzis.
Em outro trecho do documento, a denúncia destaca o fato de não ter havido nenhuma abordagem ao motorista do veículo pelos policiais. Testemunhas ouvidas durante a investigação afirmaram que "entre o momento em que passaram pela viatura policial e o momento dos tiros, não houve sequer um esboço de comunicação". Para o MPF, o fato evidencia que os agentes da PRF quiseram a morte dos ocupantes do veículo ou, no mínimo, assumiram o risco de que isso acontecesse. "Na realidade, não é minimante crível que, ao cravejar com tiros de 5.56 um veículo tripulado e com carroceria comum, a poucos metros de distância, houvesse outra intenção senão a de matar", pontua o MPF.
Também chama atenção o fato de não ter havido nenhum disparo contra os pneus do veículo, que nem sequer foram trocados para o deslocamento até o hospital para onde seguiu, conduzido por um dos policiais rodoviários e com o pai de Heloisa, como passageiro. "Em outras palavras, não houve a intenção de deter ou advertir", resume a denúncia.
Para a MPF, não há dúvidas de que os três policiais rodoviários federais decidiram "em comunhão de desígnios e por vontade livre e desimpedida" se aproximar do carro e atirar contra o veículo onde estava a vítima. A petição destaca que, em nenhum momento da investigação, foi apontado ter havido discordância entre os agentes quanto à decisão de seguir o carro posteriormente atingido.
A denúncia também rebate o argumento dos policiais de que a perseguição teria sido motivada pela informação de que se tratava de veículo roubado. Conforme o documento, tanto o pai de Heloisa quanto o vendedor do veículo afirmaram desconhecer o registro de roubo, datado de agosto de 2022. Foi comprovado também que Willian Souza pagou valor de mercado pelo carro. Além disso, nos registros do Detran não havia nenhuma restrição em nome do veículo. No entanto, frisa o procurador, "o fato de os ocupantes efetivos do veículo não serem os imaginados criminosos não serve de excludente de criminalidade".
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