Coletiva para entrega oficial do relatório do grupo técnico de trabalho, em Jardim BotânicoCleber Mendes/Agência O Dia

Rio - O conflito judicial de reintegração de posse movido pelo Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) contra os moradores da comunidade do Horto Florestal, no Jardim Botânico, Zona Sul, ganhou um capítulo importante nesta quarta-feira (3). Em um evento que contou com presença do ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Márcio Costa Macêdo, no auditório do Solar da Imperatriz, o Grupo de Trabalho Técnico (GTT) entregou o relatório de regularização fundiária da comunidade, que aponta para a manutenção de mais de 500 famílias no local.
Em entrevista ao DIA, Lirian Abrão tem 53 anos e mora no Horto desde que nasceu. Ela descreveu esta quarta-feira como " um dia histórico". "Essa entrega do relatório nessa solenidade é o término das remoções. É o início de um novo recomeço, sem o fantasma da remoção, que tirava a paz dos idosos. Tem muita gente que já se foi e hoje não pôde ver a nossa vitória. Esse relatório é muito importante e o começo da nossa regularização fundiária. Não tem preço, é a nossa paz. É o lugar onde vivemos e cuidamos. Chegamos ao final de uma luta", comentou. A casa em que Lirian mora começou com bisavô dela e já é pertencente a sexta geração da família.
Criado em maio de 2023, pelo governo federal, o GTT sobre o Horto Florestal realizou estudos técnicos para encontrar soluções conciliatórias e coletivas para as moradias da comunidade próxima ao Jardim Botânico. Após meses de análises, ficou constatado que 541 famílias que vivem nos 11 núcleos da comunidade deverão ter suas moradias mantidas.
"A gente tem que dialogar com justiça. Eu estou muito esperançoso que a partir de agora a gente possa ter um norte para que se tenha uma solução que respeite a questão ambiental e também as pessoas que estão aqui há muito tempo. É o início de um novo processo", comentou Macêdo.
O procurador da República Julio Araujo também esteve presente e reforçou que este é um momento histórico para a comunidade, pois um novo caminho começou a ser traçado, com soluções e acordos para extinguir processos judiciais de reintegração de posse.
"Durante quatro décadas esses moradores sofreram com ações judiciais, pressões e tentativas de reintegração de posse e remoções forçadas. Agora nós estamos tentando criar um novo ambiente para construir uma outra solução" disse ele, que completou: "Esses moradores tem um vínculo histórico com o Jardim Botânico, têm uma relação centenária com esse lugar, removê-los seria uma injustiça. Esse relatório vem nessa linha. Ele é muito claro ao dizer que a comunidade têm esse direito de permanecer neste lugar."
O vice-presidente da associação de moradores do Horto, Felipe Guimarães, comemorou o resultado do estudo: "É um reconhecimento de um patrimônio histórico. A gente costuma dizer que não existe a história do Jardim Botânico sem a história da comunidade do Horto. É uma reparação tardia de um direito que temos, que é o da moradia", disse ao DIA.
Apesar de garantir a manutenção da maioria das residências, cerca de 80 famílias terão de ser ser realocadas para outras regiões. Segundo Felipe, o objetivo da associação de moradores agora será mantê-los em um local próximo a comunidade, para não ser uma mudança brusca para essas pessoas, que moram lá há anos.
"A comunidade do Horto é composta majoritariamente por idosos. Então só de uma pessoa mais velha pensar que terá que sair do lugar onde morou a vida toda é uma tortura psicológica. Então queremos que essas famílias sejam realocadas com dignidade para locais que não sejam distantes", comentou o vice-presidente da associação de moradores do Horto.
As conclusões do relatório entregue nesta quarta são necessárias para avançar na conciliação dos processos de reintegração de posse movidos pelo Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ) contra os moradores da área.
Coordenado pela Secretaria Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas, o grupo de trabalho foi composto por habitantes da comunidade, representantes do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), do Ministério da Cultura e do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico (JBRJ).
Procurado, o Jardim Botânico informou que recebeu o relatório na tarde desta quarta-feira e que analisa o texto para emitir posicionamento. O espaço segue aberto para manifestação.
*Reportagem de Maria Eduarda Volta e do estagiário João Pedro Bellizzi, sob supervisão de Thiago Antunes.