PedeTeresa, jornalista e Comissão de Combate ao Racismo denunciaram o caso de racismoRenan Areias/Agência O Dia
Grupo de samba e jornalista buscam Polícia Civil após denúncia de racismo em evento
'Não pode ser só mais um caso', disse Jackeline Oliveira, que gravou uma argentina e um carioca imitando macacos na Praça Tiradentes
Rio - Representantes do grupo PedeTeresa estiveram na Delegacia de Crimes Racias e Delitos de Intolerância (Decradi), nesta segunda-feira (22), para registrar o caso de racismo cometido por um casal branco em uma roda de samba. O episódio aconteceu na Praça Tiradentes, na última sexta-feira (19), e as cenas da dupla imitando macacos foi registrada pela jornalista Jackeline Oliveira, que também procurou a polícia na manhã de hoje. As vítimas estavam acompanhadas de uma advogada e da presidente da Comissão de Combate ao Racismo da Câmara do Rio, vereadora Monica Cunha (PSOL).
"Isso é só repetição de todos os dias, tomou vulto porque a Jacke conseguiu filmar e conseguiu colocar no digital. Mas, a gente vive isso todo dia, não tem nada de novo. A gente realmente precisa propor ações, ou uma repreensão, que nos faça mudar. A gente precisa mostrar para a sociedade que está mudando, que não pode mais ser assim. Eu me sinto desassistido pelas maiores instituições do Brasil, se não tiver uma transformação", declarou o representante da roda de samba, Wanderso Luna, na chegada à delegacia, que fica na Lapa, Região Central.
Ainda de acordo com Wanderso, o episódio racista poderia ter sido evitado se houvesse mais conscientização da sociedade e ações do poder público. "A gente vive numa sociedade extremamente racista e, se a gente for analisar, é muita energia positiva para não ter dado um problema muito maior, porque imagina, alguém imitando macaco, a gente sabe quanto isso dói na gente, o primeiro que dá um tapa, tem uma multidão, olha só o tamanho do problema que o poder público, a sociedade podem tratar, podem prevenir".
A jornalista que gravou as imagens lembrou que flagrou o casal quando tinha ido beber água e que um grupo estava ao redor da dupla. Inicialmente, ela acreditou que eles estavam dançando, mas percebeu que imitavam macacos e decidiu gravar. "Não acredito que está acontecendo isso aqui, na Praça Tiradentes, num local preto, num quilombo nosso", desabafou Jackeline, que publicou o vídeo em suas redes sociais, mas depois decidiu procurar a Comissão. "Eu não imaginava que teria tanta força, mas a população se mobilizou, porque não pode ser só mais um caso de racismo, tem que ter algum tipo de punição".
Ainda segundo Jackeline, o casal que aparece no vídeo é uma mulher argentina, de Buenos Aires, que estava em um congresso no Rio, e um homem carioca. Para ela, um dos envolvidos ser estrangeiro não diminui a gravidade do caso. "Nada ameniza o racismo, país nenhum, lugar nenhum dá a entender que o racismo é uma coisa boba, uma brincadeira. O homem é do Rio de Janeiro, é brasileiro, está aqui na cidade e vai ser encontrado alguma hora. A mulher, eu não sei se já voltou, sei que ele é argentina e excluiu as redes sociais dela, porque as pessoas encontraram. Mas, ela também não vai sumir, a gente vai continuar buscando e espero que a polícia faça o trabalho deles".
A vereadora Monica Cunha lembrou que a Comissão de Combate ao Racismo foi criada no ano passado e se tornou permanente este ano, por conta dos frequentes episódios de racismo no Rio. "A gente tem que entender que o racismo é crime e já tem uma lei. A tranquilidade de achar que não vai ser criminalizado, que não vai dar em nada, a gente está cansado", afirmou a parlamentar.
Para Wanderso, além de punições mais severas é preciso criar espaços onde pessoas pretas possam se sentir seguras, em especial aqueles relacionados à cultura, como as rodas de samba. Ele defendeu que a Praça Tiradentes, no Centro do Rio, onde o ataque racista aconteceu, se torne um símbolo do combate ao racismo e preservação cultural, por ser um espaço historicamente ocupado pelos negros. O representante defendeu ainda que a estátua de Dom Pedro I seja retirada do local e levada para um museu.
"A Praça Tiradentes, há dois séculos atrás e até meados do século XIX, era um espaço nosso, a gente não tinha direito a ter casa e veio para rua se reiventar. Em 2016, a gente retomou esse lugar com o samba e como um espaço nosso, de preservar nossos hábitos, nossos costumes, nossas questões culturais, porque quando se colocou (a estátua de) Dom Pedro lá, nosso povo foi retirado (...) Tira essa estátua de lá, vamos criar um espaço que as pessoas realmente consigam se sentir seguras, porque ali é um lugar que para a gente, que é preto, o samba tem que ser visto para entretenimento, o samba é uma ferramenta nossa de posicionamento", disse Wanderso.
Segundo a Polícia Civil, testemunhas estão sendo ouvidas e diligências estão em andamento para identificar e intimar os autores para prestarem esclarecimentos na delegacia.
*Colaborou Renan Areias
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