Quem pensa que a Internet, os e-books, e as redes sociais já conseguiram substituir o livro físico pode estar errado. São outras formas de estar sempre perto das letrinhas, mas as páginas que muitos ainda gostam de folhear continuam fazendo sucesso. No mês de setembro acontecem, nos dias 26 e 27, a II Feira Literária de Queimados, e em 21 aconteceu a I Festa Literária de Anchieta. De 4 a 8 de setembro houve a VII FLIM (Feira Literária de Mambucaba), em Angra dos Reis. Sem falar na tradicional Flip, em Paraty, que aconteceu em outubro, e na Flirena, em novembro, quando acontecerá a VI edição do Festival Literário de São Gonçalo - FLISGO.
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A II Feira Literária de Queimados (FLIQ), no Ginásio Municipal Metodista, das 9h às 17h, presta homenagem ao autor Júlio Emilio Braz. Escritores como Fernando Molica, Tania Malheiros, Bruno Black estão entre as atrações do evento, cujo foco principal é fomentar a leitura e o conhecimento. Mineiro da cidade de Manhumifim aos pés da Serra de Caparaô, Minas Gerais, Júlio Braz mudou-se aos cinco anos para o Rio de Janeiro, cidade que adotou como lar. Considerado autodidata por aprender as coisas com extrema facilidade, adquiriu o hábito da leitura aos seis anos e iniciou sua carreira como escritor de roteiros para histórias em quadrinhos publicadas no Brasil e em outros países, como Portugal, Bélgica, França, Cuba e Estados Unidos.
Com 150 títulos publicados, o autor recebeu, em 1988, o Prêmio Jabuti pela publicação de seu primeiro livro infantojuvenil: Saguairu. Dois anos mais tarde, escreveu roteiros para o programa Os Trapalhões, da TV Globo, além de algumas mininovelas para uma emissora de televisão do Paraguai. Em 1997, ganhou o Austrian Children Book Award, na Áustria, pela versão alemã do livro Crianças na escuridão (Kinder im Dulkern), e o Blue Cobra Award, no Swiss Institute for Children’s Book.
A II Feira Literária de Queimados idealizada pela Prefeitura, será um grande evento literário da Baixada Fluminense e terá a participação de escritores e escritoras locais renomados, além de ilustres convidados como o escritor e jornalista Fernando Molica, autor de nove livros, entre eles, seis romances – o mais recente Elefantes no céu de Piedade(Patuá, 2021), semifinalista do Prêmio Oceanos. Dois de seus livros – Notícias do Mirandão (Record) e Bandeira negra, amor (Objetiva) – foram lançados na Alemanha e na França. Foi duas vezes finalista do Prêmio Jabuti. Tem contos publicados nas antologias O livro branco (Record) e Dicionário amoroso da língua portuguesa (Casa da Palavra), entre outros.
Tania Malheiros, jornalista, ganhou o Prêmio Esso da categoria Informação Cientifica, Tecnológica e Ecológica, participou de vários eventos sobre a questão nuclear no Brasil; Bruno Black que é poeta, escritor infantil, produtor cultural, agente literário, educador social e ativista sociocultural; Allan Pevirguladez - Autor do livro O meu cabelo é bem bonito; Ricardo - Professor , escritor e pesquisador em alfabetização e criou a Pedagogia de Favelas; Valdecir Boareto - O gari e escritor do município do Rio de Janeiro, foi escolhido para palestrar sobre saneamento básico e a importância da sua função na sociedade, no Consulado Brasileiro em Boston.
Edwilson Andrade - Tem ascendência indígena Purí é autor dos livros "De que cor é a minha Puri?" e "As marcas de Fezinha". Suas obras buscam ancestralidade, de uma forma poética.
A Feira vai contar também com o Coletivo Mulheres do Ler que promove a publicação de novas autoras a cada ano, alcançando, inclusive, autoras em outros estados do Brasil e na Suíça, além de palestras, contação de histórias e estandes com exposição de livros. "Será uma Feira Literária com diversidade para fomentar a leitura e o conhecimento. O único caminho para o futuro é com a aprendizagem e o melhor professor é a leitura", disse o prefeito Glauco Kaizer. O Ginásio Metodista fica na Rua Vereador Marinho Hemetério Oliveira, 1180.
Prêmio Professora Nilcéia
Assim como em Queimados, os organizadores da FLIAN (Festa Literária de Anchieta) homenageram o autor Júlio Emilio Braz. A Primeira edição aconteceu no dia 21 de setembro de 2024, na Praça Nazaré. O objetivo foi promover a leitura, valorizar escritores locais e estimular o hábito de ler em todas as idades. Houve a participação das escritoras Silvia Castro e Arlene Costa. Um dos destaques do evento é o concurso de redação, que premia o vencedor com o Prêmio Professora Nilcéia, incentivando novos talentos literários na região. A realização da FLiAN é possível graças ao apoio do Instituto Ciclos Brasil e da Biblioteca A Casa Amarela, instituições comprometidas com a disseminação do conhecimento e o incentivo à leitura.
Uma das organizadoras do evento, Lucia Lino, de 59 anos, conta que a realização da Festa Literária é um sonho que começou há mais de 10 anos. "Tínhamos o projeto chamado Compartilhando Histórias na Praça Granito. Depois de tanto tempo, o sonho desencantou. Obedecendo um pouco a nomenclatura das outras, que Paraty, Santa Teresa, não estão se falando mais em feira, e sim em festa, pois dá a ideia de você unir pessoas em torno de um objetivo e o nosso é a literatura".
Em sua sétima edição, a FLIM – Feira Literária de Mambucaba, em Angra dos Reis, teve a presença do poeta Mano Mello, da atriz Elisa Lucinda e de Bia Bedran e homenageou a escritora Carolina Maria de Jesus, a mais votada pelo público por meio da Internet. Concorreram nomes como Adélia Prado, Cecília Meireles, Maria Clara Machado e Ruth Rocha. Coordenador do evento, Carlos Rogério Lopes de Souza, de 60 anos, mais conhecido como Cagério, fala da importância do evento para o enriquecimento cultural e turístico.
"Morei algum tempo em Ribeirão Preto (SP) e em 2015 voltei para Angra dos Reis, um ano depois estava em Mambucaba. Percebi que não tinha nada e resolvi criar o Calendário Cultural. Tínhamos 28 atividades, mas a FLIM é uma das que mais fazem sucesso. Neste ano foram mais de seis mil pessoas visitando a feira.", conta Cagerio, que é professor de música, de Educação Física e apaixonado por cultura.
Literatura afro-brasileira
A Feira Literária do Renascença, no Andaraí, já está na sua quarta edição e deverá acontecer em novembro ainda sem data definida. De acordo com o coordenador João Martins, a ideia é trabalhar com a literatura afro-brasileira e africana. "Na feira acontecem lançamentos de livros de autores negros, falando sobre a cultura afro-brasileira e africana, literatura, e também alguns escritores não negros, que escrevem sobre a temática. O nosso foco é esse, trazer o lançamento e o relançamento. E também trabalhamos junto com as escolas estaduais e municipais do território, trazendo os alunos para... conhecer a nossa literatura afro-brasileira e africana".
Para João, esse evento é de suma importância. "Na vida do afrodescendente faz muita diferença, porque ele passa a conhecer a história e toda a literatura que traz a cultura da sua origem, da sua ancestralidade. Então, isso é muito importante, passando desde as escolas fundamentais do ensino médio e as nossas parcerias com as universidades da região também, a UERJ, a UFRJ, a UNIRIO. E, basicamente, esse ano a gente ainda não tem a programação ainda, pois estamos aguardando recursos e estamos num processo de reforma do espaço".
O livro como companhia
A atriz e escritora Ayala Rossana, de 50 anos, participou da FLIM com o seu primeiro livro infantil Macartelo, o macaquinho sem rabo e amarelo. Feliz por levar sua publicação, ela também faz contação de histórias ao lado das atrizes Kayana Lima, Thamara Nunes e Malu Alves e explica a importância da leitura em sua trajetória pessoal e profissional.
"Eu leio desde a minha infância. Comecei no teatro aos 13 anos e desde então passei a ter contato com a leitura, que eu vejo como um processo muito importante. Hoje eu pego os livros e leio no ônibus, no Uber, e no metrô. Acho que a gente precisa ler muito, dedicar um tempo para a leitura. Atualmente temos mais facilidade de encontrar livros por causa da internet e conseguimos carregar o livro na palma da mão com um celular", diz a escritora, que, assim como muitas pessoas, prefere o livro físico. "Eu sou pré-histórica, eu amo livro físico, eu gosto do cheiro do livro, de folhear as páginas. Quando eu posso, dou livro para as crianças e adolescentes pois acho importante manter esse hábito para que os livros físicos não morram. Vejo o livro como um companheiro".
Para Ayala Rossana, todo artista precisa ler muito. "Eu sou atriz e o que movimenta todo o nosso processo de trabalho é a leitura. Precisamos ler muitos textos para saber interpretar e construir os nossos personagens. Eu acredito na leitura para que a criatividade e imaginação do ator aconteçam". Sua outra paixão é a escrita. "A leitura também colabora para o meu lado escritora, que nasce já um pouco tardio, mas sempre gostei de escrever um pouquinho de poesia, tenho frases e pensamentos escritos, faço algumas músicas, e comecei a a escrever os livros infantis, e já estou indo para o meu segundo, que se chama Ela só Queria Voar".
Uma ótima troca
A Livraria e Sebo Caminhos do Saber existe há 30 anos e funciona no número 20 da Rua da Constituição, no Centro do Rio, onde vende livros novos e usados. A funcionária pública e livreira Cida Batista, de 54 anos, participa de várias feiras literárias e adora. "Ficam muito cheias.Tem um público, que é fiel ao livro físico. Gostamos muito de participar dessas feiras, porque é uma troca. A gente conhece vários autores. E tem essa questão:Se o livro físico vai morrer ou não vai morrer. Essa discussão vem de bastante tempo, mas eu acredito no poder da leitura. Tanto que nessas feiras a gente procura sempre levar livros com preços acessíveis".
Cida, que trabalha com o marido, só faz uma ressalva: "Um fato que me marcou bastante foi num desses eventos literários que a criança...ficou sentada num canto e eu perguntei: você não quer ver o livro? Vem dar uma olhadinha, porque eu sempre conto história, eu procuro incentivar aquela criança a gostar do livro. E a criança virou e falou assim, não tia, aqui não é o meu lugar. Aí eu falei, por que aqui não é o seu lugar? Ela falou: porque eu não tenho dinheiro para comprar um livro. Eu não tenho nem R$ 1".
Para a livreira, deveria ter um incentivo para que as crianças de áreas mais vulneráveis pudessem adquirir o livro de alguma forma. "Falando especificamente de feiras literárias, das festas literárias, dos eventos, uma coisa que me incomoda muito é que a prefeitura, o local, promove a feira literária e convida os alunos de colégio público para visitar o evento. Só que o que acontece? elas vão a esses eventos e não conseguem adquirir o livro mesmo com o custo mais baixo".
Pelos palcos escolares
Não é à toa que Carolina Maria de Jesus foi escolhida para ser homenageada na Feira Literária de Mambucaba neste ano. Uma das escritoras mais lidas de todo o mundo, sua obra também é levada aos palcos com muita verdade pela atriz Andréia Ribeiro que faz a peça Diário de Bitita – Carolina Maria de Jesus, de autoria e direção de Ramon Botelho, há nove anos. Por meio do Sesc Pulsar, a atriz se apresentou em várias unidades escolares neste mês, entre elas as escolas municipais Barro Branco, em Caxias, e a Almirante Alfredo Carlos Soares, em São Gonçalo.
A atriz fala da importância da leitura para todos. "Acredito que a literatura pode transformar vidas e, com Carolina Maria de Jesus, essa transformação se torna ainda mais poderosa, porque vem carregada de verdade, de dor, de superação, de resiliência e sobretudo carregada de amor. Carolina foi uma mulher que, apesar de todas as dificuldades, deu voz aos invisíveis, contou as histórias que ninguém queria ouvir, as histórias da favela, da fome, da luta diária pela sobrevivência. E essas histórias, elas precisam chegar às mãos dos jovens das periferias".
Para Andréia, todos precisam ler essa autora. "Carolina oferece a esses jovens um espelho, uma maneira de reconhecerem seu valor, sua força, e de entenderem que, como ela, podem transformar suas vidas e o mundo ao seu redor. Que através do estudo, do conhecimento podemos ser pessoas melhores, alcançar sonhos inimagináveis e que o saber é o nosso maior patrimônio nessa vida", finaliza.
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