fachada da Academia Brasileira de Letras ganhou painel em homenagem a Machado de AssisRenan Areias / Agência O Dia
Academia Brasileira de Letras ganha painel em homenagem a Machado de Assis
Produzido pelo projeto NegroMuro, mural traz referências sobre a vida e a obra do famoso escritor
Rio - O pátio da Academia Brasileira de Letras (ABL), no Centro do Rio, ganhou um painel em homenagem a um dos maiores nomes da literatura brasileira. Fundador e primeiro presidente da instituição, Machado de Assis (1839-1908) foi eternizado em um muro de 180m² que fica em frente a estátua do escritor. O grafite foi entregue nesta quarta-feira (11) pelo projeto NegroMuro, conhecido por resgatar a memória de grandes personalidades negras da cultura brasileira.
Em entrevista ao DIA, um dos idealizadores do projeto, o pesquisador e produtor Pedro Rajão, 38 anos, revelou que a ideia de fazer o painel em homenagem ao escritor surgiu desde o início do NegroMuro, em 2018. Segundo ele, as conversas para finalmente realizar o grafite começaram em outubro de 2023. Quase um ano depois, o sonho se realizou.
"Eu sou apaixonado por Machado de Assis, pela história do Rio, e ele contava isso muito bem em sua literatura. Eu vi o muro, que fica ao lado de um dos prédios mais históricos da cidade, e quis fazer essa homenagem. Foi um processo longo. Foi um painel azeitado, maturado, para poder acontecer. É um muro que conta não só sobre as obras dele, mas sua biografia também", disse.
O trabalho de pesquisa para a criação do conceito do painel durou meses. Além de mergulhar no acervo da ABL, Rajão ainda conversou com diversos historiadores, professores e até com um dos biógrafos de Machado de Assis, o escritor Cláudio Amorim.
Detalhes da obra
Autor do grafite, o muralista Cazé, 37, revelou o conceito por trás da obra. Além de resgatar e eternizar os grandes trabalhos de Machado de Assis, o projeto obedece uma ideia de georreferenciamento. Ou seja, a pessoa recebe a homenagem em um lugar onde ela tenha algum vínculo.
"Machado morou na Rua do Livramento. A gente está no território dele, a obra está próxima da vida dele. Estamos trazendo o homem favelado para dentro de uma instituição como a Academia Brasileira de Letras. É um símbolo muito importante para os jovens negros que almejam ter uma referência na cidade", reforçou.
Desenhada por Cazé e pelo pintor Cesola Mendes em um muro de 18m de altura por 10m de largura de uma subestação da Light, que fica em frente ao pátio da ABL, o painel foi pensado com uma diagramação no formato de "S", contando a história de cima para baixo.
Divido em cenas de diversas épocas da vida do autor, ele começa com Machado de Assis criança, quando vendia bala na Rua do Livramento. Na sequência, o painel faz referência a Rua do Ouvidor, que segundo Pedro Rajão é citada 91 vezes nas obras dele.
Nela aparece sua companheira Carolina Augusta Novais (1835-1904) e uma letra 'M' com uma estética das máquinas de prensas, relembrando a sua primeira profissão, de tipógrafo. Um corvo também foi desenhado em cima do poste, fazendo menção ao livro "O Corvo", escrito pelo francês Allan Poe (1809-1849) e traduzido pelo escritor brasileiro.
"Em outra cena a gente relembra da participação dele no primeiro campeonato de xadrez no estado do Rio. A gente faz uma brincadeira do Machado negro contra o Machado branco, com o branco triste porque perdeu para o negro. Ao longo de sua vida, ele também falava muito sobre a morte, então colocamos alguns elementos como a caveira e o caixão. Por fim, vem a base da vida dele, que é a literatura", explicou Cazé.
Projeto
Idealizado em 2018 por Pedro Rajão e Cazé, o NegroMuro tem a missão de transformar as ruas da cidade numa grande galeria a céu aberto, trazendo representatividade e resistência aos homens e mulheres negros e negras que fazem parte da história e cultura do Rio.
Ao todo, o grupo já pintou 61 painéis em homenagem a diversas figuras da cultura brasileira em diferentes cantos da cidade. De acordo com Cazé, os três maiores murais do projeto estão no Centro do Rio, sendo o de Machado de Assis o terceiro maior deles.
"A gente forma uma tríade negra muito importante nessa região, onde falamos de música, com o painel do Pixinguinha; de arte, representada pela Ruth de Souza, onde levamos a dramaturgia; e agora sobre a literatura com esse do Machado de Assis. Através do projeto, formamos um corredor cultual naquela região", comentou Cazé.
Para poder realizar os grafites, o projeto depende de parcerias para financiar os custos. De acordo com o muralista, a maioria dos trabalhos são realizados por meio de editais públicos e parcerias com instituições privadas. Além das dificuldades burocráticas - como autorizações da prefeitura -, eles esbarram, muitas vezes, em questões financeiras.
Machado de Assis
Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, na Chácara do Livramento, no Centro do Rio de Janeiro. Foi nesta região onde ele passou boa parte de sua infância e adolescência. Aos 15 anos, escreveu seu primeiro poema, que se chamava "Ela". Ele foi publicado pelo jornal "Marmota Fluminense" no dia 12 de fevereiro de 1855.
Daí por diante, Machado não parou de escrever. Em 1864, Machado de Assis publicou seu primeiro livro de poesias. "Crisálidas", foi uma coletânea de seus poemas ao qual ele dedicou a seus pais. Poucos anos depois, em 1864, publicou seu primeiro livro de contos, o "Contos Fluminenses". Em 1872 foi a vez de seu primeiro romance, intitulado de "Ressurreição".
Machado de Assis participou das primeiras reuniões sobre a fundação da Academia Brasileira de Letras. No dia 20 de julho de 1897 foi realizada a sessão inaugural da instituição. Na ocasião, Machado de Assis, que ocupava a cadeira 23, foi nomeado o primeiro presidente da ABL, cargo que ocupou até sua morte.
Entre as suas obras mais famosas estão o romance "Memórias Póstumas de Brás Cubas", escrito em 1881. Outros grandes sucessos foram os livros "O Alienista", publicado em 1882; "Casa Velha", de 1885; "Quincas Borba", de 1891 e "Dom Casmurro", escrito em 1899.
Machado de Assis morreu em na madrugada do dia 29 de setembro de 1908, em decorrência uma lesão neoplásica na língua.
*Reportagem do estagiário João Pedro Bellizzi, sob supervisão de Larissa Amaral
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.