Trabalhadores alertam para segurança das usinas de Angra 1 e 2Divulgação/Eletronuclear

Angra dos Reis – A semana começou conturbada para os trabalhadores do complexo nuclear de Itaorna, em Angra dos Reis, na costa verde. Desde a última sexta-feira (7), que o fantasma de demissões ronda as unidades de Angra 1 e 2, há possibilidade de 500 trabalhadores serem demitidos de acordo com o pacote de medidas estratégicas adotado pela Eletronuclear, que em nota disse ser a garantia do fortalecimento e sustentabilidade financeira. 
Sindicalistas representantes dos empregados, acreditam que a atitude é política e pode colocar em risco a segurança das usinas de Angra 1 e 2.

“ Mão de obra rara e altamente qualificada, onde o governo federal gastou milhões para qualificar está preste a ser lançada fora, sem um plano de transferência de conhecimento. Em 2023 batemos o recorde histórico de produção e faturamos R$ 4,6 bilhões. No ano passado o líquido da estatal, foi em torno de R$ 318 milhões, e parte deste valor foi destinado para custear a obra parada de Angra 3”.
É neste clima de instabilidade que os funcionários continuam realizando suas funções, aguardando um posicionamento favorável à classe trabalhadora.

Eletronuclear rejeita fiscalização da WANO
Por conta desta real situação na redução de custos os trabalhadores afirmam que “o executivo da WANO Jerome Dagois tem realizado reuniões trimestrais na empresa , ouvindo gerentes e trabalhadores e tem demonstrado extrema preocupação. por isso foi agendada uma reunião para os próximos dias para tentar explicar os atuais riscos e tentar reverter a degradação que está ocorrendo com a segurança .

A WANO (World Association of Nuclear Operators) é uma organização internacional que visa promover a fiscalização da segurança e a eficiência das usinas nucleares em todo o mundo. A WANO foi fundada em 1989, após o acidente nuclear de Chernobyl, com o objetivo de compartilhar conhecimentos, experiências e melhores práticas entre os operadores de usinas nucleares do mundo, incluindo empresas de energia nuclear, agências reguladoras e organizações de pesquisa.

A preocupação da WANO é ainda maior quando a empresa demonstrou vontade de não ser mais associada da organização internacional. Se o Brasil deixar de ser membro da WANO vai juntar-se a Coreia do Norte e Irã , únicos que possuem usinas nucleares mas não fazem parte da WANO. Está prevista uma reunião no próximo dia 26, com representantes da Agência Internacional.
Outro fato que chama atenção dos sindicalistas é “que a Eletronuclear por mais de 25 anos foi eficiente e sobrevivia com a receita das duas usinas. E logo após a privatização da Eletrobrás (atual grande acionista da Eletronuclear ) deu início a um novo discurso de que a empresa está quebrada “.

Os sindicalistas afirmam ainda que “a receita anual da Eletronuclear é de aproximadamente R$ 4,7 bilhões determinada pela Aneel ao estabelecer a tarifa necessária para operação e manutenção de Angra 1 e 2 . Porém ao se determinar essa receita não se levou em consideração os custos com Angra 3 e com a extensão de vida útil de Angra 1. Esses dois custos totalizam cerca de R$ 2,4 bilhões, ou seja, 51% da receita da Eletronuclear é utilizada para pagar custos que não estão cobertos pela tarifa estabelecida pela Aneel. A tarifa foi estabelecida para se operar e manter as duas usinas . Ao se usar essa receita para outras finalidades além do que ela foi destinada coloca em risco a segurança dos trabalhadores, do público e do meio ambiente”.

O custo para operar e manter as usinas foi de R$ 800 milhões em 2024. Para 2025, em nota divulgada, a diretoria financeira da empresa reduziu esse valor para R$400 milhões . Para os sindicalistas e trabalhadores. esse corte de 50% tem impacto direto na segurança nuclear e declaram “é impossível manter a segurança de duas usinas nucleares com esse orçamento “.
“A verdade não tem sido falada . Está tirando recursos da operação e manutenção de Angra 1 e 2 para injetar em Angra 3 e na extensão de vida de Angra 1 evitando desta forma que os acionistas (incluindo a Eletrobrás ) precisem fazer aportes financeiros para esses investimentos sem cobertura tarifária”.

Em nota divulgada, a Eletronuclear informou que “ promove uma série de medidas estratégicas para aprimorar a gestão e fortalecer a sustentabilidade financeira da empresa. Entre os principais destaques estão a aprovação da revisão do organograma da companhia, a redução das despesas operacionais com Pessoal, Material, Serviços de Terceiros e Outros (PMSO), bem como a cobrança de custos de manutenção das vilas residenciais e, ainda, adoção de plano de demissão voluntária (PDV/PDI). As iniciativas fazem parte de um conjunto de ações para garantir melhorias no atual modelo de governança e viabilizar a continuidade da construção de Angra 3.

Reestruturação organizacional

Aprovada pelo Conselho de Administração, no dia 27 de janeiro, a nova estrutura organizacional da Eletronuclear entra em vigor a partir de 1º de abril de 2025, trazendo uma economia estimada de R$ 3 milhões anuais. Com a reformulação, a empresa busca maior eficiência, agilidade e redução de despesas, proporcionando:

- Redução de níveis hierárquicos para otimizar a tomada de decisão;
- Eliminação de sobreposição de atividades, melhorando a produtividade;
- Redução de 4 superintendências e 36 gerências/assessorias.

A reestruturação foi mais presente nas áreas corporativas, mas também há alterações na operação e engenharia. As mudanças foram pensadas visando maior agilidade e melhorias de comunicação e nas entregas aos clientes internos, gerando como consequência melhoria de confiabilidade e segurança operacional.

Além disso, o novo organograma se alinha ao estágio atual do projeto de Angra 3. O planejamento anterior previa a conclusão da usina em 2028, mas com as novas estimativas a entrada em operação está projetada para 2031. Desta maneira, o novo formato permite uma melhor utilização de mão-de-obra, realocando funcionários que estavam voltados aos serviços de operação e engenharia da unidade para as duas usinas em funcionamento (Angra 1 e 2).

“O novo organograma de Angra 3 foi ajustado à etapa atual do projeto, proporcionando aproveitamento de recursos humanos capacitados para outras frentes importantes”, destaca Raul Lycurgo, presidente da Eletronuclear.

O organograma revogado, que estava em vigor desde 2022, tinha mais de 116 cargos de chefia e com a nova estrutura passa a ter 73 cargos. Ou seja, 43 cargos de chefes serão extintos ou incorporados por outras áreas para otimização dos recursos.

"Essa reformulação organizacional permite um modelo mais enxuto e eficiente, alinhado às boas práticas do setor, sem comprometer a segurança e a qualidade dos serviços prestados" - disse Lycurgo. A iniciativa ainda de acordo com ele, não está relacionada diretamente ao desligamento de funcionários, mas sim à readequação da estrutura organizacional para torná-la mais compatível com as necessidades da companhia e a realidade atual do projeto Angra 3.

Redução de PMSO (Pessoal, Material, Serviços de Terceiros e Outros)

Desde 2021, os custos da Eletronuclear com PMSO estavam mais de 50% acima do valor concedido em tarifa pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Em 2022, o PMSO concedido pela Aneel era de R$1,1 bilhão, mas a empresa gastou R$1,6 bilhão. Ou seja, em 2022, R$500 milhões saíram do caixa da companhia sem cobertura tarifária. No ano seguinte, 2023, o PMSO concedido pela Aneel foi novamente de R$1,1 bilhão, mas a empresa gastou R$1,78 bilhão. Isto é, em 2023, aproximadamente R$700 milhões saíram do caixa da companhia sem cobertura tarifária. Ainda em 2023, o orçamento para 2024 apontava para gastos na companhia com PMSO de R$2,4 bilhões, enquanto que o PMSO da Aneel era de R$1,4 bilhões. Se isso se concretizasse, seria um déficit de R$1 bilhão.

Com medidas de racionalização já implementadas pela atual gestão da Eletronuclear, a empresa reduziu os gastos com PMSO em 2024 de R$2,4 bilhões para R$1,9 bilhão, ainda além do PMSO da Aneel de R$1,4 bilhão, mas invertendo a tendência.

A meta é atingir o equilíbrio até o final de 2026, alinhando os custos ao PMSO regulatório da Aneel com os custos de PMSO da empresa.

"A redução do PMSO é essencial para garantir a viabilidade econômica da Eletronuclear e a continuidade de projetos estratégicos, como Angra 3. Desse modo, a referida mudança no organograma se faz necessária", afirma Lycurgo.

Entre as estratégias adotadas estão a revisão de contratos, otimização de processos, controle mais rigoroso de despesas com pessoal e redução do quadro de pessoal.

Além disso, a empresa implementará a cobrança de uma taxa para custear serviços de manutenção das vilas residenciais destinadas aos funcionários em Angra dos Reis. A medida, que não se trata de um aluguel, visa cobrir despesas como limpeza, água, luz, telefone e IPTU.

Vale destacar que esse benefício não está previsto nos editais de concursos da empresa e, diante do cenário econômico da empresa, precisou ser ajustado para assegurar uma gestão mais sustentável.

Revisão do Plano de Negócios e Gestão (PNG 2025-2029)

Aprovado pelo Conselho de Administração da Eletronuclear, o novo PNG estabelece diretrizes estratégicas para os próximos cinco anos, priorizando segurança, confiabilidade e sustentabilidade financeira. O documento foi elaborado com base em métricas de operadores nucleares internacionais e contempla diferentes cenários para a retomada das obras de Angra 3, condicionada a decisões governamentais.

O PNG inclui o projeto de extensão da vida útil de Angra 1 e metas de eficiência operacional, além de fortalecer a governança corporativa da empresa. "Nosso planejamento estratégico reflete o compromisso com a melhoria contínua da gestão e a busca por uma operação cada vez mais confiável", destaca Lycurgo.

A elaboração do plano segue o estabelecido pela Lei 13.303/2016, que determina que empresas públicas elaborem anualmente um planejamento de cinco anos. No caso da Eletronuclear, esse processo é fundamental para projetar o futuro da geração de energia nuclear no Brasil, com metas de eficiência e expansão da capacidade produtiva.
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