Cipriano de Cartago, um importante bispo e teólogo católico (século III), criou uma fórmula bastante conhecida, não só entre os católicos, mas no meio cristão em geral: não existe salvação fora da Igreja Católica.
O tema “salvação” provocou reflexões por parte do estudioso espírita, o professor Roberto Tavares. Lembra ele que o próprio catolicismo, após o Concílio Vaticano II (1961) alterar essa fórmula, tida como verdadeira, anunciou uma interpretação mais ampla: a salvação não viria somente para aqueles que professavam a fé católica, mas para todos que seguiam a mensagem de Jesus, independente de conhecer e seguir a teologia católica.
Quase um século antes desse entendimento dos altos membros do catolicismo, em 1864, em Paris, Allan Kardec publicou o ‘Evangelho Segundo o Espiritismo’. Essa obra, conforme consta na sua introdução, foi dividida em cinco partes: 1) os atos comuns da vida do Cristo; 2) os milagres; 3) as predições; 4) as palavras que foram tomadas pela Igreja para fundamento de seus dogmas; 5) e o ensino moral.
O objetivo da sua edição – continua o professor Roberto Tavares - não era criar um evangelho espirita, mas como feitos por muitas outras doutrinas cristãs, interpretar as obras do Cristo relatadas nos quatro Evangelhos da Bíblia, à luz dos ensinamentos dos espíritos superiores. E Kardec recriou a máxima “fora da Igreja não há salvação” para “fora da caridade não há salvação.”
Kardec, ao perguntar aos espíritos superiores quem era o tipo mais perfeito, aquela pessoa que Deus nos deu para que pudéssemos inspirar nossa conduta, recebeu como resposta que essa pessoa era Jesus. O espiritismo, portanto, pode se autointitular um segmento cristão. Mais à frente, Kardec pergunta à espiritualidade o que era a caridade, conforme entendida por Jesus.
A resposta: “Benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas”. Para o professor Roberto Tavares, podemos entender a benevolência no sentido de boa vontade. Boa vontade é aquilo que nos motiva, é o intuito por trás de cada uma de nossas ações, tudo através da prática do que cada um entende como o “Bem”.
Já o conceito de indulgência, nos traz o sentimento de perdão de uma pena, perdão por um crime. Devemos perdoar as imperfeições dos outros, porque sabemos que também somos imperfeitos. E isso vale para o perdão das ofensas. Essa parte resume em nossos atos as duas primeiras. Se temos a bondade como motivador de nossas ações e entendemos que as pessoas são imperfeitas (assim como nós somos imperfeitos), perdoar qualquer falha que cometam contra nós é o caminho correto.
Ressalte-se que para o espiritismo não existe salvação, pois não existem penas eternas, destaca o professor Roberto Tavares. Em vista disso, não é concebido o conceito de Céu como um lugar onde as almas boas ficarão para sempre no “seio de Deus”. Muito menos, existe um inferno, a tal região subterrânea onde as almas dos que pecam contra as “leis de Deus” serão atormentados perpetuamente.
O que existe para os espíritas, é a evolução espiritual de cada um de nós. Conforme formos encarnando, iremos ganhando em moral e conhecimento. Assim, temos mais possibilidades de fazer do nosso redor um lugar de bondade, harmonia e justiça. Desse modo, nossos espíritos se tornarão melhores, seja os encarnados ou os desencarnados.
A caridade é a chave, pontua o professor Roberto Tavares. Independente de professarmos determinada religião. Se nossos atos forem baseados na benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros e o perdão das ofensas, estaremos preparando para nós mesmos - e para aqueles que nos cercam -, um paraíso de paz nesse ou em qualquer mundo.