Alexandre Borges é jornalista, analista político e comunicador, atualmente integra o time de 'O Antagonista', um dos portais de política mais influentes do Brasil. Com experiência em veículos como CNN Brasil, Jovem Pan e Gazeta do Povo, também colaborou com publicações como Veja e Folha de S. Paulo. Além de comentarista, é autor e podcaster, onde aborda política, cultura e literatura, com conexão entre obras clássicas, como as de Shakespeare, e questões contemporâneas, incluindo inteligência artificial.
SIDNEY: Depois de passar pela publicidade, marketing político, trabalhar em TV, rádio, mídia impressa e internet, qual a sua recomendação para os políticos se conectarem com a atual sociedade?
ALEXANDRE BORGES: A política que dominou os 25 anos entre o fim da URSS, em 1991, e o Brexit, em 2016, foi tecnocrata, fria, essencialista, quase parnasiana. Governar virou sinônimo de gestão “científica”, delegada a burocratas distantes, enquanto os líderes desfilavam em Davos. Isso acabou. Hoje, vivemos uma era “romântica” no sentido literário: o que importa é a emoção percebida pelo público que demanda doses cavalares de empatia, autenticidade, altruísmo e patriotismo. Não há mais espaço para partidos como o velho PSDB, que já venceu duas eleições presidenciais no primeiro turno, mas agora agoniza. Há informação demais, câmeras demais, conectividade demais. Ninguém controla o que é dito, visto ou pensado sobre si. É preciso abraçar a imperfeição, aceitar o reality show em que a política se transformou e extrair o melhor disso. Todo dia, avance um pouco com as pautas que deseja que sejam associadas a você e leve às redes sociais. Construa presença digital com todo cuidado. Esteja onde o eleitor está: nas ruas, nos bares, no transporte público ou no Maracanã. Esqueça os filtros de assessores e especialistas que te afastam da realidade. Seu melhor conselheiro é o próprio eleitor, que dirá o que valoriza. Viva 24 horas por dia por aquilo em que acredita. Alguns vão amar, outros odiar, mas todos falarão de você. E, no jogo político de hoje, o mais importante é ser lembrado.
O senhor trabalhou nas campanhas de Celso Russomanno (2012), Flávio Bolsonaro (2016) e Wilson Witzel (2018). O que aprendeu de positivo e negativo?
Saí do marketing político há quase dez anos, mas as lições desse período continuam muito presentes. Campanhas são intensas, brutais, com adrenalina no máximo o tempo inteiro. Porém, essa intensidade não pode ser desculpa para perder o foco ou a capacidade de se adaptar a um cenário que muda a cada minuto. É como Churchill em 1940, equilibrando a invasão nazista, os bombardeios a Londres e a liderança de uma guerra mundial: você precisa lidar com tudo ao mesmo tempo, sem se deixar paralisar. De positivo, fazer campanhas foi como tomar a "red pill". É sair da "matrix" e enxergar os políticos como realmente são: o que pensam e desejam, suas qualidades e falhas humanas. Essa convivência intensa me deu um olhar único, indispensável para o tipo de analista político que sou. Você não entende a alma de um político ou os humores do eleitor apenas com teorias; é como tentar aprender a namorar ou criar filhos só com livros. A prática é insubstituível. Por outro lado, o negativo é perceber como pessoas comuns, como eu ou você, são elevadas a semideuses pelos cidadãos, recebendo poderes, recursos e uma deferência muitas vezes imerecida. Essa idealização cega é incompatível com um país desenvolvido e civilizado.
Os conservadores abrigados nas legendas de direita venceram o pleito de 2024. Qual a sua explicação?
A vitória da direita conservadora em 2024 foi menos ideológica do que parece. Globalmente, há uma tendência clara: quem estava no poder durante a pandemia foi sendo removido depois dela. Exemplos como a Inglaterra, onde os conservadores perderam para a esquerda, mostram que o desgaste não era sobre ideologias, mas sobre a arrogância de líderes que impunham regras enquanto faziam festas a portas fechadas. A repulsa a essa postura alimentou fenômenos repugnantes como o movimento antivacina, abraçado pelo bolsonarismo, mas que nasceu do descontentamento com a engenharia social conduzida por especialistas que exigiam obediência ampla, geral e irrestrita. Mesmo que as intenções fossem defensáveis, a execução foi um desastre. A direita, no entanto, nunca desapareceu. Foi sufocada durante a "era social democrata", entre 1991 e 2016, mas permaneceu no mesmo lugar, aguardando o momento para ressurgir. Com a explosão de meios digitais e o fim da hegemonia ideológica, o monopólio de narrativas acabou. Esse processo lembra a revolução causada pela invenção da imprensa por Gutenberg: inicialmente, gerou confusão, guerras e conflitos, mas a sociedade acabou se reorganizando. Nos últimos anos, vivemos uma reconfiguração social impulsionada pela abundância de informações. É um período barulhento e instável, mas historicamente inevitável. Com o tempo, as forças ideológicas voltarão a encontrar um equilíbrio mais duradouro.
Já existem favoritos para as eleições estaduais e presidencial de 2026?
Ainda é cedo para apontar favoritos nas eleições de 2026, mas o cenário atual já indica tendências. A vitória esmagadora de Donald Trump nos EUA revela que, apesar da responsabilização e prisão de nomes importantes do bolsonarismo pela tentativa desastrada de golpe de estado, a direita não está morta. Pelo contrário. Enquanto isso, a esquerda segue com a estratégia de focar em apenas "tirar a direita do poder", apoiando seu discurso no endosso de celebridades e em reduzir infantilmente o debate público a rótulos como "fascista" e afins. Ao mesmo tempo, tenta impor uma agenda elitista e desconectada da realidade, que busca reconfigurar até conceitos como o que é ser homem ou mulher, em um país onde metade da população ainda não tem acesso a esgoto. Mesmo sem favoritos claros, a direita segue voando numa corrente de ar ascendente.
O Rio de Janeiro está no rumo certo?
O Rio de Janeiro é um exemplo gritante de desperdício. Como carioca, não consigo aceitar que nossa cidade seja tão maltratada. O recente escândalo envolvendo o fechamento do Bondinho do Pão de Açúcar para um casamento, em pleno sábado de Rock in Rio, é apenas a ponta do iceberg. A revelação de que o teleférico opera sem regulamentação há 25 anos só reforça a ideia de esculhambação generalizada. Desde o fim do contrato de concessão em 1999, nada foi feito para regularizar a gestão, apesar de uma decisão do STF, em 2018, autorizando a Prefeitura a realizar nova licitação. Este tipo de desordem é surreal. Uma trama tão absurda que seria rejeitada na ficção. Como flamenguista, vejo que há um caminho possível. O Flamengo, depois de anos de caos, resolveu colocar ordem na casa. Passou por uma fase difícil, enfrentou críticas e perdeu títulos, mas colheu os frutos de sua reestruturação. O Rio precisa do mesmo: coragem para encarar a bagunça, aceitar um período de ajustes e trabalhar para se tornar, enfim, a cidade grandiosa que deveria ser.
O que é preciso fazer, em termos de comunicação, para ajudar no combate à insegurança no Rio de Janeiro?
Para combater a insegurança na cidade, a comunicação deve focar em uma mensagem clara: o carioca é o maior prejudicado pela malandragem, pelo improviso e pelo descuido. Morei 20 anos em São Paulo e posso afirmar que lá prevalece uma cultura de trabalho e seriedade, enquanto aqui, muitas vezes, nos perdemos em atividades lúdicas ou pautas identitárias que pouco impactam os problemas reais. A cidade precisa de uma comunicação que inspire uma cultura de inovação, produtividade e compromisso com resultados, indo além dos discursos ou ações sociais que não encarem o essencial, ou o mero deslumbre com grandes eventos (Ano Novo de Copa, Carnaval, G20 etc). Enfrentar a insegurança é como tratar de uma obesidade mórbida. O processo é difícil, exige esforço, mudança de hábitos e acompanhamento constante, mas, no final, o maior beneficiado é o próprio Rio. Amo minha cidade e acredito que podemos mudar, desde que aceitemos nossos desafios e enfrentemos a realidade sem medo.