Por daniela.lima

Rio - Entrei pela primeira vez na Cinemateca do MAM levado, com um grupo de amigos, pelas mãos de Victor Giudice. O filme em cartaz era, nada mais nada menos, do que o essencial ‘Cidadão Kane’, de Orson Welles.  

Victor GiudiceReprodução


Victor, para quem não sabe, foi uma espécie de guru intelectual da Tijuca. Escritor, compositor, crítico de ópera e música erudita, Victor abria generosamente as portas de sua casa na José Higino para uma molecada do São José, Pallas e Instituto Guanabara curtir muita cultura nos fins de semana. 

De lá saiu uma geração que seguiu os caminhos do teatro, da literatura, do jornalismo e das ciências sociais. Devo a ele muito do que aprendi sobre arte e a Leda, com quem vivia, o pouco que pude dominar da Língua Portuguesa. Aos mestres, já em outra dimensão, agradeço com Carlinhos (trocadilho com Carlos Alberto Mattos, meu maestro soberano na crítica, que não deixo sair desta tão cedo). 

Victor foi o primeiro cara que conheci a ter um videocassete, e era lá que os amigos de seus filhos, Renata e Maurício, tinham o privilégio de ver pela primeira vez clássicos do cinema que há muito não eram exibidos no Brasil. O complemento eram as idas à Cinemateca e aos Cineclubes, sobretudo o Macunaíma e logo depois o Estação. 

A Cinemateca e os Cineclubes cumpriam um papel para além da formação cinematográfica. O cineclubismo, do qual fiz parte como Diretor do Cineclube Manuel Maurício, do Instituto Guanabara, era um movimento que não escondia suas pretensões políticas. Quaisquer escolas, sindicatos e até igrejas tinham o seu e em geral exibiam filmes que a ditadura proibira ou que rendiam altas discussões, que iam de Vargas a Lech Walesa num piscar de olhos. O cinema era, antes de tudo, instrumento de formação, de público e de crítica. 

Toda essa memória me veio à mente ao ver as filas do Estação NET Botafogo, outrora, Cineclube Estação Botafogo, para assistir à espetacular mostra dedicada aos anos 80. Foi emocionante conferir o público maciçamente jovem dividir cadeiras com os cinquentões de raiz. Muitos pais e filhos compartilhando ali o prazer de ver e depois comentar filmes que fizeram parte da nossa história e, a partir de agora, com certeza, farão parte da deles. 

A mostra, junto com o relançamento da revista ‘Tabu’, que era o órgão oficial dos cinéfilos de Botafogo, faz parte de uma iniciativa salutar do Grupo Estação de formação e renovação de público. Um retorno aos fundamentos originais do Grupo e a primeira janela para aquilo que o seu diretor, o heroico Marcelo Mendes, mais deseja: transformar o Estação numa cinemateca. Vou comprar cadeira cativa.

Você pode gostar