Marina Lima - Rogério Cavalcanti
Marina LimaRogério Cavalcanti
Por RICARDO SCHOTT

Rio - Radicada em São Paulo desde 2011, a carioca Marina Lima veio ao Rio e falou com O DIA, em meio a uma extensa agenda de compromissos que incluía as entrevistas de lançamento do novo disco, 'Novas Famílias', e a preparação emocional para ver o irmão e parceiro Antonio Cícero tornar-se membro da Academia Brasileira de Letras. "Vim principalmente para isso", diz a cantora. A agenda dela acabou tendo modificações por conta de uma fatalidade: o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) no dia 14.

Marina fez questão de ir ao ato contra a morte da militante, na Cinelândia, na quinta passada. E encontrou a cidade mais triste do que poderia imaginar. "Encontrei uma cidade ferida. Independentemente de partido, as pessoas têm que se unir, até porque quem está no poder não representa ninguém. Representa só uma pequena parcela da população".

SÃO PAULO

A mudança para São Paulo, lembra a cantora, veio numa época em que ela acreditava que o Rio estava perdendo interesse por seu trabalho.

"Eu achava que o Rio estava me vendo como uma coisa meio estagnada. Como se fosse: 'Ah, tem o Pão de Açúcar, o Corcovado e a Marina Lima'", brinca. "Eu gosto de ser estimulada. São Paulo é cheia de códigos e eu não dominava nenhum quando cheguei lá. Há uma chegada e partida muito maior por lá, de gente que chegou lá porque não estava feliz no lugar de onde veio. E o Rio estava muito saudosista do próprio umbigo nessa época. Ele é o berço do samba, mas eu achava que estava tudo em torno do mesmo assunto e eu não sou uma sambista típica".

Na música carioca atual, Marina diz se sentir representada por sua parceira Leticia Novaes, do Letrux. "Ela representa um Rio que tem mais a ver com o que eu gosto, que é uma coisa mais irônica", alegra-se. Tanto Letícia quanto Qinho, que gravou um CD relendo a obra de Marina, vão participar do show de lançamento de 'Novas Famílias', no Circo Voador, dia 5 de maio.

FUNK

A relação com o Rio fica exposta no samba funk 'Juntas', parceria com o irmão Antonio Cícero, que fala no "entardecer de São Paulo de um Rio distante". 'Só os Coxinhas', a outra canção feita pelos dois no disco (Marina também regravou como bônus 'Pra Começar', dela e de Cícero, um sucesso seu dos anos 1980), chamou atenção pelo tom crítico de versos como "e não esquece de dizer pro seu gerente/que nunca ninguém foi tão competente". E por levar o idioma do funk carioca para o repertório da cantora de 'Uma Noite E Meia'.

"Sou carioca, né?", diz, rindo, quando perguntada sobre o que a motivou a se iniciar no funk. "E na verdade o funk sempre esteve próximo no meu repertório. Funk tem de todo tipo, 'Billie Jean' (Michael Jackson) é um funk. Mas acho importante ressaltar que a gente tem que ter humor. A música não é um ataque, é uma tiração de sarro. Tem coxinha de esquerda, de direita. É aquela pessoa chata, careta, que você encontra em qualquer lugar". Marina diz que em seu círculo de amigos ninguém vestiu a carapuça da música. "Em compensação, ganhei muitos haters na internet", diz.

Esse sarro com a caretice já apareceu em outras músicas da cantora, como 'Pra Começar', 'Nosso Estilo', até em 'Uma Noite E Meia' (escrita pelo músico Renato Rocketh e criticada pelo verso "todas de bundinha de fora", considerado de mau gosto). Era mais difícil falar sobre isso nos anos 1980? "Hoje, o país está difícil. Naquela época, o Brasil empobreceu, foi quando acabou a ditadura. Depois, veio uma sensação de conquista, de liberdade. Mas hoje a gente está muito enfraquecido e com vergonha. O país empobreceu, mas a gente não pode perder a esperança".

IRMÃO NA ACADEMIA

Antonio Cícero, por sinal, já pode ser considerado o primeiro imortal da ABL a compor um funk. E como compositor, tem um repertório que inclui parcerias com Lulu Santos ('O Último Romântico', dos dois ao lado de Sérgio Souza) e Roberto Frejat ('Bagatelas', gravada pelo Barão Vermelho). Ele seria um imortal pop?

"Com certeza. Mas ele faz parte de uma história recente. Quem sabe os outros imortais não tenham sido figuras pop em suas épocas?", conta Marina. Ela só gostaria mesmo era que seus pais estivessem vivos para ver seu irmão entrando na Academia. "Meu pai era um intelectual que tinha uma biblioteca enorme. Ele e minha mãe investiram muito na formação do Cícero, para que ele se tornasse quem é. É como se meus pais recebessem um diploma também", alegra-se.

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